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CHRISTOPHER


Percorro as alas, conferindo fichas, aplicando soro.

Falo com pacientes e fico impressionado ao conseguir soar normal e falar sobre outra coisa que não o fato de meu irmão estar finalmente voltando para casa.

Casa.

Poncho está voltando para casa.

Não paro de tentar esquecer a ideia, como sempre tive que fazer — minha cabeça coloca Poncho de novo em minha vida, então afasta esse pensamento de supetão, como se tivesse tocando em algo muito quente, porque eu não me deixava acreditar nisso.

Era doloroso demais.

Uma carga muito forte de esperança. Mas agora é real. Vai ser real em questão de horas. Ele vai conhecer Dulce. Eles vão conversar, como fazem, pelo telefone, mas agora cara a cara, no meu sofá. É bom demais para ser verdade.

Até eu lembrar que ele não deveria nem ter ido para a cadeia, claro, mas nem mesmo essa ideia pode acabar com minha euforia. Estou na cozinha da casa de repouso, fazendo chá, quando ouço meu nome sendo repetido cada vez mais alto.

Dulce: Christopher! Christopher! Christopher!

Eu me viro bem a tempo.

Ela pula em mim, cabelo molhado de chuva, bochechas rosadas, sorriso enorme.

Eu: Opa!

Dulce, muito perto do meu ouvido: Christopher Christopher Christopher!

Eu: Ai?

Dulce: Desculpa.

Eu só...

Eu: Você está chorando?

Dulce: O quê? Não.

Eu: Está, sim. Você é incrível.

Ela pisca, surpresa, os olhos brilhantes com lágrimas de felicidade.

Eu: Você nem conhece o Poncho.

Ela passa o braço pelo meu e me vira de novo para a chaleira quando a água começa a ferver.

Dulce: Bom, eu conheço você, e o Poncho é seu irmão mais novo.

Eu: Só para você saber, ele não é tão novo assim.

Ela abre o armário com as xícaras e pega duas, depois analisa os saquinhos de chá e serve a água como se entrasse e saísse desta cozinha há anos.

Dulce: Seja como for, sinto que já conheço o Poncho.

A gente já se falou milhares de vezes.

Não preciso encontrar uma pessoa pessoalmente para conhecê-la.

Eu: Falando nisso...

Dulce: Aonde a gente vai?

Eu: Venha comigo rapidinho.

Quero mostrar uma coisa a você.

Dulce: Os chás! Os chás!

Paro e espero que ela acrescente leite com muito cuidado.

Ela lança um olhar insolente por cima do ombro; no mesmo instante, quero tirar sua roupa.

Eu: Tudo pronto?

Dulce: Está bem. Tudo pronto.

Ela me entrega uma xícara e eu pego, junto com a mão que a ofereceu.

Quase todos por quem passamos no corredor dizem: "Ah, oi, Dulce!", ou "Você deve ser a Dulce!", ou "Ai, meu Deus, o Christopher tem mesmo uma namorada!", mas estou de muito bom humor para achar isso irritante.

Puxo Dulce de volta quando ela vai abrir a porta da Ala Coral.

Eu: Espera, olhe pela janela.

Nós dois nos inclinamos para perto do vidro.

Johnny White não saiu do lado dele desde o fim de semana.

O sr. Prior está dormindo, mas ainda assim sua mão enrugada e manchada de sol segura a de Johnny White. Eles tiveram três dias inteiros juntos, muito mais do que JW podia esperar.

Sempre vale a pena atravessar as portas.

Dulce: Johnny White VI é o verdadeiro Johnny White?

Esse é o melhor dia de todos os tempos!

Já houve algum tipo de anúncio? Puseram um elixir no café da manhã de todo mundo?

Um tíquete dourado na caixa de cereal? Dou um beijo nela, empolgado.

Atrás de nós, um dos residentes diz para outro: — Incrível.

Sempre achei que o Christopher não gostasse de ninguém que não tivesse uma doença terminal!

Eu: Acho que é só um bom dia, Dulce.

Dulce: Bem, acho que todos nós precisávamos disso. 

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