Cidade comum

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Essa história é sobre uma cidade pequena e relativamente comum. Em suas ruas principais, uma longa fileira de casa brancas levava até uma praça central arborizada, com bancos de madeira e uma tradicional igreja logo ao lado. Essas eram as únicas características dignas de nota da cidade.

Os poucos habitantes também pareciam comuns. A maior parte pertencia a famílias de quatro pessoas (um casal e dois filhos), que passeavam juntos aos domingos e feriados. Sorriam ao encontrarem os vizinhos e perguntavam sobre o seu dia. Como dito, tudo era aparentemente muito comum.

Exceto por uma coisa: todos naquela cidade se escondiam para chorar.

Dentro das idiocracias daquela microsociedade, chorar era um atestado de fracasso e fraqueza (exceto em eventos controlados, como velórios e casamentos). A tristeza era uma vergonha tão profunda que não poderia ser dividida nem com a sua própria família. A solução clara era se esconder sempre que sentisse que estava prestes a desabar. Chorando baixo, para não gerar desconfiança. Abafando gritos em travesseiros, ligando o chuveiro para disfarçar o barulho e jogando colírio nos olhos antes de sair de casa.

Em público, sorriam e agradeciam pela vida que levavam, mesmo quando tristes. Em particular, não.

Como resultado, sofriam mais.

Incapazes de conhecer o sofrimento do próximo, cada morador acreditava ser o único a sofrer naquela cidade. Encaravam o próprio reflexo no espelho e se perguntavam o porquê da dor bater apenas em seu coração, invejando uns aos outros, simultaneamente, por razões mentirosas. Sentindo uma solidão inexplicável, presos em suas próprias ilusões.

Afinal, ninguém é capaz de aguentar o fardo de ser o único a sofrer em uma cidade onde todos são felizes. E assim eles conviviam com o constante medo de serem descobertos infelizes – os únicos infelizes.

Nas noites da cidade comum, os moradores choravam em segredo, em silêncio, sentindo vergonha de si mesmo.

Como se sofrer fosse errado...





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