CHRISTOPHER
Odeio este terno.
Usei pela última vez no julgamento e depois enfiei no armário da casa da minha mãe. Quase quis tacar fogo nele, como se estivesse contaminado. Que bom que não taquei. Não posso ficar queimando ternos toda vez que o sistema legal não faz justiça. Talvez esta não seja a última apelação.Minha mãe está chorosa e trêmula. Faço o possível para ser forte por ela, mas não suporto ficar no mesmo cômodo. Seria mais fácil com qualquer outra pessoa, mas, com minha mãe, é horrível. Quero que ela me console, não o contrário, e quase fico irritado por vê-la assim, apesar de também ficar triste com isso.
Olho o telefone.
Acabei de falar com o Poncho — ele me ligou para que eu o animasse um pouco.
Ele está bem.
Vocês todos vão ficar bem, não importa o que aconteça.
Me avise se eu puder fazer alguma coisa. Posso atender o celular a hora que for.
Bjos, DulceEu me sinto acolhido por um momento, depois de uma manhã inteira sentindo medo constante. Lembro minha nova resolução de contar a Dulce de modo claro como me sinto e fazer as coisas seguirem em uma direção mais séria, por exemplo, conhecer pais etc.
Mãe: Querido?
Uma última olhada no espelho. Uma versão mais magra, de cabelo mais comprido e mais alta de Poncho me encara de volta.
Não consigo tirar meu irmão da cabeça — não paro de me lembrar da cara dele quando a sentença foi lida, o fluxo infinito de bobagens sobre crime premeditado, a sangue-frio, como os olhos dele ficaram arregalados e lívidos de medo.
Mãe: Christopher? Querido?
Eu: Estou indo.• • •
Olá outra vez, tribunal.
É tão sem graça. Nada parecido com os bancos de madeira e os pés direitos altos das séries americanas — só muitos arquivos em mesas, carpete e assentos de diferentes alturas, onde alguns advogados e jornalistas entediados se acomodam para ver. Um dos jornalistas está tentando achar uma tomada para carregar o celular. Uma estudante de direito está lendo o rótulo de uma garrafa de vitamina.
É estranho. No início deste ano, eu teria vontade de gritar com os dois. Prestem um pouco de atenção, porra. Vocês estão vendo a vida de alguém ser destruída. Mas tudo faz parte do drama peculiar deste ritual e, agora que a gente sabe jogar o jogo — agora que temos uma advogada que sabe as regras —, o ritual não me incomoda tanto.
Um homem enrugado, vestido com uma longa túnica como um personagem de Harry Potter, entra com um guarda e Poncho. Poncho não está algemado, o que já é uma vitória. Mas está com uma cara tão ruim quanto eu imaginava. Ele ganhou corpo nos últimos meses, voltou a se exercitar, mas, com os ombros curvados, os músculos parecem pesar. Pouco parece o irmão que entrou no tribunal pela primeira vez no ano passado, aquele que tinha total confiança de que, quando somos inocentes, saímos livres. O irmão que cresceu ao meu lado, acompanhando cada passo meu, sempre me apoiando.
Quase não consigo olhar para ele — é doloroso demais ver o medo em seus olhos. De algum modo, vindo de algum lugar, consigo abrir um sorriso encorajador quando ele olha para mim e para nossa mãe. Eles o colocam em uma área cercada com vidro e fecham a porta. Esperamos.
O jornalista consegue achar a tomada e continua lendo o que parece ser o site da Reuters, apesar do cartaz enorme proibindo o uso de celulares bem acima da cabeça dele. A garota da garrafa de vitamina puxa fios soltos de um cachecol fofinho. Tenho que continuar sorrindo.
Maite está aqui, vestida com aquela roupa ridícula, quase igual aos outros advogados, apesar de eu tê-la visto comendo comida chinesa na minha cozinha.Sinto um arrepio só de olhar para ela. É gutural, instintivo.
Tenho que me lembrar o tempo todo que ela está do nosso lado.Homem envelhecido de túnica: Todos de pé!
Todos se levantam.
Três juízes entram na sala em fila.
Será que estou generalizando ao dizer que literalmente todos são homens de meia-idade brancos cujos sapatos parecem valer mais que o carro da minha mãe?
Tento abafar o ódio enquanto eles se acomodam nos assentos.
Folheiam a papelada à frente.
Olho, por fim, para Maite e o promotor.Nenhum deles olha para meu irmão.
Juiz 1: Vamos começar?
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PÓS-IT | Vondy - Adaptação
RomanceDepois de três meses do fim do seu relacionamento, Dulce finalmente sai do apartamento do ex-namorado. Agora ela precisa encontrar o quanto antes um lugar barato onde morar. Contrariando os amigos, ela topa um acordo bastante inusitado. Enrolado com...