Capítulo Trinta

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Um Salto Para A Eternidade

Helena não havia se relacionado com ninguém durante todo o período em que esteve na califórnia. Não por falta de pretendentes, mas por que havia decidido focar em sua carreia de psicóloga. A escolha por essa profissão foi uma forma que ela encontrou de estudar um pouco sobre sua própria doença e compreender mais sobre si mesma, de modo que pudesse ajudar outras pessoas com o mesmo problema. Jeremy por sua vez, também se dedicou tanto a vida militar que não teve tempo para conhecer nenhuma garota.

O reencontro foi o suficiente para fazer com que os dois voltassem no tempo, revivendo a pura e verdadeira amizade que haviam construído. Não levou muito tempo para que Jeremy e Helena se casassem. O casamento deles foi realizado aqui nesse parque. Na época dentuça ainda estava viva, e tinha tido dois filhotes então decidiram levar todos eles para sua nova casa. Helena ainda sofria com sua esquizofrenia as vezes, mas Jeremy provavelmente era o único homem no mundo que conseguia acalmá-la. Depois de alguns anos Helena recebeu a notícia que sua esquizofrenia havia diminuído cerca de 90%. Foi nesse ano que eles decidiram ampliar a família, então tiveram uma filha, a qual deram o nome de Annie.

Quando seus pais morreram, Jeremy e Helena receberam as casas deles como herança. Como já possuíam uma casa, decidiram usar as casas que receberam de herança para criar uma ONG para crianças com esquizofrenia e cachorros de rua. Como uma forma de por fim ao ódio que seus pais sempre sentiram um pelo outro, decidiram derrubar as paredes laterais das duas casas e juntaram elas, formando uma enorme casa.

Passaram o resto de suas vidas trabalhando nessa ONG juntamente com sua filha Annie, que sempre amou brincar e ajudar a cuidar das crianças e dos animais. Annie cresceu e se tornou médica. Com o passar dos anos, a ONG passou a atender crianças com câncer, leucemia e outras doenças.

Anos depois, a esquizofrenia de Helena ressurgiu. Nessa mesma época, Jeremy foi diagnosticado com Alzheimer. Sem condições de administrar a ONG, entregaram o projeto nas mãos de Annie e alguns amigos, que cuidaram para que tudo continuasse em perfeito funcionamento. Vinham nesse parque quase todos os dias e passavam boa parte do tempo relembrando o dia em que se conheceram, o casamento, e todas as demais lembranças boas que tiveram aqui. Era uma forma de Jeremy sempre se lembrar de tudo, já que no dia seguinte sempre se esquecia de algum detalhe. Esse lugar abrigava as melhores lembranças que tiveram na vida.

Certo dia, Helena estava de olhos fechados, relembrando algumas memórias do passado enquanto Jeremy a admirava em silêncio como sempre fazia. Foi quando percebeu que em seu bolso não estava o remédio de esquizofrenia de Helena. Mesmo após o Alzheimer, ele nunca havia esquecido de pegar o remédio até aquele dia. Preocupado, forçou sua vista já danificada pelo tempo e olhou ao redor. Notou que a alguns passos de distância havia uma pequena caixa no chão e foi até ela. Era o remédio. Por um instante Jeremy respirou aliviado, porém ao voltar seus olhos na direção de Helena, viu que ela estava em pé, na beira da ponte prestes a pular. Desesperado, Jeremy, com sua voz fraca gritou o mais alto que coneeguia para que ela se afastasse da beirada, mas Helena não escutou. Ele continuou a gritar mas era tarde demais. Ela saltou no lago. Jeremy deixou sua bengala para trás e correu o mais rápido que pode, lutando contra as forças da velhice que debilitava seus movimentos. Sem pensar, se jogou no lago na intenção salvá-la. Ele mergulhou até o fundo do lago e por fim conseguiu alcançar o braço dela. Jeremy tirou forças de onde não tinha, conseguiu nadar com Helena em suas costas e a tirou do lago. Um grupo de pessoas se aproximou dos dois e por sorte uma dessas pessoas era um médico que se ofereceu para prestar os primeiros socorros a eles. Jeremy estava com o coração acelerado, sentia uma dor intensa no peito, mas pediu para que o médico cuidasse de Helena primeiro. Após diversas tentativas de reanimação, Helena pôs pra fora a água que estava em seus pulmões. Ainda sem entender o que havia acontecido, ela abriu seus olhos e procurou Jeremy. Os olhos dele se encheram de lágrimas ao vê-la respirando novamente. Ele colocou a mão no bolso e percebeu que mesmo após saltar no lago, ainda estava com o remédio dela. Ao tentar se levantar para se aproximar dela, sentiu uma pontada em seu peito e caiu no chão.

