Capítulo nove

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Na próxima semana, não consegui prestar atenção às aulas. De novo. Dessa vez, porém, eu não estava tendo pensamentos depressivos sobre a vida. Eu apenas não conseguia parar de pensar em Gabriel: as besteiras que ele dizia, as piadas, o sorriso, a voz, a expressão tranquila em seu rosto enquanto cantava, o jeito como ele e Pedro se divertiam como se ambos tivessem cinco anos...

Eu pisco e balanço a cabeça, saindo do transe. Imediatamente me sinto idiota por estar pensando sobre ele dessa forma. Conheço-o há menos de uma semana e ele é, de fato, um cara interessante, então é claro que não consigo parar de pensar sobre ele.

Talvez eu apenas esteja com saudades de Bernardo. Pego meu celular e o envio uma mensagem:

Eu: Por favor, diz que você vai vir me visitar nesse final de semana :(

Bernardo: Desculpe, amor. Não vai dar. Semana que vem estarei aí.

Eu: Mais trabalhos?

Bernardo: Muitas provas para estudar. Quando você estiver na faculdade vai entender.

Desligo o celular e o largo sobre a mesa, ligeiramente irritada. Não quero mais ler mensagem alguma dele.

Longas duas horas depois, o sinal toca. Guardo meus livros na mochila e tomo um susto quando saio da sala e dou de cara com Lúcia.

- Meu Deus, Olívia, achei que sua aula não iria acabar nunca mais – ela diz, me abraçando.

Lúcia é a única amiga que me restou e, mesmo assim, não somos tão próximas. Pelo menos não tão próximas como costumávamos ser antes do acidente de minha mãe. Ela, Lana e eu éramos inseparáveis. Agora eu nem mesmo sei por onde Lana anda.

Engraçado como as coisas mudam.

- Eu também – respondo, abraçando-a. – E aí, como estão as coisas?

- Estão ótimas! – diz, sorrindo. – Pensei em passar aqui para te dar um oi, já que faz... um mês que não nos vemos? Podemos sair para almoçar.

Eu sorrio.

- Não posso sair hoje, Lúcia, me desculpe. Tenho que buscar Pedro na escola e leva-lo para casa. Ele tem treino de futebol depois do almoço.

- Ah, sim, tudo bem. Talvez uma outra hora?

O tom de voz triste me deixa arrasada.

- Bom, se você quiser, pode almoçar comigo em casa – digo.

- Jura? Acho que seria muito legal.

- Claro. Eu vou buscar o Pedro agora. 13 horas, então?

- Sim, já que estou com tempo vou até em casa trocar de roupa. Encontro você lá – ela diz, me dando um rápido abraço.

-||-

Estou parada na frente da escola de Pedro há dez minutos, e estou começando a ficar preocupada. Não há quase mais ninguém ali. Saio do carro e vou até a recepção, para descobrir que ele foi embora mais cedo, com um "cara" que ele alegou ser seu amigo. A escola nem mesmo sabia me dizer o nome do homem.

Meu coração começa a bater mais forte e minha visão começa a escurecer. Como é que deixam ele sair da escola com uma pessoa qualquer? O que eu vou fazer? Estou tão cega de raiva que digo alguns palavrões para a recepcionista antes de voar para dentro do carro. Eu vou processar essa porcaria de escola.

Para melhorar, meu carro velho avisa que a gasolina está quase acabando. Preciso ir até em casa pegar dinheiro para o combustível. Estaciono o carro com as mãos trêmulas e só quando não consigo mais enxergar direito é que percebo que estou chorando. Corro para dentro de casa o mais rápido que posso e subo para o meu quarto. Dez segundos depois, quando me viro para sair, esbarro com Gabriel, que me segura.

- Ei, o que está acontecendo? – ele pergunta, visivelmente preocupado.

- Não tenho tempo agora. Sai da minha frente!

- Não vou deixar você sair assim – diz, ainda segurando meus braços.

Eu expiro o ar e tento me manter calma.

- Pedro saiu da escola com outra pessoa hoje, e eu não sei quem é. Preciso ir até a delegacia – explico, quase chorando. – Por favor, me solta.

Ele expira o ar tão pesadamente quanto eu fiz e me abraça. No mesmo instante, eu paro de respirar. Admito que o abraço me pegou de surpresa.

- Ei, calma, está bem? Eu busquei ele mais cedo hoje. Nós dois fomos comprar uma chuteira nova para o jogo de semana que vem.

Então começo a chorar, aliviada. Se eu tivesse forças, juro que estaria o enchendo de socos agora.

- Por que você não me avisou, imbecil? Eu estava desesperada!

- Eu mandei uma mensagem no seu celular. Você não viu? – ele diz calmamente, passando uma mão em minhas costas para me acalmar. – Além disso, eu não o sequestrei. Eu levei uma carta de autorização que peguei com seu pai na delegacia.

Fecho os olhos com força. Eu havia desligado o celular por causa de Bernardo, por isso não vi a mensagem.

Gabriel se afasta um pouco de mim para olhar em meus olhos.

- Em uma escala de zero a dez, quanto você me odeia agora?

- Onze – eu digo, fungando.

Ele suspira, se afastando mais um pouco.

- Sinto muito, de verdade. Eu não queria ter te assustado – diz, genuinamente magoado. – Pedro está no quarto dele. Estávamos te esperando para almoçar.

- Tudo bem – eu digo. – Apenas... Apenas não me mate do coração da próxima vez, ok?

Ele sorri e sai do quarto em seguida.

- O almoço vai ser servido em cinco minutos, crianças – Gabriel grita do corredor para que Pedro e eu possamos escutar.

Antes de fechar a porta de meu quarto escuto Pedro correndo atrás dele.

- Espere por mim! – ele disse, animado.

Eu suspiro e encosto minha testa contra a porta, aliviada porque meu irmão está em casa, e preocupada com o efeito que o abraço que Gabriel me deu teve em mim.

Depois que você chegouOnde histórias criam vida. Descubra agora