Uma conversa incomum

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Já estava de noite e eu tinha acabado de terminar minha aula de dança. Passei a tarde entediada e preocupada com Phil. Ele só saiu do treino no final da tarde e, como estava muito cansado, foi se deitar e até agora não acordou.

Subi as escadas lentamente, minhas mãos começaram a tremer. Eu estava com medo de ir até o meu quarto. Me apoiei na parede, respirei fundo e....

- Princesa Aislin! - Escuto me chamarem e levo um pequeno susto. Carmen subia rapidamente pelas escadas. - Isto é seu? - Ela pergunta me mostrado a caixinha que Emma tinha me dado.

- Sim, é meu. Onde você encontrou? - Pergunto pegando o objeto de sua mão.

- Estava na biblioteca. - Responde Carmen sorrindo. - Acho que você deve ter se esquecido.

- Você abriu?

- Não.

Assenti com a cabeça e dei um pequeno sorriso. Carmen desceu as escadas e eu fiquei encarando aquela caixinha, querendo saber o que tem dentro.

- Não posso abrir. Não posso abrir. - Falo para mim mesma. Passei minha mão por cima dos desenhos. Fiquei mais curiosa para saber ela esconde. Seguro a fechadura e estou prestes a abrir, quando sinto uma respiração próxima ao meu pescoço. Fico estática, com o coração QUASE saindo pela boca.

Olhei para trás e lá estavam os olhos, eles pareciam rir. Dei um passo para trás e engoli um seco. Aqueles olhos amarelos eram penetrantes e assustadores, eles chegaram mais perto e ficaram bem na minha frente. Estava muito perto, suas pupilas eram como as das cobras.

Minha garganta estava seca e resolvi correr. Corri desesperadamente até meu quarto e fechei a porta, trancando-a. Joguei a caixa em cima de minha cama. Corri até o meu banheiro e comecei a lavar meu rosto.

- Isso é um sonho. É tudo um sonho. É apenas um sonho. - Fico falando compulsivamente. Olho para o meu espelho redondo e quase tenho um infarto. Os olhos estão atrás de mim, me encarando com malícia. Pego minha escova de cabelo e jogo neles, mas ela simplesmente os atravessa.

- O que você quer?! - Pergunto tomando coragem. - Quem é você? Sai daqui!

Os olhos não respondem e continuam me encarando. Resolvo ignorá-los, passo por eles e me deito na cama, coloco a caixa em cima do criado-mudo e afundo minha cabeça nos travesseiros.

- Sabia que é feio ficar encarando as pessoas? - Digo com a voz abafada. - Eu não gosto que fiquem me olhando assim, você nem pisca. Isso é ridículo.

Me sento e olho para eles, que ainda estão me encarando.

- Você escuta? - Pergunto. Sem respostas. - É claro que não escuta, olhos servem para ver, não escutar. - Já estava perdendo o medo deles. - Mas será que você tem alguma orelha invisível? Seria maluquice. - Dou de ombros e apago a vela ao meu lado, deixando o quarto escuro. Os olhos ficaram mais visíveis e brilhantes.

- Você pisca? - Pergunto. Os olhos me encararam e piscaram. - Há! Você pisca! Eu sabia. Então você consegue fiar um bom tempo de olhos abertos. Eu fico um minuto sem piscar e começo a lacrimejar. - Dei uma risada. Eu estava falando com os olhos que provavelmente eram frutos da minha imaginação. Estou maluca, tenho certeza.

- Olha, você me assustou muito ontem. Eu não gostei disso, e também tem uma coisa... Eu sonhei contigo. - Falo franzindo o cenho. Eles parecem interessados na conversa e chegam mais perto. - Eu estava em uma floresta, que mais parecia um cemitério de árvores, era horrível. Fiquei morrendo de medo. Ai você apareceu, e ficou me encarando, mas logo depois sumiu.

Olho para as minhas mãos, relembrando o pesadelo horrível que eu tive. Aquilo me causava calafrios. O rosto de Philip morto era o que mais me assustava.

- Sabe, tudo está começando a ficar meio confuso para mim agora. - Falo. - Minha melhor amiga foi embora e deixou minha cabeça mais bagunçada ainda, ninguém mais parece me entender. Eu mesma não consigo acreditar no que estou vendo, é como se eu estivesse vivendo um sonho.

Uma lágrima desce pelo meu rosto, mas a seco na mesma hora. Aquela dor insuportável de quando você segura o choro, como se estivesse se sufocando, está me dominando.

- Eu, sinceramente, acho que estou ficando louca. - Digo. - Isso tudo começou a acontecer quando Emma foi embora e comecei a ler aqueles livros de fantasia. Mas também tem essa guerra, que foi declarada do nada e, esse tal de... Kamura. O que ele tem haver com isso? Será que meu pai acredita em lendas?

Os olhos estão tão atenciosos em minha tagarelice e, percebo, que eles estão aqui para ajudar, eu acho. Parecem me escutar, e conversar comigo apenas com o olhar.

- O que eu devo fazer? - Pergunto. Sem respostas. O silencio toma conta de meu quarto. Respiro fundo e deito-me na cama. - Você devia falar alguma coisa, mas, pensando bem, ia ser esquisito uma boca flutuante te perseguido. Pois é, deixa quieto, prefiro os olhos. - Encaro o teto e ri de mim mesma.

- Vou te chamar de Zoiúdo. Ok? Seus olhos são enormes. - Falo sorrindo. Eles parecem concordar. - Estou com sono. Boa noite Zoiúdo. - Me cubro com o cobertor e me ajeito na cama. Estou feliz por perder o medo dos olhos, percebi que eles não queriam nada de ruim. Vai ver só gostam de me encarar porque eu sou extremamente linda.

Em poucos minutos pego no sono. Mas, no meio da noite, eu escuto gritos e barulhos de coisas se quebrando. Acordo na mesma hora, não vejo Zoiúdo, acho que ele foi embora.

Me levanto e vou até a janela. Os gritos continuam, posso escutar alguns rugidos e latidos, o que é estranho. Paro para escutar melhor e tentar saber de onde vem aqueles barulhos, fico surpresa ao saber. Eles são do outro lado dos muros do castelo...


^^


O reino de AurionOnde histórias criam vida. Descubra agora