Capítulo 35

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Eu havia beijado Thomas Castillo, o que ultrapassava todos os limites de flertar com o inimigo. Mesmo sabendo quem ele era, fui tola o bastante para beijá-lo em um impulso impensado. E agora sentimentos e sensações atordoantes me dominavam com a lembrança dos lábios dele nos meus. Nossa Senhora das Insulanas Desavisadas, onde é que eu estava com a cabeça? Aquilo era a perfeita definição de encrenca. Ele não era um cara aleatório que eu beijara em uma noite do , ele era o cara que habitava a loja ao lado. E a ideia de vê-lo todos os dias me apavorava. Eu só não sabia dizer se pelo constrangimento dos pensamentos que se insinuaram para mim quando sua boca cobriu a minha ou se pelo desejo de beijá-lo novamente.

Na manhã seguinte após uma noite mal dormida — revirei na cama a maior parte do tempo com a visão de um par de olhos escuros inquietantes —, me levantei exausta para ir à The Drum's com uma liquidação à minha espera.

Durante todo o percurso até a loja, meus pensamentos retornaram para os acontecimentos da noite passada, ou melhor, para o beijo da noite passada.

Eu não costumava fugir de beijos, ainda mais um como aquele, profundo e sensual, que foi capaz de despertar todos os meus sentidos. Talvez por isso eu tenha me assustado, em minha defesa eu nunca senti nada parecido com aquilo.

Entretanto, não importava que Thomas Castillo beijasse incrivelmente bem, eu devia manter distância dele, rque ele continuava sendo o garoto racista do colegial. E um beijo não era suficiente para isso. Ainda que fosse um beijo de deixar as pernas bambas e as ideias fracas assim como a atração que eu sentia por ele.

Determinada a me manter longe do Capitão Gancho da Livraria, entrei no meu estabelecimento sem nem sequer olhar para a loja vizinha.

***

Havia organizado aquela liquidação com afinco, decidida a fazer dela um sucesso. Para , resolvi usar alguns atrativos a fim de chamar a atenção de potenciais clientes: uma caixa de som para colocar na porta da loja e um carrinho de cachorro .

Assim que a música começou a tocar e o cheiro do cachorro-quente se espalhou pela calçada, várias pessoas começaram a entrar na loja. Fiquei totalmente envolvida com as vendas que iam a todo vapor que acabei não me preocupando com o volume da música na porta da The Drum's e o impacto que isso poderia com relação à forma humana do problema que habitava a loja vizinha. No momento em que senti a já conhecida sensação de estar sendo observada, ergui os olhos em direção a porta deparando-me com Thomas parado lá, os braços cruzados sobre o peito e uma expressão de poucos amigos.

Os olhos dele encontraram os meus, e engoli em seco quando meu olhar pousou de maneira incontrolável sobre seus lábios revivendo memórias recentes, intensas e proibidas. Ele não esperou por um convite, não que precisasse de um obviamente, e encurtou a distância entre nós.

A cliente que eu estava atendendo quando Thomas chegou , chamando minha atenção, e só então percebi que ainda segurava a sacola com o disco de vinil que havia lhe vendido. Constrangida, entreguei a sacola a ela que saiu logo em seguida, nos deixando a sós.

— Esther o que é isso?

— Uma liquidação, não é óbvio?

— Você sabe o que eu quis dizer.

— Na verdade não, precisa ser mais específico — falei arqueando as sobrancelhas me fazendo de desentendida embora soubesse do que se tratava.

Ele se virou apontando para a caixa de som na porta da loja. O anel prateado brilhando em seu dedo indicador.

— Ah, isso? A música chama a atenção das pessoas para a promoção — disse dando de ombros.

Naquele momento Ella Fitzgerald deu um alto falsete fazendo com que Thomas se empertigasse.

— Esse barulho é muito incômodo.

— Mas não é barulho, é música.

— Me incomoda do mesmo jeito. Sem contar a fila quilométrica do carrinho de hot dog em frente à minha loja que está atrapalhando a entrada.

Ele suspirou contrariado antes de prosseguir:

— Vai acontecer um encontro do clube do livro aqui na livraria e com esse barulho ensurdecedor será impossível.

— Isso não é problema meu.

— Esther Blossom — ele me advertiu.

— Thomas Castillo — falei sem recuar.

— Você sabe que a calçada é tão minha quanto sua, não sabe? — questionou.

Engoli em seco. Por mais que eu detestasse isso ele tinha razão, mas isso não era o suficiente para me fazer dar o braço a torcer. Então eu apenas o encarei. Thomas estreitou os olhos me examinando atentamente e quando percebeu que eu não estava disposta a abaixar o volume da música me chocou com uma atitude nada ortodoxa para um rato de biblioteca como ele. Caminhou até a caixa de som e puxou bruscamente o cabo que a mantinha ligada.

Olhei para ele em choque.

— Quando terminar a reunião, eu venho devolver — disse ele em um tom despretensioso, colocando o cabo por cima dos ombros relaxados.

Minha boca se abriu com a audácia da sua que, somada a sua aparência, o fazia parecer realmente um pirata sexy.

Thomas caminhou tranquilamente até a porta da The Drum's e me lançou um sorrisinho cafajeste antes de voltar para a sua livraria e sumir completamente da minha vista.


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