XVIII - A Greve

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Não muito longe dali certos temores de Cesare e Francesca se concretizavam. O patio da fábrica estava lotado e um homem gordo e de idade avançada vociferava em um palanque improvisado. Reclamava da contratação de mulheres que aceitavam trabalhar pela metade do salário. Um burburinho corria pela multidão. Alguns homens concordavam, outros ponderavam que as condições de vida eram duras demais para se exigir que as mulheres não trabalhassem para complementar a renda de suas famílias. As mulheres permaneciam caladas e as que levantavam a mão para falar eram ignoradas pelo homem que logo tomou um grande susto.

Uma figura subira no palanque com um pulo. Era baixa e morena, com traços fortes. Ela o encarava com fúria.O homem riu, mas o olhar de Rosa o deixava nervoso.

- Imagino que a senhorita queira falar como um homem também. - ele zombou.

- Exatamente señor. Posso ou vai ficar quanto tempo mais nos insultando sem ser homem o suficiente para ouvir a resposta.

O homem cuspiu no chão em desaforo para não cuspir nela já que a multidão gritava para que a deixasse falar.Rosa ficou de frente para a aquela grande quantidade de gente. Ela não tinha vergonha ou medo e sabia que a responsabilidade de defender as outras operárias estava em suas costas, já haviam conversado a respeito de defender o direito das mulheres e ela fora eleita para representá-las.

- Gostaria que reparassem que grande serviço esses senhores fazem para os patrões quando nos dividem entre homens e mulheres. Fazem com que nós explorados odiemos uns aos outros. Preferem brigar como ratos pelas migalhas dos patrões e nos acusar a exigir que tenhamos todos o mesmo salário e os mesmos direitos. Mas quando voltam para casa acham que servimos para cozinhar e mantê-los limpos e alimentados. E as senhoras tem patrões no trabalho e em casa. Enquanto isso o dono desta fábrica deve estar em algum lugar luxuoso comendo caviar. Por isso, a proposta que faço em nome das operárias é que se haverá greve, que seja por salários iguais. Eles tem o discurso e a polícia. Mas nós paramos as maquinas.

Primeiro as mulheres gritariam e a aplaudiriam entusiasmadas. Depois os homens acabariam por concordar que fazia mais sentido brigarem com os burgueses do que com as proprias companheiras. E a pauta da greve estava votada : melhores condições de trabalho e salário igual para homens e mulheres.

O carro negro de Cesário surgiria no meio de toda aquela manifestação. Cobriu o nariz com seu lenço, como se a pobreza daquela gente pudesse ser contagiosa. O fato é que estava cansado de todo aquele clima de insatisfação e revolta. Conseguira dar jeito na tecelagem e em outros negócios seus na Europa, mas no Brasil seus gestores eram completamente incapazes. Contavam com a simpatia dos operários em tratar do assunto com um italiano. Conseguiu ouvir as palavras de Rosa e praguejou ao reconhecê-la. Era a puta de Lorenzo. Por fim sorriu. Conhecia bem a moça, o oposto desta que pouco o conhecia.

- Leve-a para meu escritório. Também leve o líder, aquele bonachão. Vamos colocar um contra o outro e ver no que dá. ?

Murmuraria para seu assessor e então partiria com passos decididos para seu escritório. Em pouco tempo conseguira um lugar de destaque na fábrica. Era engenhoso e perspicaz, sabia das ideias que vinham do outro lado do oceano e que fomentavam a ira dos sonhadores da América. Já via um estilo de vida despontar, algo que efervescia o ego dos trabalhadores.

- Senhores! O senhor Cesário Delatorre chegou hoje da Itália para conseguir resolver a situação que tanto incomoda as relações dentro de nossa fábrica. Ele teve muito sucesso na Europa...- Enfatizou aquilo, certamente atraindo a simpatia dos saudosos imigrantes. - ...acredito que terá aqui também. - Por fim voltou-se para Rosa e o outro homem. - Ele os chama para conversar em seu gabinete. Depois virá falar com os demais funcionários. 

Sob o Signo da SerpenteDonde viven las historias. Descúbrelo ahora