39. Respire fundo (Por Isabela).

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            Não sei se era o meu cansaço ou a velocidade acima do limite, mas eu sentia que a cidade estava passando como um flash ao meu redor. Eu não sabia onde a Lua estava naquele momento e nem me preocupava em procura-la. Eu pedia, silenciosamente, ajuda a ela e a qualquer outra força universal que pudesse existir. Otávio precisava sair dessa. Otávio iria sair dessa.

Era irônico porque no exato momento que César disse que estava indo para Viena, meus pensamentos instantaneamente foram conduzidos à Brasília. E por mais que eu amasse Carolina com todo o meu coração, eu não acreditava que tinha sido por conta dela, embora no momento eu tenha pensado isso. Era como se, inconscientemente, eu precisasse estar perto de Otávio. Esse assunto só passava com clareza em minha mente quando estávamos próximos, mas isso precisava significar alguma coisa.

Seria possível que durante todo esse tempo tenha sido Otávio quem eu verdadeiramente amei? Meus sentimentos em relação a César pareciam muito verdadeiros pra mim, mas eram postos à prova quando eu estava perto de Otávio. Por que isso acontecia?

O trânsito estava tão vazio, que nem notei que o semáforo estava fechado quando virei o carro abruptamente na rua do hospital. Acelerei ainda mais só pra frear com mais força quando cheguei em frente ao hospital. Saí do carro rapidamente, travando com o controle remoto enquanto já caminhava para o hospital.

Cheguei à recepção, aparentemente nervosa, e olhei para a recepcionista, que lia alguma coisa numa revista de fofocas.

─Com licença – falei, olhando para todos os lados, como se esperasse que a qualquer momento, Otávio aparecia ali apenas com alguns arranhões. – Estou procurando por Otávio Cruz.

A recepcionista marcou a página que lia com o dedo, quando aproximou-se do computador para conferir onde ele estava. Enquanto ela olhava, minhas unhas batiam contra a mesa de mármore, pedindo silenciosamente para que ela fosse rápida.

─Encontrei. – Ela disse. – Quarto 115. Primeiro andar, à direita. A família está com ele e...

Ela continuou falando alguma coisa, mas não esperei para ouvir. Eu não me importava que a esposa dele estivesse ao seu lado. O que eu queria era chegar lá o mais rápido possível.

Corri em direção ao elevador e digitei, apressadamente, o número 1 que me levaria ao primeiro andar. Em questão de segundos, eu estava lá.

Segui as instruções da recepcionista e virei à direita. Assim que o fiz, encontrei Ana, a mãe de Otávio, encostada contra a parede. As mãos levada à cabeça em forma de preocupação. Diminuí o ritmo e aproximei-me sorrateiramente.

─Dona Ana?

Ela levantou os olhos, assustada, e ficou surpresa a me ver. Seus olhos voltaram a encher-se de lágrimas.

─Oh, Isabela...

Me envolvendo em seus braços, pude sentir todo o tremor que consumia seu corpo. A pobre mulher estava em estado de choque e eu não a julgava, até porque eu sabia que estava me aproximando do mesmo estado. Enquanto eu não o visse, não ficaria em paz.

Permiti que ela me abraçasse pelo tempo que quisesse e não pensei em fazer nenhuma pergunta naquele momento. Laís provavelmente estava com Otávio naquele momento, então eu esperaria ali fora até que surgisse um sinal de que era uma boa hora para vê-lo.

─Não chore, querida. – Ela disse, entre soluços. Senti meu coração se partir. Mesmo sofrendo com uma dor descomunal, ela ainda se preocupava comigo. A bondade de Otávio havia sido herança valiosa daquela mulher. Segurei sua mão com forças. – Ele vai sair dessa.

─Vai sim. –Falei, a voz muito falha. Olhei para a porta do quarto, que estava fechada. – Laís está com ele?

Ela balançou a cabeça.

─Laís foi embora há um ano.

Acho que a expressão de surpresa em meu rosto ficou clara, porque Ana se prontificou a me explicar.

─Eles estão separados. – Limpando as lágrimas que escorriam de seu rosto, ela limpou a garganta antes de continuar a falar. – Acredito que ela ainda não saiba do que aconteceu.

Olhei para a porta novamente, imaginando quem estava ali. Como se lesse meus pensamentos, Ana falou:

─Mateus e Olívia estão aí dentro. – Disse. – Estão aqui comigo desde que souberam.

Assenti levemente, segurando sua mão com delicadeza. Ela ainda chorava, mesmo que em silêncio. Suas mãos tremiam com o pavor que só uma mãe sente ao ter seu filho numa situação tão crítica. Aquilo me fazia estremecer da mesma maneira.

─Vou buscar um café para a senhora. – Falei. – Sente-se um pouco.

A ajudei a se sentar numa cadeira em frente ao quarto e fui até o final do corredor, onde havia uma máquina de café. Antes de pegá-lo, tirei meu celular da bolsa e procurei o contato de Laís no meu telefone. Como os números registrados no Facebook se conectavam automaticamente à agenda telefônica, esperei que o de Laís aparecesse. E estava lá.

Cliquei no número e o celular começou a chamar. No terceiro toque, ela atendeu.

─Alô? Laís?

─Quem é?

─Isabela. De Brasília.

─Ah. – Senti um pouco de indiferença na sua voz, mas acredito que não foi proposital, porque logo em seguida, ela tomou outra postura. – Oi, Isabela. Como você está?

─Eu estou bem, é sobre Otávio que queria falar.

Antes que eu pudesse continuar, ela se preocupou em interromper:

─Olha, Bela, eu sei que está com a melhor das intenções, mas esse é um problema que não lhe cabe resolver...

─Não, não. – Eu disse. – Não é sobre isso. Acabei de saber que você estão separados. É que...

─O que é então?

─Otávio sofreu um acidente. – Revelei. – Está em coma.

Sua reação foi completamente diferente da que imaginei. A princípio, ela continuou em silêncio, como se ainda estivesse digerindo o que acontecia. Foi quando retomou a fala que me espantei.

─Desculpe, Bela, mas não há muito a se fazer em minha posição.

─O quê?

─Você é quem devia estar aí, desde o início. Acredite que se existe uma pessoa que faria Otávio feliz por estar aí, essa pessoa não sou eu. É você.

─Mas ele é seu marido, Laís!

Ela suspirou.

─Em papel, sim. Mas papéis não significam nada para mim. – Fiquei em silêncio por um tempo e ela também. Se eu sentia indignação? Claro. Mas eu também a entendia, porque estava em sua mesma posição. Não podia gritar ou julgá-la por uma coisa que eu também estava passando. – Não posso pegar um avião pra aí agora, Bela. Mas, por favor, me mantém informada?

Foi minha vez de suspirar. Era difícil, mas eu não podia recusar aquele pedido. Não depois de tudo o que tinha feito para seu casamento.

─Tá, tudo bem.

─Obrigada.

Sem responder, desliguei o telefone e o joguei dentro da bolsa. E enquanto eu pegava o café para Dona Ana, eu pedi silenciosamente mais uma vez para que eu não precisasse dar a Laís as piores notícias possíveis.

Eu, você e o tempo entre nósOnde histórias criam vida. Descubra agora