Naquele dia, Jeremy Hudson teve um infarte e seu coração parou de bater. Os dois foram levados juntos na ambulância até o hospital. Enquanto os paramédicos tentavam reanimar Jeremy durante todo o caminho, Helena não soltava o braço dele onde estava a cicatriz que ele havia recebido por salva-la pela primeira vez. Jeremy por sua vez, mesmo com o coração parado, não soltou a caixa de remédio em sua mão. Ao chegar no hospital ambos já estavam sem vida.

Sarah estava com os olhos repletos de lágrimas. Ela me abraçou forte. Também chorei. Embora já tivesse ouvido aquela história diversas vezes, sempre me emocionava quando ela chegava ao fim. Segurei o rosto dela com as mãos e enxuguei suas lágrimas. Do mesmo modo ela enxugou as minhas e por fim sorriu.

-Essa foi a história de amor mais
linda que eu já ouvi. Como você descobriu ela ?

-Uma vez, Ana me deu uma bronca. Disse que eu precisava parar de gastar meu dinheiro comigo mesmo e começar a ajudar as outras pessoas, disse que eu me sentiria melhor fazendo isso. Eu era muito cabeça dura na época e não dei muita bola, mas um certo dia quando voltava para casa passei em frente a uma ONG, que por coincidência foi a ONG dos Hudson. Foi la que conheci a filha deles, Annie. Perguntei como a ONG havia sido criada, pois não queria doar meu dinheiro para nenhuma instituição corrupta, mas foi então que ela me contou essa história que eu acabei de te contar. Assim como você, fiquei emocionado e fascinado pela história deles e quis saber mais. Annie me permitiu ler o diário de Helena e foi de lá que descobri tudo isso.

Sarah me olhou pensativa.

-Você me contou tudo isso como se estivesse realmente convivido com eles. Quantas vezes você já veio nesse lugar pensar nisso?

Sorri. Sarah me conhecia mais do que qualquer outra pessoa no mundo.

-Muitas.

Ela me encarou.

-Sinto que você ainda está me escondendo algo.

Continuei olhando para o por do sol em silêncio. Finalmente criei coragem e olhei para ela.

-Eu escrevi uma história sobre eles. Se chama ''Um Salto Para A Eternidade''.

Ela abriu um sorriso imenso no rosto. Me deu um abraço e depois ficou olhando o sol enquanto ele desaparecia na margem do horizonte. Se fosse qualquer outra garota ela diria ''puxa que demais eu gostaria muito de ler sua história''. Mas ela era Sarah Grace, e sabia o quanto era difícil pra mim expor meu lado escritor para as outras pessoas. Por mais que aquele pôr-do-sol estivesse incrível, não consegui permanecer com os olhos nele, preferi olhar para os olhos dela, e ver a luz dourada do sol refletida em seus olhos negros. Percebi que nada, nem mesmo os astros e as estrelas que sempre me encantaram, conseguiam me fascinar como antes, pois agora, não havia nada mais incrível do que contemplar todos esses milagres da criação refletidos nos olhos dela. Aquele era o momento perfeito. Minhas mãos percorreram meu bolso em busca da aliança que havia comprado. Meus dedos tremiam e a ausência de saliva na minha boca refletia o quanto aquele momento era especial para mim. Quando finalmente criei coragem de dizer a primeira palavra, ela falou.

-Olha, sei que não venci o desafio de dança, mas será que eu posso pedir uma coisa?

Encarei ela.

-Na medida do possível.

-Podemos ir até a ONG dos Hudson ?

Sorri. Guardei a aliança de volta no bolso sem ela perceber.

-É uma ótima ideia.

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