Capítulo 4

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Mon

- Realmente acho que você devia cantar a última nota em mi maior, - insiste Austin. Parece um disco arranhado, repetindo a mesma sugestão absurda toda vez que terminamos de repassar nosso dueto.

Considero-me uma pacifista. Não acredito em resolver problemas na base da violência. Para mim, lutas organizadas são uma verdadeira barbárie, e a ideia de uma guerra me dá náuseas.

No entanto, estou a um passo de dar um murro na cara de Austin Mahone.

- A nota é baixa demais para mim, - digo, com firmeza, mas é impossível esconder a irritação.

Frustrado, Austin ajeita o cabelo escuro ondulado com uma das mãos e se vira para Mary Jane, que está inquieta, pouco à vontade, na banqueta do piano. - Você sabe que tenho razão, M.J., - implora a ela. - Vamos criar muito mais impacto se terminarmos na mesma nota, em vez de seguir a harmonização.

- Pelo contrário, o impacto vai ser muito maior com a harmonização, - argumento.

Estou prestes a arrancar os cabelos. Sei exatamente o que Austin está tramando. Quer que a música termine na nota dele. Desde que a gente resolveu se juntar para o festival de inverno, ele tem aprontado esse tipo de coisa, fazendo o possível para ressaltar a própria voz e me colocar de escanteio.

Se eu soubesse a diva que o cara é, teria corrido desse dueto como o diabo foge da cruz, mas o filho da mãe resolveu só mostrar a que veio depois que começamos os ensaios, e agora é tarde demais para pular fora. Investi muito neste número e, para falar a verdade, sou completamente apaixonada pela música. Mary Jane escreveu uma canção fantástica, e parte de mim não está com a menor vontade de decepcioná-la. Além do mais, tenho provas concretas de que a faculdade prefere duetos a solos, porque as últimas quatro apresentações dignas de bolsa foram duetos. Os juízes ficam loucos com harmonias complexas, o que essa composição tem de sobra.

- MJ? - Austin insiste.

- Hum...

Dá para ver a loura mignon praticamente se derretendo sob o olhar magnético de Austin. O sujeito tem esse poder sobre as mulheres. É bonito de doer, além de ter uma voz fenomenal. Infelizmente, tem total consciência de ambas as qualidades e nenhum escrúpulo em usá-las a seu favor.

- Talvez Austin tenha razão, - murmura M.J., evitando meus olhos ao me trair. - Por que a gente não tenta o mi maior, Mon? Só uma vez, para ver qual dos dois funciona melhor.

Até tu, Brutus?!, tenho vontade de gritar, mas mordo a lingua. Como eu, faz semanas que M.J. tem sido forçada a lidar com as exigências absurdas de Austin e suas ideias "geniais", e ela não tem culpa de se esforçar para encontrar uma solução.

- Certo, - resmungo. - Vamos tentar.

O triunfo brilha nos olhos de Austin, mas não se demora por ali, porque quando terminamos a música, fica óbvio que a sugestão dele é uma bela porcaria. A nota é baixa demais para mim e, em vez de realçar a deslumbrante voz barítono do meu par, me faz soar tão desafinada que desvia a atenção dele.

- Acho melhor Mon continuar na nota original. - Mary Jane ergue o olhar para Austin e morde o lábio inferior, como se temesse a reação dele.

Embora seja arrogante, Austin não é burro. - Tudo bem, - retruca. - A gente faz do seu jeito, Mon.

Cerro os dentes. - Obrigada.

Felizmente, nosso tempo acaba e temos de liberar a sala de ensaios para uma das aulas do primeiro ano. Ansiosa para sair dali, pego depressa minha partitura e visto meu casaco de la. Quanto menos tempo perto de Austin, melhor.

𝐎 𝐚𝐜𝐨𝐫𝐝𝐨Onde histórias criam vida. Descubra agora