XXIII - Estamos afogados e cansados

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O TELEFONE TOCAVA insistente, e Jimin apertou os olhos na tentativa de negar que estava mesmo acordando. Queria ficar deitado para sempre naquela cama, seu coração estava tão dolorido que acreditou na verdade de que se partiam em pedacinhos.

Levanta e arrasta os pés no chão, ao tirar o telefone no gancho a sua voz não saiu como gostaria.

— Bom dia...

— Jimin? Está tudo bem? Sua voz está tão cansada. Aconteceu algo? — a voz de Yuna era gentil e preocupada. — Jimin?

Os olhos castanhos se enchiam de lágrimas, o que o assustou. Era diferente quando seus pais perguntavam isso, algo interior brotava como se fosse o lugar mais seguro do mundo para se desabar de uma vez por todas. Não chorava fácil, mas lá estava novamente como uma criança que necessitava do colo de seus pais.

— Estou bem, mãe...

— Jimin, você já tomou seu café da manhã?

— Sim, eu improvisei alguma coisa...

— Temos uma proposta, Jiminie. Uma proposta muito boa.

— O que?

— Eu e seu pai decidimos que você deveria voltar para Busan, vamos morar juntos outra vez. Se sentir que precisa do seu espaço, ele estava pesquisando essa semana alguns condomínios pertos, achou dois que parecem ideias. O lugar é maior do que esse seu apartamento, e tem elevador. Elevador! — dá uma risada contente — Subir toda essas escadaria acabaria com os nossos joelhos um dia, e mais uma coisa... Seu pai quer comprar esse apartamento para presenteá-lo.

Jimin sentiu o coração saltar com tamanha surpresa.

— Você não precisará mais pagar aluguel, Jimin. Será o seu novo lar.

O ruivo abaixa a cabeça, olhando para um canto vazio e ignorável, sua mente estava longe agora. Se lembrava de todas as noites frias que enfrentou ao dividir os quartos na pensão, a demora que levou para juntar dinheiro o suficiente e conseguir juntar para alugar aquele apartamento, e as horas extras para conseguir comprar todos aqueles móveis. Apertou o tecido de sua camisa sobre o peito e fechou os olhos.

— Obrigado, mãe... Agradeça ao papai.

— Está aceitando? — escutou a risada feliz, e a mulher anunciando ao marido — Ele aceitou! Ele virá para Busan...

Jimin morde o lábio inferior enquanto tenta suportar a lágrima. Como poderia ir embora daquele lugar? Era o que restou de suas últimas lembranças ao lado de Jungkook, e se ele fosse procurá-lo um dia? Nunca mais se encontrariam. Nunca mais o acharia. Nunca mais fecharia os olhos e o veria ali, parado, unindo a beleza mais angelical e cruel de uma só vez.

— Eu não posso aceitar... Não posso.

— O que? Mas...

— Eu agradeço, mas não irei aceitar. Essa é a minha casa, e é aqui que vou ficar.

— Mas, Jimin! Pense bem, filho! O lugar é lindo, se tivesse com um celular eu o mandaria as fotos... Por que não tem um celular? Deveria comprar um, deveria mesmo... Eu irei hoje mesmo ver isso. Posso levar ou mandar pelo correio, tentaremos voltar em breve, mesmo que a viagem seja longa, acredite. Estou falando sério, você deveria repensar! Prometa que irá pensar?

Sem pensar Yuna tinha começado a falar tudo o que passava por sua cabeça.

— Sei que não fomos bons pais nos últimos anos, Jiminie, mas iremos fazer de tudo para recuperar isso. Eu juro, estamos aqui para o que precisar, e se você desejar ter algum tipo de relacionamento... — trava um pouco, mas diz: — um namorado, nós queremos conhece-lo! Você é bonito e inteligente, e nós queremos ajudar no que precisar, aliás, você está precisando de algum dinheiro? Podemos enviar... Qual é o número da conta? Espere um pouco, vou pegar a minha agenda para anotar...

— Mãe, está tudo bem! — a interrompe depressa — Eu não preciso de dinheiro.

— Mas você não está trabalhando, precisa repousar. Não deve ter dinheiro!

— Não se preocupe, eu sei me cuidar. Prometo avisar se algo acontecer.

— Sei disso. Jimin... Mas não gosto da ideia de estar sozinho em um subúrbio igual a esse.

— Não é um subúrbio... — diz com a voz embargada — Francamente, eu preciso desligar... Tenha um dia feliz, mãe...

— Não é que eu deteste o lugar em que vive agora, Jimin, só seria mais fácil para todos nós. Não estaremos longe e você ficará seguro.

— Não sei... Olha, agora não posso te responder isso.

Jimin inspira fundo e afasta o telefone colocando-o no gancho. Não tinha forças para conseguir responder em voz alta aquelas palavras, era como se estivesse se colocando em perigo iminente, sendo um tolo.

Não queria pensar em mudanças, pois de agora em diante o máximo que seria capaz era sobreviver nos dias seguintes. O futuro havia se tornado um grande abismo escuro, e não conseguia pensar em nada além de Anpanman sendo usado pelo exército para o resto de sua funcional eternidade. Por que sentia aquela angustia no peito? Se houvesse uma maneira de trocar seu corpo de lugar com o de Jungkook, por pior que fosse o preço, assim faria.

Iria voltar para o quarto, mas escutou os miados chamarem sua atenção. Pan não estava dentro da casa, e os filhotes ficaram sozinhos. Sentou ao lado da caixa improvisada e quentinha, acariciando-os. Alguns já haviam aberto os olhinhos, e isso quase o fez sorrir. Foram questões de minutos para sua mente ir para longe, e então fora do seu controle bolar inúmeras possibilidades fantasiosas aonde ele resgatava Jungkook do exército. Havia lágrimas, trocas de tiro, reconhecimento do exército e a liberdade para um homem com o coração de aço.

Observou, desconsolado, aquela sala vazia. 

ANPANMAN - JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora