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DULCE

Naturalmente, fico curiosa e procuro o nome dele no Google. Christopher Uckermann é um nome pouquíssimo comum, e eu o encontro no Facebook sem ter que usar as técnicas de perseguidora bizarra que reservo para os novos escritores que estou tentando roubar de outras editoras...
   É um alívio ver que ele não faz nem um pouco meu tipo, o que com certeza vai simplificar bastante as coisas — se Justin um dia conhecesse Christopher, por exemplo, acho que não o veria como uma ameaça. Ele tem pele parda e cabelo encaracolado, comprido o bastante para ficar atrás da orelha, e é desengonçado demais para o meu gosto. Estabanado, sabe como é. Mas parece um cara legal. Em todas as fotos, está com um sorriso gentil, meio torto, que não é nem um pouco assustador nem psicopata — embora, quando olhamos para qualquer foto com isso na cabeça, todos pareçam assassinos da serra elétrica, por isso tento não pensar na ideia. Ele parece simpático e inofensivo. São duas coisas boas.
   No entanto, sei com certeza absoluta que é um homem.
Será que estou mesmo disposta a dividir uma cama com um homem? Dividir a cama com Justin já era horrível às vezes e nós estávamos em um relacionamento. O lado dele do colchão afundava no meio e ele nem sempre tomava banho depois da academia, então deixava certo... cheiro de suor no edredom. Eu sempre tinha o cuidado de manter as cobertas na mesma posição para não ficar com a parte suada.
   Mas mesmo assim. Trezentas e cinquenta libras por mês. E ele nunca estaria em casa de fato.
   
   — Dulce Maria!
Levanto a cabeça rápido. Droga, é Anahi, já até sei o que ela quer. Quer o manuscrito do maldito livro sobre bolos caseiros para crianças que passei o dia inteiro ignorando.
   — Não tente fugir para a cozinha ou fingir que está no telefone — diz ela, por cima da minha parede de vasos de plantas.
Este é o problema de trabalhar com amigas: você vai ao bar com elas, fica bêbada, conta seus truques e depois fica indefesa.
   — Você foi ao cabeleireiro! — É uma tentativa desesperada de mudar de assunto, mas o cabelo dela está mesmo muito legal hoje. Trançado, como sempre, mas desta vez com pequenas tranças feitas com fitas azul-turquesa entre os fios, parecidas com as fitas de um corpete.
  — Como você faz essas tranças?
  — Não tente me distrair usando um dos meus assuntos preferidos, Dulce Maria — diz Anahi, batendo as unhas maravilhosamente pintadas com bolinhas. — Quando vou receber o manuscrito?
   — Só preciso... de um pouco mais de tempo.
Ponho a mão nos papéis à minha frente para que ela não veja o número da página — ainda não passei da 10.
Ela semicerra os olhos.
  — Na quinta?
Assinto, com entusiasmo.
É, por que não? Quer dizer, é absolutamente impossível, mas sexta parece muito melhor quando sugerimos isso na quinta, então vou avisar quando chegar a hora.
  — E quer sair para beber alguma coisa amanhã à noite?

Paro para refletir.
Eu estava pensando em bancar a certinha e não gastar dinheiro nenhum nesta semana, por causa da minha dívida enorme, mas sair com Anahi é sempre ótimo e, sinceramente, preciso me divertir um pouco. Além disso, ela não vai poder brigar comigo por causa do manuscrito se estiver de ressaca na quinta.
  
— Combinado.

• • •

O Bêbado no 1 é expressivo. Do tipo que gosta de abrir bem os braços, sem se importar com o que está por perto (até agora, isso incluiu uma enorme palmeira falsa, uma bandeja com doses de sambuca e uma modelo ucraniana relativamente famosa). Todo movimento é exagerado, inclusive para andar — tipo, pé esquerdo para a frente, pé direito para a frente, e assim por diante. O Bêbado no 1 faz uma caminhada parecer uma apresentação de conga.
   O Bêbado no 2 é do tipo traiçoeiro. Ele mantém o rosto impassível quando está ouvindo você, como se a ausência de expressão fosse deixar claro que ele está sóbrio. Ele assente de tempos em tempos, de maneira bastante convincente, mas não pisca muito. E as tentativas de olhar para seus seios são muito menos sutis do que ele imagina.
   Gostaria de saber o que eles acham de mim e de Anahi. Os dois vieram direto até nós, mas isso não é necessariamente positivo. Quando eu namorava Justin, sempre que ia para uma festa com Anahi, ele lembrava que muitos homens veem uma "mulher peculiar" e pensam que ela é "desesperada e fácil". Ele está certo, como sempre. Eu nunca soube dizer se é mais fácil transar sendo uma mulher peculiar ou fazendo o tipo animadora de torcida ousada. As peculiares são mais abertas para conversas e ninguém imagina que estejam namorando. Parando para refletir, talvez também fosse por isso que Justin não gostava muito das minhas saídas com Anahi.

  — Então, tipo, livros sobre fazer bolos? — pergunta o Bêbado no 2, provando sua capacidade de ouvir e a sobriedade já mencionada (sério, para que tomar sambuca se vai fingir que não bebeu a noite toda?).
  — Isso! — responde Anahi. — Ou sobre fazer prateleiras, costurar roupas ou... ou... O que você gosta de fazer?
   
Ela já bebeu o bastante para achar o Bêbado no 2 atraente, mas desconfio de que só esteja tentando manter o cara ocupado e abrir espaço para que eu ataque o Bêbado no 1. Dos dois, o Bêbado no 1 é claramente a melhor opção — ele é alto, para começar. Esse é o primeiro desafio. Tenho um metro e oitenta e dois de altura e, apesar de não ver problema nenhum em namorar homens mais baixos, eles costumam ficar incomodados quando sou um ou dois centímetros maior. Por mim tudo bem — não me interesso por caras que se importam com esse tipo de coisa mesmo. É um bom filtro.

