- ...Sugawara?
- 'Tô te ouvindo, minha querida – Sugawara confirmou, tirando um suspiro aliviado de Kiyoko. Esperando ser discreta, ela limpou os cantos dos olhos inchados. – Aconteceu alguma coisa?
- A Yachi voltou pra cidade.
- Quê? Isso é ótimo! Eu nem esbarrei nela ainda...
- É, é ótimo, mas— me escuta – Ela pediu, e Sugawara imediatamente ficou quieto como um túmulo. Quando tinha dúvidas sobre o que devia fazer ou se via em uma encruzilhada, era para ele que Kiyoko corria: de longe, era o rapaz em quem ela mais confiava da época do colégio, e Tanaka teria que perdoá-la por isso. – Eu... Acho que ainda sinto tudo aquilo por ela.
- Ah.
Sugawara era o único que sabia que Kiyoko já sentira alguma coisa por garotas – por uma única garota, na verdade, assim como ela era a única daquela época a saber de antemão que ele gostava de garotos. Mais especificamente, que era caidinho pelo capitão, e ela serviu de ombro amigo para ele chorar quando ele firmou um relacionamento com Michimiya.
- Kiyoko, querida, isso é...
- Complicado, eu sei – Ela interrompeu, respirando fundo. Olhou para o teto do quarto e só viu escuro; tinha a terrível mania de desligar todas as luzes e escancarar todas as janelas quando precisava pensar. Não que ajudasse em qualquer coisa, mas era terapêutico. – Eu só vi ela algumas vezes, mas ela é tão... Uau, entende? Eu fico perdida, eu me perco nela. E não consigo nem me sentir bem com isso por causa do...
- Por causa do Tanaka – Ele concluiu, poupando-a de expor-se tanto. Eles se entendiam, afinal, de um jeito complementar e sinistro: os muros entre eles e o que desejavam só mudavam de origem. – Eu odeio ter que dizer isso, mas eu avisei que era melhor você tomar um tempo pra você antes de entrar num relacionamento com ele.
- Mas eu... Eu sou feliz com ele, não me entenda mal, Suga.
- Mas você o ama?
Silêncio. Kiyoko sentia que queria esganar Sugawara toda vez que ele fazia essa maldita pergunta – ela amava Tanaka, okay, só... Do seu próprio jeito. Amava-o como um parceiro, como um melhor amigo, era complacente e compreensiva. Ele fazia ela se sentir bem consigo mesma, com ele, com o mundo.
- Kiyoko, se você tivesse que me responder agora, por quem diria que é apaixonada?
Por ela, o coração de Kiyoko gritou em resposta, levando sua consciência aos ápices do inferno, eu sou apaixonada por ela, pela Yachi.
- Ela é... Nós somos duas mulheres. Não é tão fácil quanto parece.
- Eu sei perfeitamente bem que não é tão fácil quanto parece – Sugawara respondeu, ácido, e Kiyoko quis dar um tapa na própria cara. Claro que ele entendia. Nesse quesito, e de um jeito bem doentio, eram praticamente parceiros de crime. – Já estive num lugar parecido com o seu, só que... Sem o luxo de escolher. Na verdade, eu 'tava quase no lugar da Yachi, e devo dizer que continuar na dúvida só vai machucar vocês.
- Eu não quero machucar ele com isso. Eu não quero machucar ninguém.
- E você tem que machucar a si mesma pra isso? – Sugawara indagou, e suspirou depois de só receber o silêncio como resposta, de novo. – Kiyoko... Se você ligou pra mim é porque já sabe o que fazer, mas não tem coragem.
- Você não 'tá facilitando nada.
- Você não 'tá facilitando nada. Eu 'tô te dando a resposta que você quer ouvir, mas não vai aceitar – Sugawara continuou, cada palavra atingindo Kiyoko como um dardo: fatal e certeiro. – Kiyoko... Se você ama essa garota, corra atrás dela. Você já achou que tinha perdido sua última chance, ver ela de novo é um sinal de destino. E... O Tanaka te ama o suficiente pra querer que você seja feliz com quem for.
- Ele poderia entender se eu quisesse outro homem. Ela e eu... Somos duas mulheres. Eu tenho família que não vai entender, eu tenho uma... Eu tenho uma imagem que eu quero alcançar.
- E você vai continuar miserável pra alcançar essa imagem que, honestamente, não significa nada pra ninguém além de você?
- Eu não estou miserável – Kiyoko vociferou ao telefone. Adorava Sugawara, sabia que eles eram os maiores confidentes um do outro, mas às vezes tinha vontade de estrangulá-lo com as próprias mãos por saber todos os seus pontos fracos. – Eu posso ser feliz com o Ryuu.
- Kiyoko, você 'tá num relacionamento com alguém que não ama. Isso só vai machucar vocês dois... E, se a Yachi tiver qualquer sentimento por você, também vai machucar ela. Vocês são duas mulheres, e isso é arriscado no mundo de hoje, claro, mas... Você ama ela. E às vezes, só isso faz todo o resto valer a pena.
Shimizu continuou quieta.
- Você pode ser a mulher perfeita e também ser lésbica, Kiyoko, não tem problema nenhum nisso.
Kiyoko desligou a ligação, sentindo o coração e o estômago afundarem para algum confim de seu corpo, deixando um buraco gélido em seu corpo. Sentir atração por uma mulher não fazia dela lésbica. Ela não sofreria por um rótulo como esse.
Tinha decidido isso cedo demais para mudar de caminho agora – seria a mulher perfeita que o mundo queria que ela fosse, seria uma filha de dar orgulho, uma trabalhadora, uma esposa, uma mãe de dar orgulho – sem romances lésbicos para estragar a história que ela vinha confeccionando desde os 17 anos para si mesma. Uma história perfeita, sem surpresas, sem intrigas... Sem problemas e sem ninguém caçando-a por quem amava ou deixava de amar.
No desespero de se distrair do assunto, lembrou-se que precisava fazer as compras e foi se arrumar para sair de casa. Sugawara ligou de novo, mas ela, ocupada, não atendeu. Às vezes seu confidente fugia de todos os limites.
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Que História É Essa?! (Haikyuu!!)
Fanfiction" - São Longuinho, São Longuinho... Se eu achar o amor da minha vida, eu dou vinte pulinhos." No qual ex-jogadores de vôlei do ensino médio enfrentam as dificuldades e artimanhas da vida adulta. ✧*:.。. | Sequência ficcional / Caracterização LGBTQIAP...