- Desde o meu primeiro dia aqui Cassandra. - Fecho os olhos com força criando coragem para falar o que penso a algum tempo, engulo em seco e volto a olha-la. - Desde que cheguei aqui você age de forma estranha. Desmarca compromissos em cima da hora, some no meio da noite, o seu telefone não para, e muitas das ligações você fala em alemão. - Sorrio sem humor, apertando a arma com mais força. - Chega arrebentada em casa com frequência, e as suas... as suas cicatrizes não são nada normais.- Bianca...
- NÃO! As suas sumidas condizem com dias de crimes, Cassandra, barbáries que eu não pude investigar! Mas os seus sapatos e roupas voltam sujos de sangue e com estilhaços de vidros. E Cristo, eu já vi a droga da arma que você guarda no seu quarto. - Sinto minha garganta arder como se estivesse engolindo pregos e os meus olhos queimam com as lágrimas que não deixo cair.
- Que? - Seus olhos saltam em surpresa e ela se aproxima rapidamente. Dou um passo para trás e nego sutilmente. - O que você está dizendo não faz o menor sentido.
- Você vai negar? A arma na cabeceira da sua cama foi apenas um delírio meu?
- Não é um delírio, mas também não é o que você está insinuando. - Seu nervosismo é transmitido no português carregado que sai de sua boca. - Por favor, solta a sua arma, ok?
Afrouxo o aperto por alguns segundos e nego antes de recuperar meu raciocínio.
- Não é a primeira vez que temos a máfia na nossa porta, e alguma coisa me diz que não vai ser a última. Por que? - Sinto a adrenalina esquentar meu corpo e isso me deixa ainda mais agoniada.
- Bia... por favor. - Cassandra súplica em aflição.
- POR QUE?
- Eu tenho um passado, ok? Merda - Ela bate as mãos na lateral do corpo e me dá as costas, andando de um lado pro outro pela cozinha. - E não é a parte bonita e divertida que eu quero compartilhar com você, estou tentando superar isso, mas infelizmente ainda reflete no meu presente. - Suas mãos estão apoiadas no balcão, ainda de costas para mim, seus ombros estão caídos e a cabeça baixa.
- Você já fez parte... - não consigo proferir essas palavras, só de pensar sinto meu estômago revirar e a minha visão ficar turva.
Tiro o revólver da cintura e o coloco calmamente em cima do balcão perto da pia, tiro a blusa de manga, ficando apenas de regata e respiro fundo, me sentindo mais leve.
- Olha, não queria que... Que porra é essa? - Sua voz se exalta no momento em que seus olhos caem sobre mim.
Por um momento não entendo sua pergunta e indignação, então abaixo meus olhos, encarando meu corpo e logo me arrependo de querer apenas não sentir o peso do tecido no meu corpo.
Massageio levemente minhas têmporas e solto o ar.
- Não é nada. - Devolvo no mesmo tom indiferente e ridículo que ela me respondia a minutos atrás.
- Nada? - Cassandra vem em minha direção como uma águia prestes a pegar o seu jantar. - Como essas marcas podem não ser nada, Bianca? Que porra é essa em você?
- Uma noite de sexo salvagem, nada demais. - Reviro os olhos e posso jurar que ouvi Cassandra rosnar... Jesus.
- Não estou boa para piadinhas. - Seus dedos apressados param na barra da minha blusa e antes que eu possa impedir ela arranca o tecido do meu corpo.
- Estamos sem conversar a oito meses, eu genuinamente apreciaria um jantar antes disso... - Bocejo preguiçosamente enquanto sou virada bruscamente.
- Desde quando você leva esse tipo de surra no seu trabalho? - Pergunta agressiva, ignorando a minha gracinha.
Seus dedos passeiam suavemente na minha pele ainda dolorida, apesar de conseguir sentir o ódio exalando de seu corpo e ter a certeza que ela mataria qualquer culpado em dois segundos, ainda tinha delicadeza em seu toque.
- Desde que matei três russos e prendi mais dois. - Deixo o desinteresse nítido na minha voz, deixando implícito que não era nada demais, e ela ri com escárnio.
- Aqueles desgraçados ainda estão atrás de você? - Seus dedos descem até o cós da minha calça e ela abre o primeiro botão.
- Ei! - Bato em sua mão com agressividade e me afasto bruscamente. - Ficou maluca? - Meu protesto é ignorado e ela corta a distância que criei, me segurando pelo cós da calça enquanto me força a andar para trás. - Não te dei essa liberdade, para, Cassandra para com isso! - Desfiro tapas em seu peito e ombro ao me ver encurralada na parede, seus dedos abrem minha calça com uma facilidade ridícula, e em seguida sinto o frio atingir as minhas pernas, quando Cassandra a puxa até meus pés.
Me sinto exposta, mas não ameaçada.
Ela se afasta rapidamente e encara meu corpo com ódio. Os hematomas estão literalmente por todos os lugares, e eu me odeio por ter esquecido disso justo hoje. Suas mãos pousam na frente dos olhos, e ela inclina o corpo pra frente, os fios ruivos são puxados para trás com agressividade logo em seguida e seu olhar volta para mim.
- Quem vai matar aqueles desgraçados agora serei eu! - É a vez dela quebrar a primeira coisa que encontra, e eu sequer consigo ver o que é.
Visto minha calça e coloco a minha blusa em silêncio e coloco o revólver na minha cintura novamente.
- Quando isso aconteceu? - Ela parecia mais calma, ou pelo menos estava se esforçando para aparentar estar.
- Semana passada. - Repondo desinteressada.
- Mas fazem oito meses, Bianca.
- Sim, e apesar disso os que morreram não vão voltar e os que foram presos não irão sair nem tão cedo. - Sento no sofá de costas para ela e encaro meus dedos.
- Foi o que eles te disseram, não foi? - Assinto em silêncio e tento não me permitir voltar até aquele dia. - Por que não me contou? - Um pequeno sorriso aparece brevemente em meus lábios.
- Fazem oito meses, Cassandra. Sequer olhamos na cara uma da outra.
- É diferente. Apesar de tudo sempre cuidamos uma da outra... você sempre cuidou de mim, as incontáveis vezes em que arrumei confusão na rua e cheguei arrebentada em casa. Mesmo quando eu não queria, permiti que cuida-se de mim.
- Mas não apaga tudo que aconteceu... - Respiro fundo e levanto, caminhando até meu quarto, e paro repentinamente perto da porta. - E no fundo, mesmo que fossem criminosos, eu mereci isso, não foi uma morte justa, Cass.
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A Sombra Da Máfia
RomanceEntre despedidas dolorosas e expectativas altas, Bianca deixa para trás sua vida familiar para se juntar à polícia italiana. Apesar da desaprovação dos pais e do coração partido do irmão caçula, Pedro, ela encontra apoio em Cassandra, uma italiana m...