Capítulo Trinta e Um

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O final de ano batia na porta e o recesso das festas chegaram junto. Na última semana de provas, em dezembro, dei graças a Deus por finalmente conseguir respirar com mais calma, estava tão acostumada com a necessidade de "organizar a agenda da minha vida" agora que a faculdade tinha começado, que somente quando finalmente não precisei me dividir em cinco para dar atenção a todos, foi que finalmente senti o peso da saudade que sentia da paz a tranquilidade.

Não estava reclamando, eu amava estudar, amava meu curso e me apaixonava a cada nova descoberta sobre minha área, mas a vida de universitária era cansativa e consumia todas minhas energias, juntamente com meu trabalho e minha vida pessoal, e era somente o primeiro semestre do primeiro ano da faculdade...

Faltava exatamente 24 horas para a véspera do Natal e - apesar de me livrar da faculdade com o recesso - nunca estive tão atarefada em casa. Aquela organização não chegava nem perto das festas que auxiliava na Igreja, era tanta coisa para resolver que precisava de uma lista com tudo anotado para não me esquecer de nada. Mas mesmo com todo aquele esforço não chegava aos pés do desgaste que me consumia semanas atrás com as provas finais.

Graças a Deus Amanda era completamente compreensiva com toda minha agonia, ficava longe de mim durante o dia e me relaxava a noite. A melhor ideia que inconscientemente ela teve. Acordava sempre de bom humor e pronta para mais um dia.

Eu tinha investido pesado na decoração da casa aquele ano, fiquei abismada quando descobri que Amanda e sua tia nunca tinham tido um Natal tradicional em casa e me senti na obrigação de mostrar para elas a minha realidade. Em minha antiga casa comemorávamos todos os natais entre família e amigos, com a casa completamente iluminada e arrumada com vermelho, dourado e branco e a mesa farta com a ceia. E era isso que eu queria este ano para todos eles.

A casa estava repleta de pontos coloridos, no corredor havia uma divisória de bolas vermelhas e estrelas dourados, as cadeiras estavam enfeitadas com laços vermelhos e as almofadas nos sofás com capas personalizadas natalinas, havia um enfeite na mesa de centro com uma casinha de papai Noel eletrônica com neve ao redor e cervos correndo em seu eixo, e a árvore, a extensa peça principal no meio da sala logo ao lado da televisão gigantesca, recheada de bolas, bonecos, faustos, pisca-pisca e presentes.

Hoje era um dia de relaxar, com quase tudo pronto, faltando apenas a minha própria arrumação, eu podia finalmente relaxar.

Tinha marcado com Ana e Maria para irmos ao salão nesta tarde pois amanhã eu só queria acordar tarde, me arrumar calmamente e disfrutar do meu esforço da semana inteira. Quando Amanda estacionou o carro em frente ao estabelecimento já podia avistar as duas mulheres na recepção do salão, ao meu aguardo. Me virei em direção a Amanda e busquei minha bolsa no banco de trás, antes de me inclinar em sua direção.

"Vai demorar muito?" - perguntou entre o selinho.

"Provavelmente." - respondi já abrindo a porta. - "E você? O que vai fazer o dia todo?"

Ela sorriu descaradamente e me enviou aquele olhar misterioso que me dava um frio gostoso na barriga - "Ah, isso é surpresa, minha lôra." - estreitei os olhos em sua direção e ergui o indicador.

"Vigia em Souza, não pisa na bola."

"Fica tranquila, loirinha."

Bati a porta e sai andando.

"Finalmente!" - resmungou Mafê.

"Iiih quanto mau humor, mana."

"Amiga, temos quase meia hora te esperando."

"Eu estava...ocupada." - as duas se entre olharam e caíram na gargalhada e logo senti minhas bochechas ficarem vermelhas.

"Ocupada, sei sei."

"A gente sabe muito bem sua ocupação." - zombou Maria, soluçando de tanto rir.

"Ai não enche, vocês são muito intrometidas, sabia?" -

"Sabemos, agora vamos logo com isso amiga, se não só saímos daqui já direto pra ceia."

Fomos até uma das recepcionistas e pedimos um Princes Day completo, unha, cabelo e depilação. Acabamos nos separando, Ana queria começar pelos cabelos pois estava com vontade de mudar e queria fazer antes que mudasse de ideia, Maria foi para depilação resmungando por doer tanto e eu acabei indo para manicure e pedicure. Fiz o de sempre, francesinha no pé e optei por um vermelho sangue nas mãos, para combinar com o clima natalino.

A fama que o estabelecimento tinha fazia jus a realidade, não tinha lugar pior para contar qualquer novidade do que um salão, ali era o antro das fofocas, onde as informações eram distribuídas mais rápidas que a velocidade de uma mensagem texto, desde o momento que tinha sentado na cadeira e apoiado meus pés e mãos nas banquetas, não tinha ficado em silêncio um segundo sequer; tinha descoberto que o vizinho da rua de baixo estava traindo a esposa com uma travesti da pista, que o bar do senhor João estava falindo de tanto dar bebida fiado aos clientes, que todos estavam comentando da minha festa particular em casa e que mais da metade do morro que ser convidado só para tirar a prova de toda organização que eu tinha feito. Me senti fortemente envergonhada quando descobri tal fato, afinal, era apenas uma festa, tinha auxiliado na organização de outras muito maiores e mais elaboradas na igreja, aquilo era algo normal em minha vida, que eu estava tentando incluir na vida das pessoas que agora fazia parte da minha vida.

Eu estava feliz. Transbordava e emanava isso. Tinha superado as angustias que viviam em meu peito e a cada dia mais uma que ainda restava. Aos poucos eu estava me moldando, me descobrindo, me transformando em mim mesma, o que eu tanto almejei desde o começo de tudo isso. O ano estava se encerrando e nunca me senti tão orgulhosa por tudo que construí até aqui, adquiri em tão pouco tempo com o suor do meu próprio esforço.

Estava dando início na minha faculdade, continuava atendendo no hospital, minhas amizades se firmavam a cada dia e tinha alguém que me amava ao meu lado.

Tudo estava perfeito.

Não é?

"Qual vamos fazer primeiro, queria? Cabelo ou depilação?" - uma moça se aproximou e tocou meu ombro delicadamente.

"Hã?" - perguntei aérea. - "Ah, sim, sim, cabelo, por favor."

"Vamos por aqui então."

Ela me guiou até a próxima cadeira e chamou um rapaz para me atender.

"Então, amor. Qual são os planos?!"

"Não sei, acho que quero mudar um pouco..."

"Huumm, ano novo visual novo?!"

Seus olhos saltitavam em animação, respirei fundo confusa e insegura, mas sorri por fim. Era o que eu precisava, não era? Minha vida tinha virado de cabeça para baixo nos últimos meses, uma montanha russa cheio de altos e baixos, mas nos altos, nos picos, eu conheci tanta gente boa, aprendi tanta coisa nova, descobri tantas novidades do mundo e de mim mesma, amadureci em todos os sentidos; me sentia mais confiante, mais segura, mais decidida, firme com o que eu queria e o que visava para meu futuro. Alguns males vem para o bem. E graças a Deus agora eu não estava mais sozinha, agora eu já não estava mais presa, estava livre e acompanhada das minhas melhores companhias, da minha nova família, na minha nova vida.

Então, sim, definitivamente sim. Ano novo, vida nova, visual novo!

"Me mostra o que você tem aí."

As Cores do Seu Amor - Livro II | Trilogia Amor De bandidoOnde histórias criam vida. Descubra agora