VIII - Coliseu

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 Logo a festa começava. Apesar das máscaras era visível que eram todos homens, todos ricos e notáveis na sociedade. Conversavam baixo. Não havia música pois nem a entrada de músicos era autorizada. Francesca repousava numa poltrona de veludo. Como sempre sozinha. Bebia em gestos lentos e suaves uma taça de vinho, e apesar da opulência com a qual se vestia, esperava, aparentemente, não ser importunada. 

No entanto logo sobressaltou com a aproximação de Lorenzo. Ele trazia um enorme leopardo numa coleira e de focinheira. O animal rosnava. Era uma fera gigantesca, que fazia as gravuras de livros sobre faunas exóticas parecerem tolices infantis, seu rugido era metálico e ganhava força nas paredes do enorme salão, era a única música que havia. Era difícil imaginar como Lorenzo providenciara aquela sorte de criatura, mas era na verdade apenas mais um exemplo de tudo aquilo que seu dinheiro era capaz de comprar. O irmão pousou nela os olhos vidrados de ópio e começou a rir quando assistiu a jovem se encolher, julgando que seria destinada a ela a sorte de ser devorada pelo animal.

-Olhe nosso gatinho novo, "Cesca". Você vai cuidar dele até a hora dele comer.

Cesare subiu as escadas com Elena. Ninguém acharia estranho um Sforza levando uma jovem aparentemente refinada para o quarto. O corredor estava vazio, absolutamente deserto e silencioso, e tudo o que se ouvia era um rugido no andar debaixo, algo que fez o músico engolir em seco e discretamente se benzer. Cesare apertou o passo, e sem dizer nada rapidamente abriu a porta do quarto do casal Sforza e jogou Elena dentro. Fechando em seguida e descendo as escadas a passos muito rápidos. 

Logo encontrou Rosa no salão. Estava parada num canto. Havia pegado uma taça de vinho para parecer natural, mas não bebia. Tinha de se manter perfeitamente sóbria para correr e sumir quando fosse necessário. Ela não falava com ninguém. O que não era visto com estranheza, pois ninguém conversava. Era quase como se ninguém que estivesse ali quisesse revelar sua identidade. Ninguém deveria saber nada sobre ninguém. Ninguém estava ali.

 Cesare se colocou ao lado de Rosa , em silêncio. A única semelhança entre aquilo e uma festa era a desnecessária abundância de comida e bebida. Era como se a gula fosse estimulada pelas centenas de doces decorados e bebidas caras. As conversas eram apenas sussurros.

Rosa olhava para Francesca. Não sabia o que sentir . Ela estava tão linda...Mas tudo aquilo era tão opulento....Ela segurava um leopardo pela coleira como se fosse um poodle, a fera por alguma razão repousou a enorme cabeça junto aos sapatinhos de cetim da dama, que permanecia imóvel, estática. Lorenzo se aproximou dela e sussurrou em seu ouvido, pegando a coleira do animal e levando-o consigo. Ele começou a falar e todos prestaram atenção.

- Hoje antes de começar a diversão eu queria dizer que estou muito irado com uma senhorita que me desobedeceu. Eu gostaria de devorá-la e chupar seus ossos porque ela enganou meu sócio e ajudou a minha puta a fugir. - Rosa engoliu em seco. Francesca parecia uma estátua de mármore, imóvel. Ele prosseguiu. -Mas não posso descontar minha raiva nela da forma como ela merece. Então eu me lembrei do nome do nosso pequeno clube....Coliseu...Pois bem. Se acalme minha irmãzinha. Nosso gato não vai devorá-la. Resolvi descontar minha raiva em alguém mais descartavel. Alguém cuja vida vale tão pouco que pode pagar pelos seus erros tolos.

- Lorenzo, o que vai fazer... Por favor...Não. - ela murmurou e pousou a mão enluvada na testa, passava mal.

Lorenzo bateu palmas. A porta do salão foi aberta e dois capangas trouxeram um mendigo. O homem cheirava a álcool e sangue, pois havia sido cortado para atrair a atenção da fera. Lorenzo acariciou o felino e tirou primeiro a focinheira e depois a coleira. A única reação de Francesca foi morder os pŕoprios lábios e cobrir o rosto com as mãos, mas tal gesto foi reprimido pelo irmão, que afastou as delicadas mãos dela de seus olhos, de forma brusca. 

Sob o Signo da SerpenteDonde viven las historias. Descúbrelo ahora