05 - Aquele com as pegadas.

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🎨 | Boa leitura!

Tomei o cuidado de acordar antes que ela na manhã seguinte

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Tomei o cuidado de acordar antes que ela na manhã seguinte. Para a minha sorte, Dulce não é o tipo de pessoa matutina.
Vou até a cozinha e vasculho no lado dela do armário. Encontro um pacote aberto de farinha de aveia, que ela deve ter usado no dia anterior para o café da manhã, eu senti o cheiro de mingau de idoso quando voltei da loja de móveis. Não sei se ela costuma repetir as refeições, mas posso trabalhar a longo prazo.

Desço até a portaria com uma pequena vasilha em mãos e vou até uma construção que está acontecendo na esquina da rua. Quando eu pego um pouco da areia, alguns dos trabalhadores me olham como se eu fosse maluco, mas eu só dou de ombros e ofereço minha melhor carranca para que eles parem de me encarar. Volto ao apartamento e tomo cuidado ao misturar a pequena porção de terra com a farinha de aveia, depois coloco no lugar onde eu achei.

Tomo meu próprio café da manhã e nesse meio tempo Dulce nem dá sinal de vida. Assim que acabo, o interfone toca. É o transportador que eu contratei para trazer o meu computador, que estava pegando poeira naquela garagem imunda da Norah. Eu devia saber que nós não daríamos certo no momento em que notei que ela não se importa em tirar a poeira de todos os cômodos todos os dias. Uma acumuladora de micro-organismos.

O entregador deixa as caixas com as peças do meu computador no escritório. Agora eu só tenho que tirar as coisas da Dulce do caminho para montar. Vai ser um prazer transferi-la para o outro lado, longe da minha vidraça.

Vou para a frente do quadro que ela está pintando e paro antes de tocar as laterais da tela. É a primeira vez que eu vejo uma pintura dela. Claro que essa não está pronta, dá para ver pelos esboços a lápis contornando regiões ainda sem cor. Parece que ela está fazendo um bosque e tem uma pessoa no centro. Uma mulher, mais especificamente. A paisagem está quase toda coberta de tinta, o corpo da mulher também, mas ela ainda não tem rosto. Observando mais devagar e com mais atenção, noto o contorno de asas atrás da mulher. É uma fada.

Se Dulce tivesse me dito que gosta de pintar fadas, eu teria rido sem pensar duas vezes, mas olhando para o que ela fez, a última coisa que eu quero é rir. Odeio ter que admitir, mas está lindo. Essa mulher detestável é realmente talentosa e sua pintura não tem nada a ver com os vasos de planta horrorosos que ela fez e que estão na varanda. A arte de modelar argila deve ser bem mais difícil para ela.

É incrível. Dá para ver as sombras na pintura, a profundidade, a diferença de luminosidade onde ela pintou luz solar por entre as folhas das árvores... É tudo tão detalhista, com pinceladas que se diferem de acordo com aquilo que ela tentou passar. Ergo minha mão por instinto, como quando vemos algo bonito e inconscientemente tendemos a nos aproximar.

— Se fizer isso, será um homem morto. — a voz dela ressoa decisiva até mim.

Pisco meio confuso e a vejo perto da porta, que eu sequer ouvi abrir. Estava tão inerte no quadro que nem a notei. Como ontem, quando ela estava pintando essa mesma obra e eu tentei falar com ela sem ser ouvido.

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