Deitada em minha cama, encarando o teto por cerca de duas horas, o sono insiste em fugir de mim. Decido culpar o fato de ter acordado tarde, mas sei que o real motivo é que nesse exato momento, Gabriel e Lúcia estão em algum lugar se divertindo juntos. Por essa eu não esperava.
O pior de tudo, é que eu nem mesmo entendo porque fiquei tão irritada.
Mudo de posição, me virando para o lado, e avisto o violão que Gabriel havia me dado pouco tempo atrás. Ao invés de busca-lo e quebra-lo inteirinho como estou com vontade, eu sento-me no chão com ele no colo, e deslizo minhas mãos até o braço, onde meus dedos automaticamente formam um acorde. Sinto meus dedos tremerem um pouco quando deslizo-os pelas cordas, fazendo o som ecoar. No mesmo momento sinto meus olhos ficarem marejados. Lutando contra as lágrimas, formo outro acorde, e então outro, e outro.
Passo a tocar a última música que mamãe havia me ensinado, antes de morrer. Até esse momento, eu não havia tocado uma música sequer, porque a simples lembrança era dolorosa demais. No entanto, uma vez que já estou em uma porcaria de dia, acho que mais uma dor não faria diferença.
Mas eu estava enganada: não houve dor alguma, apenas um sentimento intenso de saudade de mamãe. Apesar disso, eu me senti bem; como se ela ainda estivesse aqui presente, como se eu pudesse simplesmente caminhar até seu quarto, me deitar ao seu lado na cama e contar o quanto estou frustrada porque Gabriel saiu com outra garota.
Eu sorrio com a imagem mental de nós duas juntas. Imagino que estamos abraçadas e que seus dedos acariciam meu cabelo, como sempre fazia desde que eu era pequena. O que será que ela diria sobre essa situação toda? Será que ela teria achado errado eu me apaixonar por Gabriel quando ainda namorava Bernardo?
Calma. Eu estou apaixonada?
Como em um sonho, imagino minha mãe rindo de mim, com a percepção mais do que óbvia que eu acabara de ter. Claro que eu estava apaixonada. Eu estava muito mais do que apenas atraída por Gabriel, e com certeza, muito mais do que apenas frustrada porque ele saiu com minha amiga.
Meu celular vibra, e levo alguns segundos até largar o violão para pegá-lo. Se fosse Gabriel, não havia chance alguma de que eu responderia. Não me humilharia ao ponto de trocar mensagens com ele enquanto estava com Lúcia, se divertindo.
"Então você sabe tocar violão", a mensagem dizia. Era quem eu estava imaginando que fosse.
O quê? Ele deveria estar com Lúcia. Por que estava em casa tão cedo?
"Olívia, eu sei que você viu minha mensagem. Consigo escutar que você parou de tocar", uma segunda notificação chegou.
Sei que falei que não o responderia, mas eu não esperava que ele estivesse em casa. Estaria Lúcia com ele? Ah, não, se ela estivesse em seu quarto nesse momento eu quebraria a cara de pau dele amanhã assim que o visse.
"Vá se ferrar", é o que respondo. "E se divirta com Lúcia".
"Eu estou em meu quarto. Ela não está aqui".
"Eu não me importo", respondo rapidamente, provavelmente entregando o quanto estava irritada com a situação. "E duvido que ela não esteja aí com você".
"Olívia, se duvida tanto, venha aqui e veja com seus próprios olhos".
"Não quero ir ao seu quarto".
"Boa escolha. Se viesse, eu não a deixaria sair".
Eu reviro os olhos. Que idiota.
"Por que está em casa tão cedo? O encontro não foi legal?"
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Depois que você chegou
RomanceApós o acidente que matou sua mãe, Olívia mudou. Antes, sua vida se resumia a festas e diversão, mas depois da trágica noite, ela passou a cuidar de seu pai, um policial, e de seu irmão, Pedro, de apenas três anos. Dessa forma, quando terminou o últ...