7. Isabela: lutar contra algo que já estava morto.

563 36 0
                                    

Quando acordei no dia seguinte, o vazio continuava lá. Eu me sentia estúpida por ter me precipitado e terminado um relacionamento que tinha tudo pra dar certo; me sentia uma idiota por ter feito com que Otávio sofresse de verdade; mas também me sentia digna de pena porque mesmo com todos os meus arrependimentos, se aquela situação voltasse a acontecer, eu faria tudo da mesma maneira, mais uma vez. Porque eu era escrava de uma inconstância incompreensível que por mais que me fizesse mal algumas vezes, era sempre o que me guiava.

Por sorte minha esse dia de fossa condisse com a chegada de papai em casa. Como trabalhava numa construtora, não tinha um local fixo de trabalho. Embora tivéssemos acabado de chegar de Búzios, a cada semana ele viajava para um lugar diferente, sempre na região centro-oeste. Às vezes sua estadia nessas cidades eram mais longas, levavam até duas ou três semanas e, certa vez, numa viagem à Bonito, ele permaneceu exatos 28 dias trabalhando na construção de uma pousada. Sentíamos muito sua falta, mas quando ele voltava a alegria era garantida.

Papai era o tipo de pessoa que conseguia tirar risadas de todo mundo. Fazia piada com praticamente tudo - bem, exceto com o Vasco e com o Partido dos Trabalhadores. Durante o almoço, o jantar e até mesmo no café da manhã, onde ninguém tinha disposição nem pra falar "bom dia", ele sempre estava radiante com uma nova piada ou história engraçada pra nos contar.

Dessa vez ele havia passado 12 dias trabalhando numa cidadezinha do interior de Goiás chamada Silvânia. Me levantei da cama com o mínimo de disposição que seja possível para um ser humano. Além do reencontro estranho da noite anterior, em dois dias começavam as aulas. Ver Otávio todos os dias. Ver Mateus todos os dias. Até ver Olívia todos os dias se tornaria uma coisa difícil.

Aquele definitivamente não era um bom dia.

─Bom dia para as mulheres mais bonitas do mundo!

Observei da minha cadeira, enquanto comia um pão dormido com gosto horrível, minha irmã mais nova, Elis, correr em direção ao papai e pular em seus braços. Mamãe largou o avental sobre a mesa e foi até ele para dar um beijo carinhoso em seu rosto. Ao meu lado, Renato, meu irmão mais velho, resmungou.

─Só as mulheres são bonitas e dignas de cumprimento?

─E bom dia para o cara mais simpático! - Papai colocou Elis no chão e caminhou até a gente, dando um beijo no topo da cabeça de cada um. - Sabem, já fui recebido com mais animação nessa casa.

─Desculpe, pai. Tive uma noite de sono horrível. - Falei.

─É o que acontece quando se fica até de madrugada em festas de universitários. - Renato sempre foi o maior dedo-duro que existe nesse mundo. Tudo bem que eu não fui a irmã mais nova mais fofa que possa ser possível, mas pensei que passaríamos dessa fase ao fazer 15 anos, mas ele já tinha 19 e continuávamos como duas crianças birrentas.

Papai olhou pra mim com uma expressão de interrogação.

─Que história é essa, mocinha?

─Fui à uma festa com Carolina ontem.

Ele olhou para mamãe, que deu de ombros.

─Isabela já tem quinze anos, Carlos. E além de tudo, elas voltaram antes das doze. Renato está exagerando.

Elas não. - Corrigiu Renato. - Isabela voltou sozinha.

Dessa vez foi mamãe quem me encarou com ar de interrogação.

─Isso é verdade?

Eu, você e o tempo entre nósOnde histórias criam vida. Descubra agora