Kai
Ele estava muito quieto desde que deixamos o hospital. Na verdade, desde antes. Depois que eu me declarei para ele, ele se calou, fechou os olhos e fingiu dormir. Não me deu uma resposta, não fez nenhuma piada, a única evidência de que ele compreendeu o que eu disse foi uma lágrima solitária que correu por sua têmpora depois que fechou os olhos.
Foram apenas 48 horas de internação, que pelas normas do hospital teria durado menos. Mexi meus pauzinhos para mantê-lo por mais um dia pois queria ter certeza de que não havia mais nada no seu sistema. Treze pessoas foram envenenadas naquele evento, seis vieram a óbito e eu não queria correr nenhum risco com ele.
O histórico de dependência o ajudou a não reagir tão agressivamente à droga. Seu corpo já acostumado aos efeitos dos alucinógenos e anfetaminas demorou a absorver totalmente a mistura que para alguns foi fatal. Um paramédico conhecido meu, que tinha intimidade com alguém da polícia, relatou que foi um ato isolado; aparentemente jogaram a substância em copos aleatórios, mas a motivação ainda não estava clara.
Bem, isso não importava muito, agora. Gustavo estava vivo, e estive muito perto de perdê-lo. De novo.
– Obrigado por me levar pra casa. – Ele murmurou, olhando pela janela. Foi a primeira frase que me disse desde que acordou pela manhã.
Na tarde do dia anterior, falamos brevemente quando ele me pediu para verificar o Chokito. Eu estava de plantão, mas disse que ele estava prestes a sair do hospital, então ele avisou que havia bastante ração e água com o cão, que podia esperar. Hoje, quando ele recebeu alta, eu me ofereci para levá-lo embora. Não fiz menção de levá-lo pra minha casa; se ele havia passado um mês evitando contato comigo, eu ia respeitar isso.
Todavia, eu me sentia ferido. Percebia ele se distanciando a cada segundo, como se minhas palavras o tivessem assustado. Talvez eu o estivesse sufocando sem perceber. Tudo bem que ele havia me sufocado a adolescência inteira e...
Pensando bem, isso era bem exaustivo. Merda! Eu estava me sentindo péssimo, inseguro e assustado como se tivesse 15 anos outra vez, só que o motivo era outro.
Parei na porta do seu prédio. Ele desceu e olhou para mim. Parecia mais seguro, ainda que bem abatido. Deu para notar nesse instante que ele havia passado um período complicado, pois estava pior do que quando deixara a minha casa há semanas.
– Sobe comigo? – Ele convidou. Senti meu coração se aquecer.
Uma faísca!
– Claro.
Acompanhei-o pelo pátio, subimos pelas escadas por alguma razão que não entendi, mas eram apenas dois andares. Quando entrei em seu pequeno espaço, Chokito veio abanando o rabo na minha direção.
– Ei, grandão! Sentiu saudades? Foi? – Gracejei com o animal que se deitava e me oferecia sua barriga para um afago.
– Não me lembro de te ouvir fazendo vozinhas ridículas – ele troçou do meu jeito de falar enquanto eu acariciava a barriga do cão.
– Você andava muito concentrado em si mesmo para prestar atenção.
Não era mentira. Nos quatro primeiros dias em que ele ficou na minha casa, mais parecia um zumbi. Não sei se era por estar triste pela falta de visão ou por tudo o que acontecera, mas ele não reagia muito a nada naqueles dias.
– Me desculpe.
– Não esquenta. Foram dias complicados. – Me coloquei de pé e o encarei.
– Não é isso... Me desculpa por ter ido embora sem dizer nada.
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Indestrutível (Romance Gay)
Romance🌈 Romance Gay 🥇👬🏼 PRIMEIRO LUGAR NA CATEGORIA "MELHOR CASAL" - 3ª Ed.CONCURSO CÓSMICO 2024 🥈#2 em Novidade (Jun/2024) 🥈#2 em Bissexual (Jun/2024) 🥉#3 em Novo (Jun2024) 🏅#4 em Sensível (Jun/2024) Kai levava uma vida agitada. Residente no Hos...