Naquele meio tempo Elena partira outra vez para o Brasil, como havia decidido de maneira tão impulsiva. Trouxera consigo sua empregada pessoal, Alfreda. A mulher a ajudava com suas coisas e com os cuidados com Penélope. Durante o dia a ruiva ficava com a filha, durante a noite se aventurava pelo enorme navio. Ia nas festas das classes mais simplórias ou nos cassinos. Bebia, dançava, jogava cartas e flertava. Havia abandonado o luto e sua figura chamava a atenção no navio. Trajava-se como homem com a mesma naturalidade que vestia-se como mulher. Tinha a segurança que só alguém com muito dinheiro poderia ter.
Elena chegara no Brasil muito animada. Se despedira dos amigos que fizera no navio e deixaria alguns corações partidos quando pisou em terra firme. Tomou um carro de aluguel e parou no hotel que Cesário sempre ficava, na sua mesma suíte. Ficou admirada com o bom gosto do primo. Era muito grande. Também pegou um quarto privativo para sua criada, tão luxuoso quanto. A mulher nunca havia vivido com tamanha fartura em sua vida.
- Senhora...? Onde vai, acabamos de chegar? - Cometou a criada, fitando Elena com um olhar curioso.
- Não estou cansada. Fique aí, descanse com Penélope. Logo retorno.
Se aproximou do bebê, lhe deu um beijo na face rósea e apertou a bochecha da criada, que fez uma expressão de censura bem humorada. Nunca havia conhecido alguém tão rica e tão simples. Elena desceu para o térreo e procurou a recepção. Falou com seu português afiado. Havia estudado muito a língua desde que Rosa partira. Não sabia qual a razão daquele impulso.
- Acha que pode ficar pronto até as nove?
- Claro, senhora.
Sorriu e então partiu, apressada. Queria fazer uma surpresa. Seguiu na direção do Teatro Municipal de São Paulo, onde Cesare costumava fazer os ensaios da orquestra. Sabia que haveria um naquela tarde, e sabia o horário. Adentrou o lugar com facilidade. Se identificou como prima de um dos patrocinadores, o que não era mentira. Sentou-se no fundo do salão e observou o ensaio de maneira discreta. Trajava-se com um vestido marrom, muito elegante. Tinha um ar de amazona, os cabelos rubros presos num rabo de cavalo caído, um chapéu de montaria sobre a cabeça.
Cesare tocava, concentrado. Se dedicava muito à orquestra e cada vez mais conseguia lugares de destaque nas apresentações. Quando Elena entrou, ele executava um solo de violino com perfeição. Os olhos do rapaz estavam cerrados, e algumas lágrimas corriam por seu rosto. Mas não era tristeza, era como se a música o preenchesse e transbordasse por seus olhos.
Apenas esperavam Rosa voltar para ficar com Francesca e Vicenzo, pois Cesare já havia conseguido alugar uma casa espaçosa e bem cuidada. Ainda era uma casa no bairro operário da Barra Funda, como a de sua irmã, mas era boa e só para ele e Letizia. Nunca mais voltariam ao cortiço.
Cesare terminou de tocar e arrancou aplausos do restante dos músicos e do próprio maestro. O ensaio terminava. Ele desceu do palco num pequeno salto e ia saindo do teatro quando por fim avistou Elena. O rapaz parou, boquiaberto e depois de alguns segundos sorriu.
- Elena! Graças a Deus chegou bem. - ele se aproximou dela e lhe deu um caloroso abraço.
A ruiva abraçou Cesare com força, animada. Certamente chamaria a atenção dos demais músicos. Além de ser uma figura chamativa, seus modos eram um tanto quanto inadequados para com um homem casado. Quando o soltou, Cesare percebeu o chapéu levemente torto. Elena nunca parecia estar completamente alinhada.
- Ora, acha mesmo que um oceanozinho iria me abater? - Lhe deu um tapinha amigável no ombro. - Eu ouvi tudo e achei lindo. Sou um pouco ignorante com música, mas...Acho que se toca nosso coração o objetivo foi atingido, não é mesmo?
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Sob o Signo da Serpente
Mystery / ThrillerUm segredo de família guardado a sete chaves, em um teto onde alguém pode não ser o que parece. A história de um clã que carrega uma sina maldita. Em meio a luta pela sobrevivência e o amor encontrado entre as frias paredes da mansão de Veneza, uma...