  — O que eu gosto de fazer? — repete o Bêbado no 2.
— Gosto de dançar com mulheres bonitas em bares com nomes ruins e drinques caros.

Ele abre um sorriso que, apesar de mais preguiçoso e torto do que provavelmente pretendia, é muito atraente.

Vejo que Anahi está pensando a mesma coisa. Ela me lança um olhar calculista — não está tão bêbada assim, afinal — e avalia a minha situação com o Bêbado no 1.
Olho para o Bêbado no 1 e faço minha própria avaliação. Ele é alto, tem belos ombros largos e cabelo grisalho nas têmporas de um jeito bastante sexy. Provavelmente tem trinta e muitos anos — poderia ser um George Clooney dos anos 1990 se eu fechasse um pouco os olhos ou diminuísse as luzes.
Estou a fim dele? Se estiver, posso dormir com ele. A gente pode fazer isso quando solteira.
Estranho.
   Não tive vontade de dormir com ninguém desde Justin. A gente volta a ter um monte de tempo livre quando está solteira e não transa — não o tempo que gastaria na transa em si, mas o que passaria raspando as pernas, comprando lingerie bonita, se perguntando se todas as outras mulheres depilam a virilha etc. É uma grande vantagem. Obviamente, tem a ausência esmagadora de um dos melhores aspectos da vida adulta, mas a gente acaba fazendo muito mais coisas úteis.
É claro que sei que a gente terminou há três meses. Sei que, em teoria, posso transar com outras pessoas. Mas... não consigo deixar de pensar no que Justin diria. Em como ele ficaria irritado.
Pode ser tecnicamente permitido, mas não é... sabe? Permitido de verdade. Não na minha cabeça, ainda não.
Anahi entende.

   — Desculpa, cara — diz ela, dando tapinhas no braço do Bêbado no 2. — Eu gosto de dançar com minha amiga.
Anahi anota o telefone dela em um guardanapo — só Deus sabe de onde ela tirou a caneta, essa mulher é mágica —, e então estamos de mãos dadas, abrindo caminho até o meio da pista de dança, onde a música nos atinge por todos os lados, fazendo meus tímpanos estremecerem.
   — Que tipo de bêbada você é? — pergunta Anahi, enquanto dançamos de maneira inapropriada ao som de um clássico do Destiny's Child.
  — Sou um pouco... reflexiva — grito para ela. — Analítica demais para dormir com aquele cara legal.
  Ela pega um drinque da bandeja de uma das moças que andam pela boate pedindo que você pague mais caro pelas bebidas e entrega um pouco de dinheiro a ela.
  — Do tipo que não está bêbada o bastante, então — diz ela, me oferecendo a bebida.
  — Você pode ser editora, mas nenhuma bêbada usa a palavra "analítica".
  — Editora assistente — lembro, antes de virar o copo.
Jägerbomb. É estranho como uma coisa tão nojenta, cujo sabor faz a gente querer vomitar no dia seguinte, pode ser tão deliciosa em uma pista de dança.
Anahi me enche de álcool a noite toda e flerta com todas as duplinhas de amigos, abordando um e empurrando o mais bonito para mim. Independentemente do que ela diga, já estou bem bêbada, então nem paro muito para pensar — ela só está sendo uma excelente amiga. A noite passa trazendo uma onda de dançarinos e drinques coloridos.

É só quando Christian e Maite chegam que começo a me perguntar qual o motivo de estarmos todos juntos ali.
Christian está com cara de quem foi convocado às pressas. Sua barba está um pouco bagunçada, como se ele tivesse dormido em uma posição estranha, e ele está com uma camiseta velha que usava na época da faculdade — só que um pouco mais justa agora.
Maite está linda como sempre, sem maquiagem, o cabelo preso em um coque alto. Não dá para saber se Maite estava planejando vir, porque ela nunca usa maquiagem e se veste de maneira impecável o tempo todo. Ela poderia ter apenas colocado, no último minuto, um par de saltos um pouco mais altos para combinar com a calça jeans skinny.
   Os dois atravessam a pista de dança. Confirmo a suspeita de que Christian não planejava vir: ele não está dançando. Basta Chris pisar em uma boate para começar a dançar.
    Então por que os dois vieram a uma saída aleatória com Anahi em uma quarta à noite? Eles nem se conhecem direito — só se veem de vez em quando em festas de aniversário e na casa de amigos em comum. Na verdade, Maite e Anahi têm uma rixa sutil e eterna pela liderança do grupo e, quando todos nos reunimos assim, as duas sempre terminam se estranhando.
"Será que é meu aniversário?", penso, bêbada. "Vou receber alguma notícia surpreendente?"
Eu me viro para Anahi.

  — O q...?
  — Mesa — diz ela, apontando para os fundos da boate.
Maite até consegue esconder a irritação por estar sendo redirecionada depois de ter lutado para chegar ao meio da pista.
  Estou com uma sensação ruim. Mas acabei de chegar ao auge da alegria alcoólica, então estou disposta a esquecer a preocupação e torcer para que tenham vindo me dizer que ganhei uma viagem de
quatro semanas para a Nova Zelândia ou algo assim. Mas, não.
  — Dulce, não sei como te contar isso — diz Anahi —, então esse foi o melhor plano que consegui inventar. Quis deixar você alegrinha, lembrar que você pode flertar com outros caras e chamei sua equipe de apoio.— Ela pega minhas mãos.
  — Dulce... O Justin ficou noivo.

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