8. Isabela: casa de repouso.

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A Casa de Repouso Doce Lar havia sido construída por uma tia-avó minha, a Dona Lenir Parissini, na década de 50. Tinha uma estrutura simples – foi planejada para ser uma casa comum, porém com muitas acomodações. A mãe de Tia Lenir estava muito doente, apresentava sintomas de Alzheimer e já não apresentava condições para viver sozinha. Tendo em vista isso e a ideia de que muitas outras pessoas, assim como sua mãe, necessitavam de cuidados especiais, Lenir decidiu fundar a Casa de Repouso e, desde então, dedicou o restante de sua vida à isso.

A Casa foi passada de geração em geração e hoje é administrada por uma prima da família, Paloma Parissini. Paloma e eu nunca fomos muito próximas, mas uma vez ou outra nos encontrávamos pela cidade. Era uma mulher jovem, bem sucedida e muito bonita. Trabalhava na assessoria de comunicação social do Ministério de Educação e tinha muita influência entre os nomes mais poderosos de Brasília. Como seu trabalho tomava muito do seu tempo, quase não tinha tempo para administrar a Casa de Repouso. Pensando nisso, contratou uma equipe inteira para ficar responsável pela administração do local e lembrou-se do meu nome durante isso. Me ofereceu uma vaga na recepção, mesmo eu não tendo nenhuma capacitação profissional ou experiência na área.

─Ora, querida, é só anotar umas coisinhas – Ela disse. – horários de visitas, ajudar as enfermeiras no que for preciso, auxiliar na limpeza, esse tipo de coisa.

Ou seja: ser uma faz-tudo com o cargo de recepcionista no contra-cheque – e um salário muito pequeno também. Porém, eu adorava trabalhar naquele lugar. Foi uma tristeza grande quando tive de me mudar para o Rio de Janeiro porque me afastar daquele lugar lindo e de todas aquelas pessoas incríveis que eu tinha conhecido também seria uma parte muito difícil da mudança.

Mas foi maior ainda a minha alegria quando voltei para Brasília e Paloma falou que a vaga continuava aberta. Uma das enfermeiras ficou responsável pelos serviços de recepção que eu exercia e o restante das tarefas foi dividido entre os demais funcionários. Felizmente, o emprego ainda era meu.

Aquele era o meu primeiro dia de volta ao trabalho. Por mais que a noite anterior tivesse sido uma tragédia das mais catastróficas, durante o meu turno eu poderia esquecer um pouco todas essas coisas que possuíam minha cabeça.

Só foi me aproximar da Casa e já fui recebida pela Dona Carmen, a senhorinha das flores. Passava o dia inteiro no jardim, plantando, regando e colhendo margaridas, lírios e rosas de todas as cores. No final do dia, quando já tinha em mão uma boa quantidade de flores, retirava as flores já desgastadas dos vasos e os repunha com flores novas e frescas. O ambiente se renovava à cada pôr-do-sol.

─Isabela, querida! – Fui envolvida por um abraço forte e aconchegante e não pude deixar de sentir o cheiro de patchoulli em seus cabelos esbranquiçados. – Quanto tempo! Por onde tem andado?

─Olá, Dona Carmen. Eu estava no Rio de Janeiro. Voltei faz poucos dias.

─Mas voltou pra ficar?

─Eu espero que sim.

─Eu espero também! Sentimos sua falta. Dona Paloma contou que estamos tendo aulas de dança? – A idade avançada nunca foi desculpa para Dona Carmen ter mal humor. Muito pelo contrário. Passara dos 70 anos, mas era a vitalidade em pessoa. Seus filhos moravam numa das cidades-satélites, porém eram muito ocupados. Achavam melhor que ela vivesse ali na Casa de Repouso, onde teria companhia e seria bem cuidada.

─Sério? Não acredito que perdi isso.

─É verdade. E o professor é uma belezinha.

Sorri.

─Isso torna tudo mais interessante, não é?

─Ah, com certeza. – Puxando a minha mão, ela me arrastou pelos três degraus que levavam até à varanda. – Venha, venha ver o pessoal. Ah, lembra-se de Ana Lúcia?

Eu, você e o tempo entre nósOnde histórias criam vida. Descubra agora