XIII - Sonhos

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1918

Antes que pudessem partir, Beatrice seria contida pelo médico responsável por Francesca. Ele chamou-as para sua sala e faria um sinal para que a senhora Sforza sentasse a sua frente. Rosa, a quem acreditavam ser apenas uma criada, ficaria sentada numa das poltronas ao fundo.

- Senhora, sei que temos ordens de seu irmão para tratar sua irmã da melhor maneira possível. Lhe indicamos uma de nossas melhores acompanhantes, liberamos seus passeios, banhos solitários, uso de artefatos pessoais. Enfim, acreditávamos numa melhora. - O homem se ergueu e se aproximou da janela, fitando o lugar. - Agora, com a saída de sua visitante, ela caiu de uma escada. Não se preocupem, os ferimentos foram leves e ela já está no seu aposento. Mas uma testemunha deu a crer que ela fez isso de propósito. Auto flagelo, tendências suicidas... Teremos que intensificar o seu tratamento.

Beatrice arqueou as sobrancelhas, olhando para trás e fitando Rosa. Por fim voltou a olhar o homem e seria sua vez de falar.

- Agradeço os cuidados, mas espero logo poder liberá-la daqui.

- Isso depende de uma liberação médica, senhora. Existem procedimentos que devem ser seguidos. E, infelizmente, a saída de vossa cunhada não depende apenas de sua intenção.

- Tudo isso só por causa de um tombo? - Beatrice exclamou.

- Não apenas isso. Verificamos um comportamento sexualmente anormal em sua cunhada, senhora. - O homem tornou a fitá-las, ainda sim sem fixar seus olhos em Rosa. - Várias pessoas a viram... Tocar em sua criada de forma íntima durante a visita, sem pudor algum. Isso pode ser considerado um sinal grave de transtorno. Foi difícil conter a surpresa de algumas pessoas, principalmente de nossas irmãs religiosas.

Rosa num primeiro momento se conformou ou pareceu se conformar em ficar de fora daquela conversa. Mas ela não ficaria sentada pacificamente. A sensação que aquilo lhe provocava era curiosa...Se ela fosse um homem noivo ou namorado de Francesca a admitiriam como parte da família. E era assim que se sentia. Queria passar a vida ao lado dela. A cigana se levantou e se encostou na porta. Ela primeiro arregalou os olhos ao ouvir que Francesca havia se jogado da escada...mas fazia sentido....Mas a ultima acusação contra a sanidade de sua querida fora demais para ela.

Rosa subitamente e começou a falar sem pedir licença chamando a moça pelo primeiro nome o que deixava clara sua intimidade.

-Doutor, Francesca não fez nada que eu não permiti. Eu e ela...Somos namoradas. Pode achar bizarro e sinceramente não me interessa mas não pode acusá-la de nada. E eu gostaria de saber o que o senhor acha de incesto....Pois na noite antes de ser internada ela me confessou que tinha medo que o irmão fizesse algo contra ela para estuprá-la. Agora me diga se aquele canalha já não veio visitá-la intimamente.

Rosa estava furiosa mas contida para que o médico não tivesse porque acusá-la de louca também. Ela se apoiou na mesa e o fitou.

- Ou o senhor vai me admitir aqui como acompanhante permanente de Francesca e eu vou olhar cada barbaridade que fizerem com ela, ou amanhã a cidade inteira saberá que seu hospital está servindo de cativeiro para que um homem poderoso estupre a própria irmã. E acredite, a sociedade acredita em todos os escândalos que envolvem essa família. Estamos entendidos?

E talvez naquele momento tudo dependeria de Beatrice. Ela era também uma Sforza, e as visitas de Rosa haviam sido permitidas por Lorenzo, sem restrições.

Beatrice ficou evidentemente chocada com as acusações de Rosa. Embora, em seu íntimo, soubesse que eram reais, confrontar a realidade era deveras dolorosa. Escondeu o rosto entre as mãos e então o médico se aproximou desta, tocando-lhe o ombro enquanto ouvia as palavras da cigana.

Sob o Signo da SerpenteDonde viven las historias. Descúbrelo ahora