20º Capítulo - Clara

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Tive um sonho meio confuso, difícil de explicar. Era como se fosse... Não sei... O futuro.

Havia um mundo devastado, escuro, sombrio e horripilante. Gritos ecoavam, sendo carregados pela brisa gélida, que me fazia tremer.

_ Está vendo, criança? É isto que vai acontecer caso permaneça deste lado. – soou uma voz metálica ao pé de meu ouvido.

Virei-me bruscamente e acordei.

Jake observava-me de forma tão atenta que deixou-me constrangida.

_ Fico feliz que tenha acordado. – murmurou ele em tom doce.

Instantaneamente senti a cor rosada invadir minhas bochechas, sem que tivesse autorizado. Era a vergonha transparecendo através do rubor em minha face...

_ O que aconteceu? – perguntei, desviando o olhar.

_ Você apagou assim que entrou na sede. – respondeu-me.

Observei o local em que me encontrava. Era aparentemente um pequeno aposento, bem diferente dos enormes cômodos dos Luminescentes. Mal iluminado, frio e com apenas uma cama.

Teias de aranha espalhavam-se aos montes por todos os cantos.

_ Você sabe o porquê de meu desmaio? – indaguei.

Lentamente, Jake sentou-se no pé da cama. Em seguida, sentei-me também para olhá-lo nos olhos.

As paredes possuíam um tom cinza deprimente e só havia uma pequena janela no quarto. Era dela que vinha a única fonte luminosa que transmitia um pouco de vida ao lugar.

Observei rapidamente o teto e notei o bocal vazio, à espera de uma lâmpada.

_ Primeiro, como resposta a sua dúvida silenciosa, faz tempo que não utilizamos este quarto. O número de pessoas do Caos não costuma aumentar de forma significativa e, geralmente, as que chegam suprem os quartos vazios que restam após a batalha, afinal sempre ocorrem mortes provindas do nosso lado... Mas não se preocupe! Vamos pintar as paredes, colocar uma lâmpada, adicionar um guarda-roupas... – murmurou ele em tom feliz.

Não pude deixar de sorrir. Jake estava sendo tão carinhoso e prestativo...

_ Tudo bem. – aproximei-me e dei-lhe um beijo no rosto. – Agora responda a minha segunda dúvida.

_ Bem, creio que ao pisar na sede, seu lado que pertence ao Caos tomou força, desestabilizando seus sentidos, fazendo-a desmaiar imediatamente.

Estremeci. Não sei se queria que meu lado mal tomasse o controle de meu corpo...

_ Mas sinto-me como antes. Nada mudou... – murmurei confusa.

_ Os efeitos demoram a aparecer. – sussurrou ele em tom quase inaudível, como se não quisesse que eu escutasse.

Ignorei o comentário e desviei o olhar.

_ Seus olhos são tão lindos... – murmurou ele, encantado. – Cheios de mistérios.

Corei.

_ Não carrego mistérios que transpareçam em meus olhos. – menti.

_ Ah! Não? – Jake sorriu. – Todos nós temos mistérios, Clara. E eu estou louco para desvendar os seus...

Ele se aproximava cada vez mais. Demorei a entender que sua intenção era beijar-me.

Meu coração acelerou e eu fiquei de pé.

_ Quero conhecer o lugar. – exclamei.

Jake suspirou, despejando toda sua frustração em seu resmungo silencioso.

_ Vamos jantar agora.

_ Jantar? – perguntei assustada.

Caminhei até a janela e notei que a luz que a adentrava, na verdade, era gerada por um poste solitário, que se postava no meio de um pátio.

_ Você dormiu por um dia inteiro. – afirmou ele.

Encarei-o, incrédula.

_ Como...? – gaguejei.

_ O Caos estava... Ahn... Tomando as rédeas de sua vida, digamos assim. Foi preciso quase que um dia inteiro para que seu corpo, sua alma e sua mente se estabilizassem.

Não podia acreditar! Então é assim? O Caos toma meu corpo e eu aceito? Fica tudo bem?

Tarde demais para voltar atrás...

_ Ahn... Então vamos jantar. – sussurrei, escondendo a confusão que tomava minha mente.

Jake assentiu e ficou de pé a meu lado.

Caminhou pesadamente até a porta e abriu-a de forma irritada.

Concluí que ele não tinha gostado nem um pouco do fato de que eu tivera me esquivado, literalmente, de um beijo...

_ Vamos? – chamou ele, olhando em meus olhos.

Fiz que sim com a cabeça e fui em sua direção.

Os corredores eram sombrios e causavam-me arrepios, tanto quanto o quarto. Jake mantinha-se bem próximo a mim, deixando-me desconfortável.

Passamos por alguns cômodos fechados, até que Jake parou.

_ Preparada? – perguntou ele.

_ Não. – respondi.

Rindo, virou-se para a esquerda e abriu a porta, revelando o mundo de pessoas que estavam lá dentro.

Não havia apenas uma mesa, como na sede dos Luminescentes. Eram cerca de dez mesas, cada uma com umas cinco cadeiras.

As pessoas andavam de um lado para o outro, falavam alto, discutiam, riam... Era um verdadeiro caos!

Minha vontade foi a de virar as costas e sair correndo.

_ ATENÇÃO! – gritou Jake.

Algumas pessoas pararam, outras apenas ignoraram a ordem e continuaram a falar.

De repente, um arrepio percorreu meu corpo. Uma forte tontura abateu-se sobre mim. A vista escureceu e eu tive que apoiar-me em Jake com o intuito de não cair.

Todos se ajoelharam, mas não entendi o porquê.

Ao olhar para trás, entretanto, tive a certeza de que deveria ajoelhar-me também.


O Ciclo de Sangue - A Escolha da Herdeira (livro 02)Onde histórias criam vida. Descubra agora