Fracasso

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No outro lado do Atlântico, em uma propriedade na movimentada Londres, Phillip Crane encarava seu futuro de forma relutante. Seu pai, Thomas Crane, sempre deixou claro o que esperava dos filhos. George, o irmão mais velho de Phillip, era o exemplo perfeito de submissão às vontades do pai. Sempre obediente, sempre disposto a seguir o legado da família. George era o filho que Thomas se orgulhava em exibir.

Phillip, por outro lado, sempre foi visto como o rebelde. Ele não queria seguir os passos do irmão. Preferia passar seu tempo em pesquisas e atividades que seu pai considerava inúteis. A pressão para se formar aos desejos de Thomas, o sufocava.

"Você precisa ser mais como seu irmão, Phillip." Dizia Thomas, como uma ladainha. "George entende o que significa ser um verdadeiro Crane. Ele honra nossa família."

Mas Phillip não queria ser como George. Ele queria ser ele mesmo. Contudo, sabia que isso seria uma batalha constante.

Durante a juventude, Phillip se rebelava silenciosamente, encontrando refúgio em suas próprias paixões e tentando se distanciar do controle do pai. No entanto, Thomas continuava insistindo que Phillip deveria se moldar ao exemplo de George, frequentemente humilhando e subestimando as ambições do filho mais novo. Cada interação com seu pai minava sua autoconfiança e o deixava em um constante estado de ansiedade. George, mesmo sem querer, tornava-se o reflexo daquilo que Phillip não queria ser.

A tensão na casa dos Crane era palpável desde que Phillip voltara de mais uma tentativa fracassada de encontrar um emprego. Ele sabia que, ao passar pela porta, enfrentaria o olhar crítico de seu pai, Thomas. O som dos passos ecoando pelo corredor já antecipava o confronto inevitável. Na mesa de jantar, Thomas estava sentado com o jornal aberto, fingindo desinteresse, enquanto sua mãe, Emily, permanecia em silêncio, como sempre.

Phillip entrou na sala, exausto e frustrado. O peso das expectativas do pai já era familiar, mas a cada dia sentia que a pressão estava se tornando insuportável. Ele tentou passar despercebido, mas a voz fria de Thomas cortou o silêncio.

"Então, Phillip, como foi mais uma tentativa gloriosa de encontrar algo útil para fazer com sua vida?"

Phillip fechou os olhos por um segundo, tentando conter a raiva que começava a borbulhar. Ele sabia que qualquer resposta apenas alimentaria a fúria de seu pai, mas o silêncio também não ajudaria.

"Não encontrei nada ainda, mas estou tentando, pai. Isso leva tempo."

"Tempo? Ah, sim, o precioso tempo que você tem desperdiçado desde que trancou aquela droga de curso na universidade. Sabe, Phillip, não é surpresa que você não tenha conseguido nada. Você não tem a ambição, nem a disciplina. Olhe para seu irmão, George. Ele soube aproveitar as oportunidades, construiu uma carreira, fez algo da vida. Mas você? O que fez até agora?"

Phillip sentiu o golpe, como se Thomas o tivesse atingido fisicamente. Comparações com George sempre foram uma arma de seu pai, e ele sabia o quanto isso o irritava.

"Eu não sou o George, pai! E não quero ser! Só porque ele fez o que você queria, não significa que isso seja certo para mim."

"Certo para você?" Thomas levantou-se da cadeira, largando o jornal de lado com um gesto brusco. "E o que seria certo para você, Phillip? Ficar vagando por aí sem propósito, sem um emprego, sem futuro? Você nem sequer consegue arrumar uma mulher que preste! Acha que alguém vai querer um fracassado como você? Que vida você está construindo?"

Phillip sentiu uma onda de vergonha e raiva crescer dentro de si. Ele não estava apenas frustrado consigo mesmo, mas também com a constante desvalorização que recebia de seu próprio pai.

"Eu não sou um fracassado. Só porque eu não escolhi o caminho que você queria, não significa que eu esteja perdido."

"Está sim, Phillip. Olhe para você! Você não tem nada. E sabe por quê? Porque você nunca foi capaz de seguir instruções, nunca quis trabalhar duro. Sempre com essa sua ideia de que vai encontrar algo 'diferente', algo que o faça 'feliz'. A vida não funciona assim!"

A respiração de Phillip ficou pesada. Ele estava cansado de ser diminuído, de sentir que nunca seria suficiente para seu pai. As palavras de Thomas doíam mais do que qualquer falha que ele tivesse.

"Você nunca vai me entender, vai? Para você, só existe um caminho, e se eu não seguir exatamente o que você quer, sou um inútil. Bem, quer saber? Eu prefiro ser um inútil a ser controlado por você pelo resto da minha vida."

Thomas deu um passo à frente, com o rosto contorcido de raiva.

"Então vá! Se acha que é tão esperto, tão independente, vá viver sua vida miserável longe daqui. Mas lembre-se de uma coisa, Phillip: quando você falhar - e você vai falhar - não ouse voltar para esta casa esperando ajuda. Não terá mais ninguém para segurar sua mão."

Phillip sentiu o coração acelerar. O momento que ele temia e desejava há tanto tempo estava diante dele. Finalmente, ele estava livre para tomar as próprias decisões, mas o preço seria cortar os laços com sua família. Ele olhou para sua mãe, que observava a cena em silêncio, os olhos tristes, mas cúmplices da humilhação que Thomas perpetuava. Ela nunca interferia. Phillip sabia que não podia mais ficar ali.

"Eu não voltarei, pai. Prefiro enfrentar tudo sozinho do que passar mais um dia aqui, sendo tratado como lixo."

Sem esperar uma resposta, Phillip virou-se e saiu da sala, o coração pesado, mas a determinação finalmente clara. Ele subiu para seu quarto e começou a arrumar suas coisas, colocando poucas roupas e pertences em uma mochila. Ao descer novamente, encontrou sua mãe na porta, com os olhos marejados.

"Phillip, por favor, não vá assim. Seu pai só quer o seu bem... Ele apenas não sabe como mostrar isso."

Phillip a encarou, sentindo o peso do conformismo dela. Ele sempre se perguntava como ela podia suportar aquela vida ao lado de Thomas.

"Se esse é o jeito dele de mostrar que se importa, prefiro não ter isso. Cuide-se, mãe."

E com isso, Phillip saiu de casa, deixando para trás a vida que ele nunca quis. Ele sabia que seria difícil, mas, pela primeira vez, sentia que estava tomando uma decisão por si mesmo, sem ser manipulado ou humilhado. Estava livre - e, com essa liberdade, ele teria que encontrar um caminho, qualquer que fosse.

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