46 - A n j o D a M o r t e

29 5 3
                                    


The Weeknd - Angel

Porque tudo que eu vejo são as asas,

eu posso ver suas asas

Mas eu sei o que eu sou e a vida que vivo, sim,

a vida que eu vivo

E mesmo que eu peque,

talvez nós nascemos para viver

Mas eu sei que o tempo dirá

se estamos destinados para isso, sim,

se fomos destinados para isso

Riley Donovan

Sinto os nós da mão direita doerem depois de socar a maldita porta do elevador. Não me atrevo a descer as escadas, seria inútil.

— Merda! — soco a maldita porta de novo apenas para descontar minha frustração.

Volto a passos largos para a minha sala ignorando alguns olhares que recebo no caminho. Anya está pálida de pé no meio da antessala, ela engole em seco, assustada e de olhos saltados.

— Cancele minha agenda do dia. — é tudo o que eu digo ao passar por ela e bater a porta do meu escritório com tanta força, que as dobradiças rangem.

Aperto os dedos na testa respirando fundo, tentando me acalmar. Tiro o paletó e a gravata, para me livrar da sensação de sufocamento. Ela escapou pelas minhas mãos, estava tão perto de desistir, tão malditamente perto. Eu só precisava fazê-la entender que existe uma linha tênue entre justiça e vingança. Quando essa linha é ultrapassada, o caminho de volta pode nunca ser encontrado.

Na justiça entregamos aquilo do qual se é merecedor, mas quando entregamos algo que ultrapassa o justo, concedemos vingança. Nem todos estão preparados para vingança, porque quando descobrimos que ela não é suficiente, sucumbimos ao lado sombrio da morte.

Ela ainda não esta pronta para viver isso.

Eu devia ter previsto que ela fugiria.

Devia saber que ela não me escolheria.

— Porra! — chuto uma das cadeiras quando surge diante da minha vista.

Chery é esperta, ao perceber que a situação estava fugindo do seu controle, ela fugiu. Mas eu estava muito ocupado admirando o vinco sutil entre as sobrancelhas, o arfar suave entre os lábios. Eu estava cego por ela, muito satisfeito em saber que agora possuía minha doce obsessão, não vi os sinais com clareza.

Caminho para a mesa e reviro os papéis, à procura do meu celular pessoal. A demora em encontrá-lo me faz jogar todas as coisas pelo chão, impaciente. Luminária, notebook, pasta, documentos, tudo vai ao chão. Eu o encontro debaixo de uma pasta de documentos que também descarto. O primeiro número que disco é o de Liam.

Chama duas vezes antes de a voz forte me atender formalmente do outro lado.

— Vá atrás de Chery no apartamento dela, agora. — ordeno fazendo o possível para me manter calmo.

— Sim, senhor. Há algo que eu deva saber?

— Não a deixe sumir, Liam.

A linha fica em silêncio por um tempo, e eu o tomo para raciocinar.

— O que aconteceu?

— Me ligue assim que tiver algo para mim, Liam. — não há como explicar tudo, não nesse estado caótico em que minha cabeça se encontra.

— Tudo bem.

É tudo o que Liam diz antes que eu encerre a chamada.

Caminho de um lado a outro na tentativa de impedir que minha raiva tome o controle da situação. Eu fui um tolo em acreditar que seria tão simples. Eu não era suficiente para ela, e o que eu podia lhe oferecer era pouco, porque Chery queria mais.

Ela não quer apenas vingança, ou sangue, não. Chery quer destruição, desespero e dor. A combinação perfeita do caos.

Meu celular volta a tocar e meu peito dispara na esperança estupida de que Liam já tenha a encontrado, no entanto, o nome de Samuel surge na tela. Assim que eu atendo a chamada, a voz de Samuel surge afoita no meu ouvido.

— Acabei de chegar em Boston.

Ele havia ido ao Michigan, estado de nascença de Chery para investigar de perto os registros do orfanato. Tudo que eu conseguia pensar é que não importava o que ele havia descoberto, porque eu a havia perdido.

— Eu a perdi, Samuel. — minha voz saiu a meio engasgo.

— O que? Do que você está falando?

Puxei o ar com calma.

— Ela estava aqui, nas minhas mãos, e eu a perdi. — olho para a bolsa descartada na cadeira, diante da minha mesa, a raiva sacudindo meu peito. — Ela fugiu de mim.

— Puta merda! — parece entender exatamente do que estou falando.

Escuto seus xingamentos de incredulidade quando junto as minhas coisas e caminho até a maldita cadeira apegando a bolsa de Chery.

— O que vamos fazer? — pergunta através do ruído de trânsito.

— Vou atrás dela, vou a trazer de volta.

No fim, tudo o que me importa é que Chery esteja bem, e que seus pedaços mutilados estejam firmes o suficiente para fazer ela sobreviver e quem sabe, me aceitar.

— Certo — Samuel concordou de pronto conforme eu caminho para fora da minha sala. — Estou indo para o hangar.

Passo diante de uma Anya um tanto pálida e perdida. Não posso culpá-la, é a primeira vez que algo assim acontece. O elevador não demora mais que alguns segundos para chegar ao meu andar.

— Chame Jacob, quero todos vocês comigo, não tenho um bom pressentimento sobre como as coisas vão ocorrer agora.

— Considere feito, Jacob estará lá comigo.

— Nos vemos em trinta minutos.

Antes que eu encerre a ligação, ouço a voz de Samuel me chamar.

— Eu tinha a intenção de falar com você a sós. — a voz de Samuel fica séria do outro lado. — Já que nossos planos mudaram, acho importante falar sobre algo que descobri.

— Fale.

Peço, mas pelo tom sombrio na voz de Samuel, não sei se quero mesmo saber o que ele tem a me dizer.

— Acho que Chery está morta.

Meu coração falha em uma batida. O silêncio se torna austero dentro do elevador e uma pressão cresce em minha cabeça ao criar uma linha finita de cenários.

Eu soube desde o início que ela era como uma força da natureza. Foi ignorante da minha parte acreditar que ela não me destruiria, ela era a fórmula perfeita: bela, forte e brutalmente catastrófica.

E agora, estava indo viver sua vingança.  

DESEJO ASSASSINOOnde histórias criam vida. Descubra agora