A jovem italiana fora acordada com um corpo quente sobre o seu, e beijos tépidos em seu rosto e lábios, as mãos calejadas passando por seus cabelos e percorrendo as curvas de seus seios. Era Rosa, finalmente estava de volta.
- Francesca...Não me deixe. - sussurrou em seu ouvido - Eu a amo mais do que a mim mesma.
A moça sorriu, sonolenta e achou graça, piscando seus olhos negros, emoldurados por cílios longos e curvos, ainda sonolenta massageou o rosto pálido e encostou no rosto de Rosa seu narizinho arrebitado, deixando escapar um sonoro riso.
- Rosa! Você achou que eu estava falando a verdade? É claro que eu não pensei um segundo sequer em deixá-la, sua boba - Francesca sorriu, bocejou e acariciou seu rosto - Agora volte para a casa de William, aqui não é seguro para você.
Rosa se afastou , ficou em silêncio e cobriu os lábios com as mãos. Seus olhos se encheram de lágrimas, alguns palavrões em espanhol lhe percorreram os lábios, e ela batia a mão morena na larga cama, enquanto praguejava sob o olhar divertido de Francesca.
- Eu...Pensei...Ah meu deus...Eu pensei que você... Que não me queria mais....
- Rosa! Que boba.
- Francesca eu me deitei com aquele homem essa noite. - a pele escura de Rosa empalideceu, e seus olhos se tornaram vidrados, ensaiando as lágrimas que estavam prestes a escorrer. Não poderia, jamais, esconder nada dela.
Um longo silêncio se colocou entre as duas. Francesca engoliu em seco e suspirou, Ela não falava nada, tinha os olhos negros fixos em algum ponto do espaço. Rosa não conseguia olhar para ela, a vergonha era grande demais. Mas havia dito, não teriam o peso de um segredo. A cigana olhava pela janela, com as mãos trêmulas quando por fim ouviu a voz suave de sua amada
- Tudo bem. Eu a perdoo. Pode voltar para a casa dele. Não quero ficar brava com você agora, meu anjo. Só quero que fique segura e bem até que tudo isso passe - Francesca chorava, magoada, mas caminhou até a espanhola e a abraçou, acolhendo o rosto da mulher entre seus seios.
Rosa afundou o rosto na camisola dela e sentiu seu perfume doce. Sentia saudades do corpo dela, de deitar e acordar a seu lado. De tomarem juntas o café da manhã e de ninarem juntas o pequeno Vicenzo. Depois do inicio da greve não houvera mais tempo para nada daquilo. Era evidente que não estava tudo bem, mas toda a tragédia em Veneza a tinha forjado para viver suas dores em silêncio, para relevar e sofrer sozinha, sem dividir a responsabilidade pelo peso e pela dor que lhe habitavam o coração. Rosa sentiu seu coração apertado ao ver que Francesca mordia os lábios para segurar as lágrimas, queria protegê-la daquela dor, queria poder voltar atrás, mas afinal, aquela postura de sua esposa era demasiado cômoda.
- Certo...Niña, vou fazer isso... Vou fazer isso mas volto de madrugada. Volto para você, meu amor. Sinto sua falta, me sinto terrível pela forma como a tratei e...
Francesca a calou com um beijo. Ela era tão boa, tão doce, a melhor coisa que havia acontecido em sua vida. Rosa sentiu medo real, medo de a afastarem de sua querida. De não ver Vicenzo crescer e não ter mais a moça a seu lado. Era arrependimento que havia em seu coração quando chorando ela deixou a casa para voltar para William, esperava que ele não tardasse a encontrar um lugar para onde ela pudesse levar sua mulher e onde não tivesse mais de olhar para ele. Fora um erro, estava bêbada e agira por impulso, não que a explicação atenuasse o peso que carregava. Teria de lidar com aquilo até o fim de seus dias.
*******
Assim que Rosa pisou dentro da casa, o lugar foi invadido. Certamente estavam vigiando a morada de Francesca e a seguiram até seu esconderijo. William foi acordado com bordoadas, com gritos. O lugar foi completamente revirado. Tiravam fotografias e fizeram questão de fotografá-la perto dos símbolos do partido. Qualquer revolta demonstrada por ambos serviria para demonstrar a incivilidade dos comunistas. Como era de se esperar, Rosa resistiu à prisão até que já não houvesse mais como. Seria difícil segurá-la, era uma mulher forte e ágil, e eles certamente só conseguiriam por serem muitos e armados. Já William não oferecera resistência, acordara confuso e assustado, e sem uma arma na mão, não tinha qualquer potencialidade física em seu corpo de intelectual que pudesse ajudá-lo a resistir.
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Sob o Signo da Serpente
Mystery / ThrillerUm segredo de família guardado a sete chaves, em um teto onde alguém pode não ser o que parece. A história de um clã que carrega uma sina maldita. Em meio a luta pela sobrevivência e o amor encontrado entre as frias paredes da mansão de Veneza, uma...