25º Capítulo - Lucy

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Estava deitada sobre a cama, em meu quarto. A janela estava semiaberta, propiciando a entrada de uma gélida brisa.

Caminhei até ela e observei o espaço lá fora. A lua já estava alta no céu. Algumas nuvens ameaçavam cobri-la.

Pontinhos brilhantes espalhavam-se pela imensidão azul escura, fazendo com que olhar para o céu se tornasse algo extremamente gratificante.

Minha barriga roncou, deixando claro que eu havia dormido por muito tempo e o horário do jantar havia sido perdido. Virei-me, na intenção de passar pelo quarto e seguir para a cozinha, mas fui surpreendida por Ícaro, sentado na cama, encarando-me.

_ Ícaro! – exclamei. – Quer me matar de susto?

Meu coração estava acelerado. 

_ Eu que lhe pergunto, Lucy. – murmurou ele em tom reprovador. – Você desaparece por um bom tempo, fico que nem um louco a sua procura e, após cansar de tanto andar por esta sede, encontro você caída no chão de um cômodo que eu nem sabia que existia!

Corei.

_ Você acha que eu quis sumir, guardião? – perguntei, irritada. – Acha que eu quis "apagar" naquele quarto?

_ Se não quis, o que te fez ficar lá, desmaiada no chão? – Ícaro aumentou seu tom de voz.

_ EU NÃO SEI! – gritei com convicção.

Ressentida, caminhei pesadamente até a porta, abri-a num estrondo e parti em direção a cozinha, buscando comida.

Ícaro não me ajudara em nada! Minha cabeça latejava, a mente estava a mil por hora, medo e raiva misturavam-se em meu coração.

Sentia vontade de quebrar algo! De preferência, a cara de meu marido.

Num dos corredores, notei o relógio pendurado na parede: 2 horas da manhã. Realmente havia dormido por muito tempo.

O que me fizera apagar daquele jeito? Será a atmosfera do quarto? O medo? O cansaço?

Não queria contar a meu guardião qual tivera sido meu sonho. Tudo podia acontecer em minha vida, menos Ícaro descobrir que o risco de que ele poderia não ter me salvado no dia da batalha ainda me atormentava.

Ao alcançar a cozinha, – um lugar amplo e bem iluminado, mas que, durante a noite, tornava-se muito sombrio e medonho – dirigi-me para a geladeira.

A abri lentamente e tomei a jarra de suco nas mãos.

Algo, entretanto, fez-me soltá-la imediatamente.

Um sussurro no pé de meu ouvido deixou-me atordoada: "Um último golpe...".

Essas palavras reverberaram pela cozinha, fazendo minhas pernas tremerem e minhas mãos vacilarem. A jarra de suco foi de encontro ao chão. Para minha infelicidade, o vidro espatifou-se ruidosamente, quebrando-se em mil pedaços. O líquido se espalhou por boa parte da cozinha, deixando-me ilhada em meio à um mar de cacos e suco de laranja.

Ícaro apareceu no recinto com os lindos olhos azuis arregalados.

_ O que...? – murmurou ele.

_ Não se mecha! – exclamei. – Não entre aqui. Há muitos cacos espalhados pelo chão.

_ Meu Deus, Lucy! Você se machucou?

Observei a mim mesma e notei que havia um corte em meu tornozelo. Sangue escorria de forma contida e o ferimento ardia, mas nada insuportável.

_ Não, não me machuquei. – respondi.

Minhas mãos tremiam e meu coração estava acelerado.

_ O que te fez derrubar isto?

_ Longa história... – sussurrei. – Antes de tudo, preciso sair daqui.

_ Vou pegar as vassouras para darmos um jeito nisso.

×××

O trabalho foi lento e exaustivo. Acabamos de limpar tudo quando o relógio marcava 4h10min da manhã.

Resolvemos que era melhor dormir e conversar quando estivéssemos devidamente descansados. Entretanto, ao acordar, constatei que aquela conversa não deveria ocorrer nunca, pois não me sentia descansada, mas sim mais cansada.

Levantar da cama foi um sacrifício! Eu estava sozinha no quarto. Ícaro já havia me deixado para trás.

No momento em que ponderava a ideia de virar para o outro lado da cama e dormir novamente, meu marido irrompeu no quarto de forma bruta, fazendo-me ficar de pé em dois segundos.

Eu arfava. Meu medo era que a batalha já houvesse começado.

_ O-o quê...? – gaguejei.

_ Treinar! – exclamou ele. – Troque de roupa... Você têm 2 minutos.

Seu tom de voz era tão severo que, sem contestar, dirigi-me a meu guarda-roupas e comecei a escolher a vestimenta adequada.

_ Lucy? – chamou ele, antes de deixar o quarto.

_ Sim?

_ Você sabe onde deve me encontrar. – afirmou em tom sombrio.

Assenti relutante.

Minha vontade era a de fugir feito Clara. Não para o Caos, mas sim para uma vida normal.  

O Ciclo de Sangue - A Escolha da Herdeira (livro 02)Onde histórias criam vida. Descubra agora