Sobre paixão e medo

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É com pesar que venho por meio dessa informar que me apaixonei. E isso é deveras assustador.

Não acredito que aconteceu. Estava vivendo a minha vida normalmente quando notei que ela exibe uma covinha bonita no rosto sempre que sorri, que adora o meu livro preferido e estava cantarolando aquela música que não saiu da minha cabeça a semana inteira.

Eu não faço a mínima ideia de quando começou, como começou, quem começou. É como quando entardece, você apenas vive o seu dia até perceber que já está na hora de acender a lâmpada da sala. Escureceu e você nem notou, você se apaixonou e nem notou.

Quando você se apaixona, você vira um cravo, daqueles que nascem aos montes nos canteiros da sua avó. São lindos, claro, mas tão vulneráveis que se desmancham e saem voando em milhares de pedaços quando uma boca assopra, mesmo que carinhosamente.

Os pedaços voam longe demais, se espalham demais. Eu nem terminei de recolher todos os meus pedaços pelo canteiro, não posso me apaixonar.

Se apaixonar é como saltar de um prédio em chamas para cima daqueles colchões infláveis dos bombeiros. É insuportável permanecer no prédio, mas e se o bombeiro não estender o colchão? Ou se ele estendeu, me conheceu melhor e mudou de ideia no último segundo? Estou contando com outra pessoa para não cair com a cara no concreto.

E o concreto é duro.

É um caminho sem volta, meu amigo. Quando você percebe que está sorrindo no meio da rua apenas com a mera lembrança dela, ouve histórias sobre a sua infância e se importa honestamente com elas, sente uma vontade enorme de abraçá-la e permanecer assim até a sensação parar. Ou seja, é tarde demais.

As pessoas deveriam vir com um besouro na garganta que se solta sempre que a frase "eu te amo" é proferida mentirosamente, um apito que tocasse sempre que você gostasse de uma pessoa babaca e metros de plástico bolha em volta do seu coração, acompanhado de um adesivo com um escrito em letras garrafais: "CUIDADO COM O TROÇO - DEVOLVA NO MESMO ESTADO EM QUE O ENCONTROU".

Mas as pessoas não são perfeitas...

Exceto ela...

CADERNO DO SALIOnde histórias criam vida. Descubra agora