_ Clara? – soava uma voz ao longe, fazendo-me querer abrir os olhos.
_ Sim? – sussurrei, erguendo as pálpebras lentamente, lutando contra a luz artificial que invadia o ambiente.
_ Graças a Deus! – exclamou seja lá quem fosse. – Lucy? Lucy, venha cá!
Minha cabeça pesava feito chumbo. Passos soaram pelo quarto, apressados, seguidos pelo som da porta sendo escancarada brutalmente. Com dificuldades, forcei-me a sentar.
_ Clara? – berrou mamãe ainda do corredor. – Clara, minha filha!
_ O que foi? – perguntei impaciente, sentindo a cabeça latejar. – Estou com dor de cabeça, poxa...
Subitamente ela irrompeu dentro do quarto com o rosto encharcado por lágrimas. Imediatamente gritou:
_ Nani, traga comida!
_ Mãe, não grite! – implorei. – Minha cabeça vai explodir...
_ Graças a Deus! – exclamou, ignorando meu comentário. Sem pensar duas vezes, jogou-se em minha cama, envolveu seus braços por meu pescoço e começou a me encher de beijos molhados.
_ Mãe, para! – reclamei. – Para com isso!
A contragosto, ela se afastou um pouco, encarando-me e ainda segurando meu rosto. O choro era contínuo e enlouquecedor. Soluços entrecortavam sua respiração.
Confusa, encarei-a.
_ Dois dias... – foram as únicas palavras que saíram de sua boca.
Arrepiei.
_ O quê? – exclamei, desviando o olhar e focando a janela, observando a noite escura que se estendia lá fora.
De repente, papai irrompeu no quarto.
_ Ah, meu Deus! – exclamou, correndo em minha direção como mamãe fez. – Nani, traga comida! – berrou, já abraçado a mim.
Senti a cabeça vibrar.
_ Paaaai! – reclamei. – Não grite, minha cabeça está...
_ Lucy, pegue um pano úmido. – interrompeu-me. – Ela ainda está quente.
_ Eu estou quente? – perguntei, me desvencilhando dos braços de papai e mamãe para tocar o próprio rosto. – Eu não estou quen... Meu Deus. – interrompi a mim mesma. Eu estou muito quente.
Minhas bochechas ardiam como brasa e minha testa pegava fogo. Mamãe não demorou a levantar e fazer o que papai havia pedido.
_ Você apagou por dois dias, filha... – murmurou papai, tocando meu rosto seguidas vezes, escancarando preocupação em seus olhos sem vergonha ou medo. – Sonhou com alguma coisa?
Franzi a testa tentando lembrar, mas nada me vinha a mente. Imediatamente sacudi a cabeça em sinal negativo.
_ Acho que não... – minha voz saiu rouca. Tossi, limpando a garganta. – Ao menos não que me lembre.
Meu pai assentiu. Neste momento, mamãe chegou com o pano e entrou desesperada no quarto.
_ Aqui está! – sua respiração estava acelerada. Provavelmente correu como louca pelos corredores do palácio. – Ela ainda está muito quente?
Papai assentiu, tomando o tecido de suas mãos e pressionando-o contra minha testa. Arquejei com o contato frio da superfície macia.
Minha cabeça girou.
_ Aaaaaai! – reclamei, empurrando sua mão para longe de mim. – Minha cabeça, pai!
_ Vou pegar um remédio... – sussurrou ele, apertando os lábios, transformando-os numa linha reta que evidenciava tensão. – Lucy, continue pressionando o pano sobre o rosto dela.
_ Certo... – murmurou mamãe. – E peça a Nani que traga logo a comida.
_ Ok. – respondeu papai, retirando-se.
_ Desculpe, meu amor... – pediu mamãe baixinho enquanto pegava o pano e o levava rumo a minha testa. – Sei que vai incomodar, mas precisamos tentar reduzir sua febre.
Assenti com pesar.
Nova onda de enxaqueca invadiu meu sistema nervoso quando a compressa impiedosa começou novamente. Praguejei mentalmente.
_ Por que apaguei de novo? – perguntei, tentando ignorar o terrível desconforto que já atingia meu pescoço.
Mamãe suspirou.
_ Eu não sei... – a expressão que circundava seu rosto transbordava impotência. – Queria saber, mas ninguém faz a menor ideia do motivo...
Engoli em seco.
_ Lucy? – chamou aquela voz desconhecida ainda do corredor.
_ Entre, Nani. – convidou mamãe.
_ Que horas são? – questionei, observando a janela e o céu enegrecido logo adiante, pontilhado de várias estrelas muito brilhantes.
_ Quase duas da manhã. – respondeu mamãe.
Arregalei os olhos.
_ Meu Deus! E vocês estão acordados por minha culpa?! – exclamei envergonhada.
As duas mulheres riram. A tal Nani aproximou-se da cama lentamente com uma farta bandeja nas mãos.
_ Não estamos tristes com isso, pode ter certeza. – afirmou ela com doçura. Um leve sorriso escapava-lhe os lábios. Aproveitei para observá-la.
Seu tom de pele bem moreno chamou-me a atenção. Seus fartos cabelos negros lembravam-me alguém, bem como seus olhos brilhantes que mais pareciam jabuticabas. Pela aparência, devia ser um pouco mais velha que mamãe.
Estremeci.
_ Você me lembra alguém... – estreitei os olhos, forçando a memória para lembrar. – Já te conheço?
_ Acho que não. Talvez tenha me visto de soslaio alguma vez pelos cantos da sede, mas nunca fomos apresentadas. – a mulher piscou e abriu um sorriso sincero, colocando a bandeja cuidadosamente sobre a cama para estender a mão a fim de me cumprimentar. – Sou Suzane, mas todos me chamam de Nani. Minha aparência deve lembra-la de Dylan. Sou mãe dele.
Meu mundo caiu. Engoli em seco e perdi a cor. Incrédula, encarei mamãe e murmurei:
_ Ele nunca me disse nada sobre ter uma mãe na Luz... – vergonha e culpa consumiam minhas palavras.
_ Acho que nunca surgiu a oportunidade para ele te contar, filha... – interveio mamãe.
Assenti, baixando os olhos.
_ Mas ele me disse muito sobre você! – exclamou a mulher, tocando meu rosto. – E ele tinha razão, você é muito bonita.
Corei e sorri, agradecendo timidamente com o olhar.
_ Mas não é hora de falar sobre isso! – afirmou. – Trouxe sopa, alguns pães, geleia, torradas e suco de laranja. Não sabia o que iria querer.
Lancei um olhar para aquele monte de comida e senti o estômago apertar.
Não queria nada... Pensei, mas sabia que precisava comer, então forcei um sorriso e murmurei:
_ Vou querer tudo, Nani! Obrigada...
A mulher assentiu e piscou para mim. Engoli em seco e puxei a bandeja para mais perto.
E lá vamos nós...
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O Ciclo de Sangue - A Escolha da Herdeira (livro 02)
FantasíaClara tem 16 anos e já treina com os Luminescentes desde que se entende por gente. Entretanto, não é bem isso que seu coração deseja. Vivendo insatisfeita, Clara se revolta e muda de lado, surpreendendo e desestabilizando a todos, inclusive sua mãe...