XII - Reencontro

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1943

Elena sabia que era questão de tempo para que Carmen saísse daquela casa. Sabia que o casamento era um modo para que a jovem fugisse daquela prisão mascarada de lar. Por fim sorriu para esta, se aproximando e sentando do seu lado. Passou seu braço pela cintura da moça e deixou que ela repousasse sua cabeça por sobre seu ombro.

- O que sei de sua mãe é o mesmo que seu pai disse, Carmen. Digo, que Cesário disse. - Era difícil para Elena chamar outra mulher de mãe de Carmen. Ela havia criado a filha com muito amor e chegava a quase sentir ciumes de uma pessoa que sequer sabia se ainda existia. - Mas ele é um mentiroso profissional. Não quero enfiar esperanças em seu coração, mas também não sou mentirosa e vou dizer o que penso. Talvez ela esteja viva, talvez pense em você. Se ela entregou você, bem... Todos somos passíveis de erros, deve perdoá-la. Talvez não tivesse condições de criá-la dignamente. A verdade é que não sabemos de nada sobre o assunto.

Por fim se ergueu, com a sua comum impetuosidade e puxou a filha pela mão. Seguiu na direção dos seus próprios aposentos e a levou para sua saleta privativa. Lá deixava seus objetos particulares e as fotografias e recortes que Cesário lhe trazia do Brasil. Por fim sentou-se na sua escrivaninha e fez um sinal para que Carmen sentasse a sua frente.

- Aprovo a sua partida e tudo que te motiva, meu amor. Sempre soube que você ia partir pois te criei para ser livre. - A mulher tinha a voz embargada.

Mostrou uma fotografia para ela. Poderia reconhecer Elena mais jovem, com um vestido muito bonito. Ao seu lado, um rapaz com um bebê loiro no colo. O rapaz...Carmen poderia reconhecê-lo como o músico dos recortes que Cesário trazia para afrontar a esposa. Na foto havia ainda duas mulheres, uma com um garotinho nos braços.

Carmen pegou aquela foto e passou os dedos pelo rosto das pessoas presentes nela. Pausou-o na figura da mulher com a criança, algumas coisas atingiram sua mente de um modo que não podia decifrar. Eram cenas, eram sons, cheiros. Uma voz aguda e bela que cantava. ''Reze para São Miguel Arcanjo...Eles vão embora'' ''Abrace a sua irmãzinha''. A jovem engoliu em seco e apenas guardou a foto consigo, atordoada. 

- Pode fugir com Giovanni, mas não se case com ele. Não quero vê-la viver o mesmo inferno ique vivo com seu pai. Estas pessoas... - Apontaria, fitando a imagem com os olhos marejados. - ...vão te ajudar. Esta é Letízia, minha irmã. É muito doce e gentil. E este é Cesare Sforza...

Do homem ela não comentaria nada, apenas engoliu em seco. Deixou aquela amada foto com Carmen e a moça sentiu aquilo como uma prova de amor de sua mãe adotiva. Por fim ela se ergueu novamente e praguejou contra todas as memórias e sentimentos que a tomavam naquele instante. Não gostava de demonstrar suas fraquezas para a filha. Se aproximou da estante e começou a tirar alguns livros, que Carmen veria que estavam cortados pela metade. Dali tirou uma caixa e entregou, sorrindo.

- Não vai precisar da fortuna de nenhum Sforza para encontrar sua mãe. Tem a minha. - Quando abrisse a caixa a jovem veria muitas joias caríssimas. Elena havia escondido todo aquele tempo, de certo havia roubado de Cesário. - Seja feliz, minha vida. 

Carmen aceitou aquela caixa de jóias, e a abriu, secando as lágrimas. Outra menina poderia enxergar ali belas jóias para usar em bailes, a jovem via um passaporte para sua liberdade. Ela fechou a caixa e aquiesceu. Os olhos dela estavam úmidos. A moça abraçou Elena, e chorou por algum tempo até que por fim se levantou com a mãe.

- Eu queria levar você comigo. Eu queria te levar embora desse lugar - Carmen secou as lágrimas, a menina rangia os dentes , não sabia se odiava Cesário, mas sabia que odiava o regime em que viviam. E sabia que sua amada mãe era mais do que aquilo - Eu vou voltar, mamãe. Vou voltar para buscar você, eu prometo. Mesmo que eu encontre a mulher que me pôs no mundo naquele lugar, papai disse que me trouxe do Brasil... Se eu me casar com Giovanni ou se eu chutar a bunda dele assim que eu chegar lá...Eu volto pra buscar você.  

Sob o Signo da SerpenteDonde viven las historias. Descúbrelo ahora