19 - O Terceiro Melhor

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Kai

Eu estava deitado de lado e observava o Gustavo, que tinha o olhar fixo no teto. Havia uma ruga entre seus olhos e eu tive certeza de que algo estava doendo nele. Não tinha como não estar, não depois da forma como ele se moveu sobre mim. Foi memorável, não ia reclamar, mas como médico, me preocupei.

– O que está te incomodando mais, as costas, a barriga ou o braço? – Perguntei.

A ruga se acentuou e sua boca se fechou numa linha fina. Fiquei observando seu corpo mais uma vez, como tinha feito há pouco. Era lindo, realmente; o tom dourado da pele fazia parecer que ele morava no litoral, o que me levava a crer que ele tomava banhos de sol periodicamente. Havia uma faixa mais clara de pele no quadril que evidenciava o fato. Havia também várias cicatrizes ao longo das pernas e abdômen e, embora eu não visse agora, nas costas também.

– Será que dá para esquecer que é médico, só um pouco? – Resmungou.

– Impossível.

Ele bufou e se virou para mim. Observei seu rosto. Lindo demais, caramba! Ergui a mão, tirei uma mexa de cabelo de sua testa e massageei a ruga entre seus olhos com a ponta do dedo.

– As costas – respondeu.

– Pode ser o pulmão ou a quarta costela fraturada.

– Você decorou minhas lesões?

– Decorei.

A ruga suavizou. Sorri. Ele definitivamente não devia estar acostumado com alguém se importando com ele. Me aproximei e o beijei nos lábios. Foi um beijo casto, como um recado do coração.

– Tudo bem com você? – Ele perguntou, retribuindo o beijo.

– Tudo bem comigo. Estou meio melado, tirando isso, estou bem.

Ele sorriu, e eu me lembrei do porquê não conseguia tirar os olhos dele quando estudávamos juntos.

– Fizemos uma bagunça aí, hm?

– Quer tomar um banho?

– Quero.

Peguei sua mão – já tinha virado um hábito isso – e fomos juntos para o box. A água inicialmente fria nos fez rir, depois desceu morna sobre nossos corpos marcados, o dele mais do que o meu. Pensei no milagre de estarmos ali, ainda em recuperação, porém vivos.

– Você chegou a ligar para as agências onde trabalha? – Perguntei enquanto ensaboava suas costas.

– Liguei. Não querem saber de mim. – Respondeu, amargo.

Queria poder ajudar. Não fazia ideia de como.

– Está rolando um processo coletivo contra os donos da boate. Certamente haverá uma indenização às vítimas.

– Essas coisas levam anos, Kai.

– Tem uma grande pressão por parte da mídia.

– Não fará diferença. Nesse país, políticos se safam e a gente se fode.

Ele não estava errado.

– Estou preocupado com você.

– Você é o primeiro.

Meu coração apertou um pouco mais. Virei seu corpo em minha direção e o encarei por um tempo.

– Tenho um amigo que é advogado. Tem experiência nesse lance de Previdência. Posso consultá-lo se há alguma opção para o seu caso visto que não pode trabalhar na sua área.

Indestrutível (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora