Capítulo 1 - Victória Regina

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__Vic? É você? – minha mãe chamou da cozinha.

__Sim mãe, sou eu. – estacionei com o pé no primeiro degrau da escada.

__Não vai comer? – ela perguntou enquanto lavava a louça.

Comer? Não. Não depois de provar o que eu provei. Quem poderia querer comer essa comida, quando provou o que eu provei.

__Não. – subi mais um degrau, mas ela apareceu no corredor.

__Desça! – não era um pedido, era uma ordem. __Precisa comer ou vai morrer de inanição.

Não discuti, dei meia volta e segui até a cozinha, olhei as panelas, galinha com batatas, arroz, e salada de legumes. Razoável! Você talvez dissesse, mas podia ser caviar e ainda assim eu olharia com o mesmo desprezo. Fiz o meu prato, dispensei a galinha. Não como carne. Não depois de senti-los.

Comi em silêncio, lavei meu prato e segui para meu quarto, tirei meus tênis e olhei o céu mais uma vez, agora repleto de estrelas. Deitei em minha cama e contemplei o teto, eu teria que decidir o que fazer da minha vida, voltar a estudar, fazer faculdade, seguir uma carreira, esquecer que o conheci.

Acordei com um tropel pelas escadas, meus irmãos atrasados para a escola. Permaneci em silêncio, acostumando-me com a luminosidade, pisquei várias vezes, sua imagem ainda estava em meus olhos, sonhei com ele de novo.

Levantei e fui tomar um banho, ontem eu esqueci. Minha roupa estava imunda e meu cabelo engordurado. Depois do banho vesti meu jeans claro com um rasgo no joelho. Eu gostava particularmente dele, eu o estava usando quando fiz a viagem. Vesti a camiseta branca, meus tênis encardidos e penteei os cabelos molhados.

Eu era magra, sempre fui, mas nos últimos anos emagreci mais, quase anoréxica, motivo de muita preocupação para minha pobre mãe. Meu cabelo era escuro e liso, eu o mantinha comprido, tinha medo que se eu o cortasse, ele não fosse me reconhecer quando voltasse para me buscar. Meus olhos eram azuis, eles já foram mais bonitos, agora perderam o brilho.

Desci as escadas devagar e me sentei à mesa, decidindo o que comer. Banana com mel era uma das poucas coisas que me agradavam e por isso mamãe não deixava faltar em casa, ela me olhava preparar o prato com aquela expressão martirizada.

__Não precisa ir se não quiser.

__Você repete isso todas as manhãs.

__Porque não quero vê-la trabalhando atrás de um balcão a vida inteira.

__Não é ruim. – eu disse depois de engolir um pouco da banana com mel.

__Não foi isso que sonhei pra você.

__Eu sei. – comi mais um pouco. __Eu gosto da padaria. – e papai não me atormenta como você. - Eu pensei. - Arrependi-me logo em seguida do pensamento maldoso, levantei e lhe dei um beijo. __Eu te amo mãe. Sabe disso não é?

__Sim filha.

Segui para meu trabalho, era bom ter algo o que fazer. Não pensar. Quando não estava atendendo aos fregueses, eu estava limpando o balcão ou arrumando as prateleiras, qualquer coisa que me mantivesse ocupada. "O tempo tende a se arrastar quando não temos nada o que fazer, mas se você está ocupado, ele voa." Max me disse isso certa vez. Então a manhã se foi e por volta de meio dia, meu pai me chamou.

__Vic.

__Sim pai. – ele não me incomodava como minha mãe, para ele não importava se eu estava na faculdade ou não; estar viva já era o suficiente. Ele nem mesmo se importava em me dispensar todas as tardes para que eu pudesse fazer minha vigília.

Andirá - a jovem da profeciaOnde histórias criam vida. Descubra agora