Gustavo
Kai me olhava com um semblante muito fechado. Foi nesse momento que percebi que eu o via melhor do que mais cedo. Na verdade, eu enxergava cada vez melhor, ainda que estivesse longe de ser como eu era antes, mesmo sem os óculos. Aos poucos aquele medo de perder a visão foi se desprendendo de mim, e me senti mais confiante.
Contudo, não estava tão confiante a ponto de ter essa conversa. Eu tinha feito meus malabarismos para fugir dessa situação, mas não fui bem-sucedido. A grande culpa disso era do próprio Kai, que veio falar da ex bem quando eu o tinha vazando em minha boca, algo para lá de decepcionante.
Eu fiquei possesso com ele, e me vinguei do meu jeito, ou seja, me divertindo no processo. Ver como ele ficou abalado ao ser excluído do sexo comigo me deixou ainda mais excitado, e aquele mesmo prazer perverso que eu tinha quando o perturbava enquanto éramos adolescentes me envolveu e elevou o nível experiência.
Infelizmente, minhas idiotices pareciam ter chateado o Kai. Ele queria se aproximar, entender, estreitar nossa relação, e eu seguia fugindo, do mesmo jeito que fiz a vida inteira. Agora eu tinha uma escolha simples diante de mim, mas não conseguia me mover. Não conseguia escolher porque minha alma ainda estava naquele buraco infestado de baratas.
Às vezes era assim que eu me sentia. Como se ainda estivesse naquele buraco, batendo à porta pedindo para sair. Talvez por isso a experiência do soterramento tivesse sido tão mais pavorosa emocionalmente do que fisicamente. Foi como um lembrete de que nunca saí do lugar. Talvez nunca saísse.
Kai me pressionava. Como sempre, ele me empurrava numa direção. Seus olhos sempre me vasculharam e me fizeram querer coisas que eu não devia, então eu me sentia inclinado a fazer coisas que não devia. Nunca entendi esse lance com ele e se fosse honesto comigo mesmo, diria que eu amava esse cara e que talvez ele fosse o único capaz de me tirar da escuridão.
Ainda assim, eu tinha medo.
Eu poderia partir. Já estava enxergando de novo, bastava dar as costas, chamar um Uber e viver minha vida de merda como sempre. O problema era que eu não conseguia me afastar do Kai. Toda vez que pensava em seguir em frente, meu coração se apertava e eu me lembrava de sua mão segurando a minha naquele buraco infernal. Como num reflexo, peguei sua mão e entrelacei nossos dedos.
– Minha história é uma merda, Kai. Tenho medo do que você vai pensar quando ouvir. Eu tenho certeza de que você vai me mandar embora quando descobrir o tipo de pessoa horrível que sou.
– Tentei te mandar embora da minha vida durante toda a minha adolescência e nunca consegui.
Droga, ele tinha razão. Eu parecia um câncer na vida dele. Meu coração se estreitou e apertei mais ainda sua mão. Não tinha mais escolha, ou eu contava a verdade, ou perdia qualquer chance de continuar com isso. Eu ia tentar, porque eu gostava pra caralho desse japonês!
– Minha mãe era prostituta. Isso você já sabe. Meu pai era na verdade um dos amantes dela. Ele era casado, tinha outra família, mas eu nunca soube disso, ao menos até pouco antes de sua morte. Ele sempre estava por lá, mas não ficava muito tempo. Nunca me dei conta de que ele basicamente não dormia em casa, isso porque quando ele estava por perto eu tendia a me esconder.
– Por que você se escondia?
– Porque ele era agressivo – não queria contar isso, mas achava que não teria como Kai me entender se não soubesse de tudo – ele me agredia, e à minha mãe também.
– Nunca imaginei que você passasse por isso, Gu. – Ele tinha uma expressão que me atemorizava. Pena? Compaixão? Eu não queria ser alvo disso.
– Eu era limpinho demais, não é? Cara de pedigree e tal. Ao menos eu tinha isso pra me sentir por cima.
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Indestrutível (Romance Gay)
Romance🌈 Romance Gay 🥇👬🏼 PRIMEIRO LUGAR NA CATEGORIA "MELHOR CASAL" - 3ª Ed.CONCURSO CÓSMICO 2024 🥈#2 em Novidade (Jun/2024) 🥈#2 em Bissexual (Jun/2024) 🥉#3 em Novo (Jun2024) 🏅#4 em Sensível (Jun/2024) Kai levava uma vida agitada. Residente no Hos...