Capitulo Seis

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Desliguei a moto deixando ela estacionada não muito longe, coloquei a cordinha com a chave em volta do pescoço e segui pra entrar na casa, fiz o toque com os menor que estavam de vigia na porta e entrei, encontrando Formiga, Chefinha, Playboy e MT sentados nos sofás e cadeiras da sala.

"Coé Souza, demora do caralho mermão." - reclamou formiga.

"Tava resolvendo uns bagui ali, menor." - respondi me jogando no lugar vago do sofá.

"Que caô do caralho, menor. Tava de papo com a nova putinha dela da igreja." - zombou Chefinha.

"Coé chefinha, tá afim de b.o comigo de novo?"

"Iiihh, a mina né qualquer uma não fi, já viu Souza defendendo alguma mina desse morro?"

"Souza tá gamada na varoa, menor."

"Tão de tiração com minha cara cês dois né? Tão na Disney? Coé playboy, bota rumo nessa porra aqui, não vim pra ficar de papinho com esses relento não."

"Papo reto, cês são chato pa caralho, menor."

"Dá o papo, chefia." - pediu MT.

"O negócio é o seguinte, geral tá ligado no papo do cobra, ele tá na cadeia mas tá ciente de tudo, firmeza?" - todos assentiram deixando de lado a gozação. - "A galera da contabilidade deu o papo que tem coisa errada nessa porra aqui, a ideia foi uma só e veio lá de cima, temo que achar o filha da puta que ta roubando nós na cara dura, já foi passado a visão que o menor é daqui de dentro e já tão com uns suspeitos ai."

"Vamo juntar geral e pegar esses filha da puta playboy. Ninguém passa a perna em nós não."

"Porra menor, fico bolada com esses filha da puta que anda errado com nós, o bagui aqui é tudo na transparência, certo? E esses Zé ruela fica de negócinho de duas conversas, mermão, isso né papo de homem nem mulé não."

"Segura a emoça, Chefinha. O negócio é fazer tudo no sapatinho, se nós chegar no cara errado, o ladrãozinho vai se ligar e meter o pé." - disse formiga.

"É isso ai, formiga, tamo na merma sintonia. Cobra avisou pra chegar devagar e certeiro, pa não ter erro."

"E quem são esses filha da puta, playboy? Solta a voz." - perguntei.

"Tamo de olho em dois. O Fernandinho ou a puta dele, uma tal de Joseane, um os dois tá roubando dinheiro do ponto lá de baixo."

"Sem caô, essa Joseane é folgada pra caralho, menor, mo cota que to de olho nela." - reclamou formiga.

"Quero todo mundo de olho neles dois nesse sábado, se ligou, todo mundo na atividade no bagulho." - ordenou e todos assentiram.

"Jae, menor, fé."
"Firmeza, playboy, fé pa nós."

O papo se encerrou e todos foram embora, subi na moto seguindo caminho pra casa, estacionei próximo a minha casa e fui entrando.

Sem caô, as ideia de playboy ficaram martelando em minha mente. Fernandinho tá com nós desde pequeno, era nosso irmão do peito, deixar se corromper dessa forma por mulher e ainda mais uma como a Joseane, era vacilo. Aquela mina era mais rodada nesse morro que catraca de buzu.

O pior é que mesmo que eu quisesse, o que não é o caso, eu não poderia fazer nada pra ajudar, cobra nunca aceitou ser dobrado e colocado no bolso por ninguém de fora, que dirá alguém de dentro que nós confia e dá o passe o livre. Vacilo grande do Fernandinho, que será cobrado mais cedo ou mais tarde, e pela fúria de cobra e playboy, não tão tarde assim.

"Boa pá nós." - desejei às mulheres que estavam na cozinha, acompanhando minha tia. - "Coé dona Nina, pago as coroa pra cê continuar na boca de fogão?" - perguntei em tom de brincadeira, cruzei os braços e semicerrei os olhos. A senhora baixinha e rechonchuda riu e veio em minha direção de braços abertos.

"Ô minha filha, você já chegou." - constatou me rodeando com os braços. - " Eu já disse que nunca vou abandonar meu cantinho, cozinhar é minha maior paixão, Amanda. E outra coisa, jamais seria uma encostada que nem essa mulher que você pega na rua." - reclamou voltando para o fogão.

"Iiihh, calmaê dona Nina, tô de gastação com a senhora." - levantei às mãos em rendição e ri. - "Cê tá mais pronta pro combate que eu, menor." - as ajudantes riram juntamente de minha tia.

"Vá se ajeitar, o almoço já vai sair." - assenti em resposta e virei as costas, indo para meu quarto no andar de cima.

Nina era irmã de minha falecida mãe, me criou desde pequena. A única lembrança vívida que continha na memória de sua irmã, vulgo minha mãe, era dela caída no próprio vômito morta por overdose, tinha tanta merda no sangue dela que o laudo tinha sido abreviado para "incontáveis substâncias químicas".

Esse bagulho mexeu muito comigo quando era menor, sentia falta de tudo que poderia ter tido se ela tivesse pensado minimamente em mim, lembrado que alguém dependia da sua mera atenção e cuidado, infelizmente, a sorte de ter os pais na favela era pra poucos; meu pai era um traficantezinho que provavelmente já tinha morrido antes mesmo de minha mãe, nunca cheguei sequer saber seu nome ou vulgo.
Na real, não queria entrar pra essa vida, tinha em mente que o tráfico tinha tirado muito de mim, mas viver na favela é foda, principalmente sem suporte, quando tia Nina caiu no trabalho de faxineira que tinha e ficou impossibilitada de continuar trabalhando, as coisas ficaram difíceis, eu ainda era de menor, não conseguiria um trabalho, e aquele era o único sustento que tínhamos, então tive que dar meu jeito. Comecei fazendo favores, qualquer coisa por qualquer trocado, buscava o rango, ia comprar roupa por eles, ficava de vigia enquanto brincava no campinho perto de uma das entradas escondidas do morro, comecei de baixo mermo.
O que a sociedade não vê e julga lá fora é que a necessidade faz as pessoas tomarem atitudes drásticas, mas no fim das contas, ninguém quer morrer em troca de tiro, geral só quer manter sua família bem como pode, alguns entram por descaradagem mermo, mas outros, por pura necessidade.

Minha tia era tudo que eu mais amava nessa vida, tudo que fiz foi pra dar uma vida melhor da forma que podia a ela, depois me mantive por não ter escolha, afinal quando se entra não dá pra sair, a leia é uma só pra todos.
Mas ela era a única mulher que eu tinha completa consideração naquele morro, que tinha meu respeito.

Tirando a lourinha, claro...

Ah, aquela mina mexia comigo de uma forma que eu não entendia, aquele jeito todo menininha, boa moça não me enganava, ia conquistar ela de um jeito ou de outro, quero ela só pra mim.

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Ps.: Os personagens que não estou colocando foto ou fazendo apresentação são aqueles que não terão forte ou significativa presença no enredo, serão apenas como coadjuvantes, portanto, não precisam questionar sobre eles.

As Cores do Seu Amor - Livro II | Trilogia Amor De bandidoOnde histórias criam vida. Descubra agora