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Segunda-feira, 14 de março de 2016.

Quando estamos no interior das nossas mães, somos simples fetos, com pensamentos dos quais não temos a mínima lembrança e sensações das quais nos e impossível descrever, porque, como disse, somos simples fetos. E, por mais absurdo que seja, as duas situações em que estamos mais vulneráveis ao longo de toda a nossa vida são nada mais, nada menos, do que o nosso nascimento e o momento em que acordamos.

Quando nascemos, vemos um caminho novo para uma vida nova. E, quando acordamos, abrimos caminho para a realidade, deixando o sonho para trás; Se um nos traz ao mundo pela primeira vez, nos obriga a lutar e a viver por nós mesmos, o outro obriga-nos a encarar a realidade de novo. E encarar a realidade pode ser doloroso, deixando-nos susceptíveis ao mal.

A monotonia exaustiva do pressionar das teclas do computador em contraste com a algazarra vivida dentro da minha cabeça era um fator que punha em risco a minha pouca saúde mental. Os ponteiros do relógio não pareciam querer avançar, tal como os lucros do sector de agricultura, agora na minha mão, cujos rendimentos já tiveram os seus melhores dias.

Evitava ao máximo pensar na minha vida pessoal mas, a verdade, é que não é tão fácil faze-lo como em outras situações. Com Victoria no hospital há quatro dias e um perseguidor lunático em acção, a minha vida pessoal estava longe de ser esquecida, por mais que assim o desejasse.

- Tomlinson.- A minha atenção voltou-se para Joseph, que me interrompeu o pensamento.- Podes sair, eu acabo isto.- Ele voltou a falar quando me preparava para retaliar.

- De certeza?- Arqueei as sobrancelhas, evidenciando a minha surpresa.

- Completamente.- Assentiu, não sorrindo, mas não foi preciso para perceber que, no fim de contas, Joseph não deveria ser tão frio e abstraído como sempre pensei. Ou pelo menos, acreditava que isto era um pouco de bondade, ainda que, lá no fundo, eu soubesse que alguma coisa não batia certo.

Aceitando a sua oferta, deixei o escritório, conduzindo ao longo das estradas ainda longe da hora de ponta. Depressa o hospital se fez ver à minha frente, a paisagem que nos últimos dias é, infelizmente, a coisa à qual mais me habituei.

Ao entrar no seu quarto, pela primeira vez eramos só nós dois e o cântico deprimente do seu ritmo cardíaco.

- Olá anjo.- Sussurrei, acariciando-lhe as faces ainda sem a sua cor natural.- Como te sentes?- A pergunta desencadeou uma vaga de arrepios no meu corpo, fazendo-me recuar instintivamente. Fiquei apreensivo, mas pensei que, talvez, fosse apenas o meu corpo a reagir à sua presença. Só talvez

- Eu estou bem, ainda que não tenhas perguntado.- Retomei ao meu monólogo.- Bem, dentro dos possíveis, acho que ambos sabemos que os últimos dias têm sido um tormento para mim.- Parei, procurando, sem êxito, algum sinal de consciência da sua parte.- Não sei se me consegues ouvir, e uma parte de mim deseja que não, mas há tanto que sempre te quis dizer. Coisas que nem sequer imaginas sobre mim, e não são coisas boas anjo.- Quer ela ouvisse, quer não, era um modo de desabafar e atenuar um pouco a guerra vivida dentro de mim. - Quando te disse que era um demónio, apesar de falar no sentido figurado, tem muita verdade por detrás disto. Os demónios são seres das trevas cujas ações trazem consequências negativas, pecados melhor dizendo.- Cerrei o maxilar, tentando controlar-me.- E magoar-te, de alguma maneira, é o maior pecado que alguma vez poderei ter feito na minha vida de demónio.- Apertei a sua mão já sem grandes feridas, sentindo-a fria e, inevitavelmente, imóvel.

Era desgastante falar sozinho, na esperança que ela ouvisse. Quer ouça ou não, há muita coisa que lhe tenho de explicar, principalmente porque, se não conseguir tratar de descobrir o que querem de mim, continuar com ela envolve expô-la novamente ao perigo e isso é tudo o que eu não quero.

Suspiro alto, contornando a cama onde Victoria está deitada, presa à vida pelas máquinas, e encontro a janela larga que deixa a luz penetrar no quarto estéril e que dá uma vista agradável para as ruas movimentadas de Chicago. Por momentos é como se estivesse num hotel algures na cidade, a aproveitar um belo fim de tarde, sem preocupações nem peso nos ombros. No entanto, a realidade não poderia estar mais longe disso, como é evidente.

Volto-me para a minha habitante, e debruço-me na cama, deixando um beijo na sua testa, garantindo-lhe que voltaria em breve. Provavelmente no dia seguinte.

Ok, certamente no dia seguinte.

E foi quando ia deixar o seu quarto que o vi, ali, ao lado do soro que entrava na corrente sanguínea de Victoria, ao lado de uma garrafa de água intocada, em cima da mesa de apoio.

Ele dizia, com a mesma caligrafia que já antes havia visto, aquilo pelo qual anseio já há vários dias:

Grant Park, 15-03-2016, 22:00h.


N/A: O encontro está marcado TANTANTAN! Eu própria estou curiosa com o que vai acontecer :O e vocês delirantes?
p.s- Desculpem, muito mesmo, a minha ausência. Estou a duas semanas de acabar as aulas e tenho-me esforçado muito para subir as ultimas notas e o meu tempo combinado com uma pequena falta de inspiração levou a isto. Desculpem, vou tentar ser muito mais ativa este verão (É QUASE VERÃAAAAAO )

Obrigada por estarem sempre desse lado.

Time.

Delirium ➵ L.TOnde histórias criam vida. Descubra agora