32º Capítulo - Lucy

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Os alarmes soaram de forma assustadora, tirando-me de um sono profundo. Dei um pulo na cama e olhei o relógio, arfando. Eram 3 da manhã, estávamos em plena madrugada e eu não entendia o motivo da emergência. Entretanto, ao lançar um olhar pela janela de meu quarto, comecei a compreender o que estava acontecendo.

×××

Desci os degraus o mais rápido possível, quase que trocando os pés. Tropecei umas três vezes, mas a ansiedade de alcançar a borda da floresta era tão grande que o risco de despencar escada abaixo tornava-se insignificante.

Ao chegar no pátio do palácio, senti meu coração subir até a garganta e depois retornar ao peito. Um grupo formado por quatro guardas rodeava um corpo aparentemente inerte, bem próximo ao início da floresta. De longe, achei que estivesse morto, mas ao aproximar-me um pouco mais, pude enxergar o leve movimento em seu peito, o que indicava que ao menos estava respirando.

Em meio ao breu da madrugada, o rosto da pessoa era indistinto. Entretanto, meu coração se mostrava estranhamente acelerado.

Claro, um ser humano estava largado às margens da floresta! Isso era mais que motivo para sentir palpitações. Mas a sensação que me invadia era diferente... Era como se eu conhecesse aquela pessoa e devesse reconhecê-la.

_ Quem é? – gritei em pergunta, enquanto apertava os passos.

Um dos guardas me encarou incrédulo, entretanto, não disse uma única palavra. Aquilo me fez afundar ainda mais em desespero. Deixei os bons modos de lado e comecei a correr.

Ao ficar frente a frente com o corpo repousado sobre a grama fria e molhada da noite, quase senti meu cérebro entrar em colapso. Meus ouvidos zuniram e minha visão ficou turva.

A primeira coisa que reconheci foram os cabelos negros iguaizinhos aos meus.

_ Não... – foi a única coisa que consegui sussurrar.

Lágrimas embaçaram minha vista.

Aquele ser, aparentemente quase morto, com a respiração extremamente frágil, ameaçando cessar a cada instante, na verdade, era minha própria filha!

Os guardas notaram o desespero que se tornava aparente em minha expressão. Imediatamente, um deles ordenou:

_ Um de vocês, avise Ícaro e os demais. Os outros dois, ajudem-me a carregar a moça.

Sentia como se fosse desmaiar. A única coisa que pude fazer foi observar a movimentação dos rapazes.

_ Tenham cuidado. – sussurrei. – Ela pode estar ferida.

Os guardas assentiram e, com extrema prudência, tomaram Clara nos braços e carregaram-na até o palácio.

×××

Definitivamente não há coisa pior na vida de uma mãe que esperar um filho acordar. Ainda mais quando não se vê este filho há quase um mês, e sequer sabe se ele está ferido.

Escolhemos deixar Clara em seu quarto. Alguns médicos a examinaram, mas disseram ser difícil conseguir resultados seguros enquanto ela estivesse dormindo. Pediram que alguém ficasse de prontidão a seu lado, zelando por seu descanso, e é óbvio que não dei escolhas aos outros. Sem nem tomar opiniões, tranquei a porta do quarto e acomodei-me ao lado da cama.

Minha filha estava diferente. Observando-a dormir, podia notar os músculos mais acentuados em seus braços, o rosto mais definido e magro, aparentando uma expressão até mesmo sofrida, além das diversas cicatrizes que se amontoavam por todo o corpo.

Meu coração palpitava e meus sentimentos oscilavam entre a preocupação e a alegria, o desespero e o alívio.

De repente, a vi dar um pulo do colchão. Sentou-se tão rápido quanto meus olhos puderam acompanhar. Entretanto, uma fração de segundos mais tarde, soltou um ruído sofrido pelos lábios que mais parecia a tradução da palavra dor, expressa com intensa realidade. Em seguida, deitou-se novamente e apertou os olhos, impulsionando algumas poucas lágrimas a saltarem e escorrerem por todo o seu rosto.

Eu estava atônita demais, assustada demais, feliz demais e desesperada demais para reagir. Contentei-me em apenas observar a cena, que pareceu durar décadas.

Quando Clara enfim pareceu melhor, abriu os olhos com dificuldade e sussurrou com voz extremamente fraca:

_ Oi, mãe.

×××

Os médicos agiram rápido. No instante em que solicitei a presença deles, irromperam no quarto com um estrondo e começaram a examinar minha filha.

Encolhida num dos cantos, próxima a janela, eu observava toda a cena. Meu coração estava acelerado. Minha vontade era interromper os médicos, tomá-la no colo e começar a niná-la até que adormecesse.

Sua expressão era sofrida, como se a cada toque dos doutores o mundo perdesse mais a cor. E ela também perdia a cor. Seu rosto apresentava-se cada vez mais pálido e doentio.

Agora ficava claro que nada estava bem, entretanto, no momento em que encostaram em seu tornozelo esquerdo, meu coração pareceu praticar ginástica.

_ AAAAAARGH! – Clara rugiu.

Dei um pulo no lugar onde estava. Os médicos que cuidavam dela afastaram-se imediatamente, atônitos demais para reagirem. Depois, quando um deles despertou de seu transe, berrou para os outros:

_ Ala hospitalar! – todos o encararam, como se ainda estivessem caindo em si. – Tragam uma maca, agora!

O Ciclo de Sangue - A Escolha da Herdeira (livro 02)Onde histórias criam vida. Descubra agora