É biológico

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É biológico. Só pode ser biológico.

Pode acontecer a qualquer momento. Caminhando na rua, depois do sexo, durante uma bebedeira, conversando com o amigo no ponto de ônibus.

Cara, só pode ser biológico.

Bate forte e eu sei que não conseguirei fugir, já cansei de tentar, fugir nunca deu certo e aparentemente nunca dará.

É uma sensação estranha, um estado de espírito. As frases se formam na cabeça e tentam sair de qualquer maneira, elas começam a fazer sentido, inverter sentidos e eu sei: preciso escrever.

Só pode ser biológico. Eu preciso escrever. Na hora que sinto que preciso eu sei que preciso e não há nada que possa fazer quanto a isso. Já até sei sobre o que será, o tamanho das linhas, como quero que as palavras devem soar. Nunca conto para ninguém. Nem para as pessoas da rua, nem para a namorada, nem para o dono do bar e nem para o amigo do ponto de ônibus. "Precisa escrever?", eles pensariam. "Quem ele pensa que é para dizer que precisa escrever?", eles pensariam. "Por acaso pensa que se considera algum iluminado?", eles pensariam.

Eles não entendem que é biológico. Ninguém tenta parar de respirar, segurar a sede ou esconder o sono. As pessoas respiram, bebem água e dormem.

Eu escrevo.

Escrevo às duas da manhã, como agora.

Palavras, palavras, palavras.

Como é bom.

Só pode ser biológico. Meu corpo veio com defeito. 

CADERNO DO SALIOnde histórias criam vida. Descubra agora