Entreguei o café a Dona Ana e me sentei ao seu lado. Ficamos ali, quietas, apenas escutando vários nomes sendo chamados através do alto-falante. Enfermeiros correndo de um lado para o outro, pacientes caminhando pelos corredores, familiares tão preocupados quanto nós.
Desde a morte de minha mãe, hospitais me traziam uma sensação horrível. Aquele sentimento pessimista que insistia em me levar pela racionalidade e pensar que tudo daria errado, que tudo é suscetível a dar errado.
Eu precisava ser forte. Por mim, por Otávio e por Dona Ana. Não podia desmoronar naquele momento.
Enquanto sentávamos ali, liguei rapidamente para Carol só pra checar se as meninas estavam bem. Ambas estavam dormindo e nenhuma ainda havia acordado com fome. Instruí Carol a esquentar a mamadeira de Regina caso ela acordasse, já que Zoé geralmente tinha noites de sono longas e muito raramente acordava, chorando. Dizendo para que eu não me preocupasse, Carol desligou o telefone e eu voltei à realidade onde eu estava em um hospital e Otávio não estava nada bem.
─Você pode entrar se quiser, querida. – Dona Ana falou. – Só estou aqui fora porque preciso de um pouco de ar. É demais pra mim, sabe?
Assenti ligeiramente.
─Perfeitamente.
Olhei para a porta do quarto onde ele estava e me perguntei se estava pronta para encarar aquilo. Desde que chegara, ainda não o tinha visto e talvez vê-lo me levasse ao limite do que se pode suportar de dor e agonia.
Me levantei da cadeira, sem pressa e caminhei até a porta. Abri a maçaneta lentamente e, quando menos esperei, já estava dentro do quarto. Os olhos curiosos de Mateus e Olívia voltaram-se para mim, também surpresos por me ver ali. Voltei para Brasília sem avisar a ninguém, sem nenhum motivo aparente.
Aproximei-me de Olívia e a abracei.
─É tão bom te ver. – Ela disse.
Juntei as forças que ainda existiam em mim para lhe mostrar um sorriso verdadeiro. Era bom vê-la também.
Quando me voltei para Mateus, notei as lágrimas formando-se em seus olhos. Ele tentou engolir em seco, mas a dor foi mais forte do que ele. O choro começou a surgir sem receios e tudo o que consegui fazer foi abraça-lo com força, sendo envolvida por sua dor e me permitindo chorar.
A verdade é que Mateus e eu nunca fomos os melhores amigos. Otávio era o elo que nos unia e se mantínhamos uma boa relação, era por causa dele. Eu sabia que desde a primeira vez que terminamos, Mateus me odiava. Eu também não o culpava por isso. Se algum cara partisse o coração de Carol, eu com certeza o odiaria também. Mateus só havia feito aquilo porque era um bom amigo.
─Ele não pode morrer, Bela. – Mateus falou, entre soluços. O envolvi com mais força, sentindo minhas pernas bambear. – Não pode!
Senti meu corpo enfraquecer porque aquela foi a primeira vez que a palavra "morte" veio à tona. Eu tinha consciência de que aquilo não era uma possibilidade distante, mas ouvir alguém pronunciá-la tornava tudo aquilo real. Por mais insensato que pudesse ser, eu queria levar aquilo como um sonho, ou melhor, como um pesadelo, do que encarar como uma realidade.
Segurei Mateus pelos ombros e olhei em seus olhos de uma maneira que nunca fiz antes.
─Ele não vai, entendeu? Ele não...
Só então me permiti vê-lo. Estava deitado sobre a maca, estático, apenas o seu peito subia e descia, quase imperceptivelmente. Seu rosto trazia alguns arranhões, mas nada que pudesse me fazer acreditar que aquele homem, jovem e saudável, pudesse morrer a qualquer momento. Como aquilo era possível? Por que somos tão frágeis?
Me afastei de Mateus pra poder chegar mais perto da maca. Segurei a mão de Otávio, que naquele instante estava um pouco fria. Pude notar que ainda usava sua aliança de casamento. Otávio nunca havia mudado em relação a isso. Quando assumia um compromisso, não desistia dele tão fácil. Por isso eu me perguntava por que eu havia desistido tão fácil.
Estava claro desde o início que eu poderia tentar com quantos caras eu quisesse. Eu poderia beijar dezenas e amar mais dezenas, mas nenhum beijo me faria tão feliz quanto o dele e nenhum amor seria tão certo quanto o que eu sentia por ele. Isso só nunca esteve tão claro para mim quanto naquele momento.
Abaixei minha cabeça e depositei um beijo em sua mão. Eu sabia que aquilo não era um conto-de-fadas e que ele não levantaria daquela cama por conta de um simples beijo, mas eu queria que eu seu corpo, houvesse a prova de que meu sentimento era o mais verdadeiro possível. E que mesmo que todo aquele tempo tivesse passado, e mesmo que muito mais tempo se passasse futuramente, ele teria o mesmo significado pra mim.
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Eu, você e o tempo entre nós
Novela JuvenilOs romances vitorianos só existem na literatura e Isabela tinha plena convicção disso. Ponto. Ao menos era o que achava ao pôr um ponto final em seu namoro com Otávio, após dois anos de um relacionamento que passeou por uma montanha-russa de emoções...