01 - A Espera

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O Aurora estava lotado, abafado, escuro e barulhento. Risadas, música... Tudo contrastava com a atmosfera fria e cinzenta do lado de fora do bar.

Todo nosso grupo estava reunido, rindo e conversando como se nada terrivelmente traumático tivesse nos acontecido apenas um ano atrás. Tomas e Hanna estavam tão envolvidos em seus afagos e sussurros que não notariam mais ninguém no mundo. O amor deles aquecia meu coração, e por seus sorrisos discretos e risadas tímidas, percebi que ela estava, de fato, feliz.

Cleo estava se divertindo às custas de Dan, que já estava bêbado há um tempo, em parte graças às bebidas que Phil continuava mandando para mim do bar.

        - Chega, Dan. Não precisamos de outro alcoólatra no nosso grupo, você já conta como dois.  Explodiu Jessy, interrompendo Dan enquanto ele devolvia meu copo, ignorando completamente quem estava enviando todos esses shots.

        - Diz isso para o seu irmão. Eu tô só... Fazendo controle de danos. - Respondeu Dan, envolvendo meu ombro com o braço e me abraçando de forma protetora. 

Eu deixei escapar um riso contido. Jessy então se levantou, segurando-me gentilmente pelo cotovelo.

        - Sei, tá bom. Vamos passar no banheiro, MC. Eu não quero que você fique cheirando a cerveja igual ao Dan. - Jessy disse de forma bastante dramática. 

Eu a segui rindo, dando tapinhas nas costas de Dan, implicando que Jessy estava certa e que talvez ele tivesse atingido seu limite naquela noite. Ele sorriu, levando meu copo aos lábios mais uma vez.

Com Jessy segurando minha mão, atravessamos o corredor com dificuldade, passando por casaizinhos recém-formados, grupos barulhentos de amigos e homens tentando bloquear nosso caminho para puxar conversa. Quando finalmente alcançamos o corredor que levava aos banheiros, ouvi uma voz familiar se destacar em meio à música alta.

        - Vocês duas, passem aqui no balcão quando voltarem. Eu também quero um gostinho da celebridade mais procurada de Duskwood. - Phil gritou enquanto servia uma garrafa para um grupo de homens no balcão.

Sorri e acenei, me sentindo mais desconfortável do que qualquer outra coisa. Atravessamos o corredor  e assim que a porta do banheiro feminino se fechou, Jessy apertou meu braço.

        - Você sabe que ele gosta de você, não é? - Ela disse, como se decretando um problema que exigia uma solução minha.

        - De mim e mais outras dez. - respondi, olhando para o reflexo de Jessy no espelho.

        - O que você quer dizer? - Ela perguntou ofendida.

        - Você sabe o que eu quero dizer, Jessy. Seu irmão é problema.

Ela sabia, eu sabia e até o Phil sabia: ele não estava interessado em nada sério comigo.

        - Problemas podem ser divertidos. - Respondeu Jessy, com um sorriso travesso. - Mas falando sério, eu não acho que você está dando crédito suficiente a ele. Ele é um cara ótimo... E eu nunca deixaria ele magoar a minha melhor amiga.

        - Eu não duvido que ele seja um cara ótimo, apenas não é o certo para mim. Além disso, o que você poderia fazer se ele decidisse me magoar de verdade? - Eu disse, tentando não soar grosseira. - Eu não quero mudar ninguém; deixa ele ser o pegador que ele quer ser.

       - Eu poderia... te ajudar a enterrar o corpo dele. - Ela disse com uma risadinha fofa. - Quero dizer, eu sei que você pode cuidar de si mesma. Às vezes, acho que é com ele que eu deveria me preocupar. Você pode ser a primeira mulher a receber tanta atenção dele e ainda sim não estar nem aí pro coitado. -  Jessy comentou, retocando casualmente a maquiagem no espelho.

       - Então caso resolvido. Além disso, você sabe que estou destinada a outro relacionamento potencialmente doloroso com uma pessoa ainda mais imprevisível. - Eu disse imitando um narrador de drama.

        - Você tem mesmo um gosto estranho para homem. - As palavras de Jessy assumiram um tom de tristeza e decepção.

        - Ah, não fala assim. Eu estou só brincando. Ele é o cara mais doce que já conheci -  Respondi, sacudindo o incômodo sobre Jessy ter tantas opiniões sobre a minha vida amorosa. Ela era minha melhor amiga, mas às vezes eu gostava de decidir as coisas totalmente sozinha.

        - Mas você acha que pode dizer que conhece ele de verdade? - Jessy disse, virando as costas para o espelho e olhando para mim. - Eu acho que esse é o problema. Você acha que o conhece, MC, mas eu não acho. Esse Jake pode ser só...

        - Shhhhhhh! - Interrompi de súbito. Mesmo que Duskwood parecesse bastante segura — considerando o departamento de polícia pequeno e lento — eu era extremamente cuidadosa com tudo relacionado ao Jake. Eu nunca me perdoaria se a polícia o achasse por minha causa.

        - Ok, ok... Caramba. Mas... -  Ela continuou, falando em um tom baixo.  - Ele pode ser apenas um perfil falso ou um nerd, um anti-social. -  Seus olhos expressavam mais curiosidade do que julgamento.

        - Bom, nerd e antisocial é praticamente certeza a esse ponto. - Sorri para ela.  - De qualquer forma, você sabe que não posso falar muito sobre ele. Deixa de ser tão curiosa, por favor. - Eu disse, apertando sua mão, grata pela preocupação, mas certa de que Jake não me machucaria... Pelo menos não de propósito.

Um ano atrás, quando a mina pegou fogo, Jake simplesmente desapareceu. Ele sumiu completamente do radar não só para as autoridades, mas também para mim. Alan Bloomgate estava ciente da nossa conexão e naturalmente manteve os olhos em mim por muito tempo desde o incidente. O plano era garantir que a polícia acreditasse que Jake havia morrido naquele inferno, então ele não foi capaz de me dar nenhum tipo de prova de vida, nem mesmo por código. Jessy testemunhou a minha tristeza naquele período. Eu simplesmente não conseguia aceitar o que parecia ser o fato de que nunca falaria com ele de novo.

Então, ele apareceu novamente. A confiança foi recuperada e, embora eu não tivesse visto o rosto de Jake ainda, nós desenvolvemos um relacionamento à distância bastante "normal", conversando quase diariamente. Depois de praticamente um ano, parecia que o momento certo finalmente havia chegado e nós poderíamos nos encontrar. O caso todo sobre o sequestro da Hanna havia esfriado, o plano parecia ter funcionado, abrindo caminho para o nosso encontro no Aurora.

Mas Jake estava muito atrasado naquela noite.

Noite com Ele - DuskwoodOnde histórias criam vida. Descubra agora