Eu, você e o tempo entre nós

3. Otávio: a festa.

   

   ─Sério, cara. Está tudo bem mesmo?

Mateus foi uma das únicas pessoas que me acompanhou de perto durante o processo pós-término. Embora usasse 70% do tempo que passávamos junto para fazer piadinhas e dizer o quanto eu era um idiota por dar tanto valor às coisas, ele era um ótimo amigo. Mesmo com um xingamento, ele conseguia me fazer sorrir quando minha vontade era acender um fósforo e jogar em meu próprio corpo – não antes de molhá-lo com etanol. É muito dramático, admito, mas era como eu me sentia há mais ou menos um ano atrás.

Com o passar do tempo, tornou-se difícil ficar triste com suas piadas fora de hora e ajuda muito o fato de ter duas irmãs desmioladas. Ter irmãs gêmeas mais novas foi complicado porque durante toda a minha infância eu me senti menosprezado ao quadrado. Ser irmão mais velho geralmente é um saco. "Não faz isso com sua irmã". "Não tá vendo que ela é menor que você?". "Não se acha muito grandinho pra discutir com uma garotinha?". Agora acrescente mais uma irmã a essa história e você terá um adolescente completamente oprimido por qualquer presença feminina que venha a ter na vida. Ao menos era assim que Melinda e Marina me faziam sentir.

A parte isso, elas foram se tornando ótimas irmãs com o passar do tempo. Entraram no time de futebol aos cinco anos e, posteriormente, quando nossa mãe quis matriculá-las no ballet, tivemos que ouvir um discurso de quase uma hora sobre estereótipos sexistas impregnados na sociedade contemporânea. Dá pra imaginar que as duas eram parada dura.

Quando souberam do término com Isabela, pegaram, escondido, suas bicicletas enfeitadas e saíram em toda a velocidade em direção à casa dela. A sorte foi que Mateus estava lá em casa no momento e ninguém era mais rápido do que ele quando se tratava de pilotar uma moto. Alcançou as duas em questão de minutos e, após uma longa conversa sobre como esse tipo de coisa acontece na vida – e a promessa de dois milk-shakes de chocolates gigantes – ele conseguiu convencê-las a voltar pra casa.

Naquela noite comemos pizza até a madrugada enquanto assistíamos à uma reprise das primeiras temporadas de Sons of Anarchy. Mateus cumpriu com o prometido e pediu no Disk entrega o milk-shake das meninas. Conversamos e rimos por horas até as gêmeas dormirem e só restar nós dois prestando atenção no seriado.

Nesses momentos, eu esquecia que existia uma Isabela. Esquecia o quanto ela havia me feito mal. Se eu pudesse criar um prêmio de Melhor Amigo Para Sair de Uma Fossa, eu criaria; e com certeza, esse prêmio seria do Mateus.

─Está tudo bem. – Respondi. – Já faz um tempo que não nos vemos. Acho que já superei.

─Acho bom mesmo, cara. – Ele tinha uma mania de balançar a cabeça ao falar a palavra "cara", como se fosse um mini gângster num seriado de drama americano. E quando estava dirigindo, incorporava ainda mais a personagem. – Eu soube que ela estava em Búzios, que seu pai instalou uma filial da construtora por lá.

Quando foi embora, há três meses, Bela não disse muito sobre sua mudança. Sua melhor amiga na época, Carolina Signor, também não falou muito sobre os motivos que a levaram para São Paulo e eu tampouco quis perguntar alguma coisa. Embora tivesse sido Bela quem terminou o namoro, por algum motivo, Carolina se recusou a falar comigo por muito tempo. Olívia disse, certa vez, que ela achava que eu estava fazendo muito drama, reagindo exageradamente a uma coisa que acontece com todo mundo. E, bem, talvez ela tivesse razão.

Apenas algumas semanas após ir embora, Bela me enviou uma solicitação pela sua nova conta do Facebook. Em sua foto do perfil, ela sorria, expondo seus dentes incrivelmente brancos e alinhados. E mesmo que aquilo fosse apenas uma foto e que estivéssemos a quilômetros de distância, eu me perguntava como ela conseguia sorrir enquanto eu ainda tinha dificuldades de até mesmo ler o seu nome, mesmo que não fosse dela que se tratasse.