Capítulo 6 - Porto

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No dia seguinte ao jantar com Bernardo, Luísa acordou assustada com o barulho ensurdecedor do alarme do seu celular. Ela tinha colocado o alarme para tocar um pouco antes do necessário, pois teria que fechar sua mala com alguns últimos itens de higiene e que pudesse tomar um café da manhã digno de uma princesa de filme – tinha que aproveitar tudo que o hotel oferecia, não é mesmo? Escolheu uma música insuportável e no volume máximo para que assustasse e não enrolasse para levantar (conselho dado por sua irmã que vinha dando certo sempre que ela dormia tarde e precisasse acordar cedo). Sua estadia em Lisboa tinha sido consideravelmente boa, ela tinha conhecido lugares novos, se apaixonado pela cidade, voltado a escrever e agora tinha boas lembranças daquele lugar. Para fechar com chave de ouro seus dias ali ela tinha conhecido aquele restaurante maravilhoso que tinha ido com Bernardo, e aquilo só a fez começar a dar valor aos pratos diferente que poderia comer em cada lugar que passasse – mas ela deixaria de lado coisas exóticas e que não parecia nem um pouco comestível.

Escolheu seu macacão jeans para usar durante a viagem, tinha que ser uma roupa confortável porque ficaria um bom tempo sentada no trem. Ela tinha sido a única a escolher a viagem para Porto de trem, o grupo se dividiu em avião e ônibus, ela não só escolheu o trem porque nunca tinha andado naquela máquina (o bom e velho metrô não contava pois era totalmente diferente) e também porque a passagem era três vezes mais barata do que a de avião e só demoraria o dobro do tempo. Duas horas e meia passariam em um piscar de olhos.

Se permitiu comer três croissants diferentes: um de queijo com manteiga, outro de presunto parma com catupiry (seu preferido) e o querido chocolate com morango. Croissant não era um prato típico de Portugal, mas aquele hotel sabia fazer aquele salgado maravilhosamente bem. Tomou seu suco de abacaxi com hortelã e decidiu ir para a Estação. Ela poderia ter escolhido a Estação Santa Apolônia, mas preferiu pagar um pouquinho mais cara para pegar o trem na Estação Oriente, ainda estava apaixonadíssima naquele lugar mágico.

Pegou o táxi em frente ao hotel e durante o caminho foi se despedindo daquela cidade que já tinha um lugarzinho especial em seu coração. Durante o caminho o táxi passou em frente à uma banquinha de jornais que vendia vários imãs de geladeira e revistas de fofocas. Aqueles imãs fizeram a garota se lembrar de sua mãe, que sempre que visitava um lugar comprava um imã para colocar na geladeira, sua meta era encher a porta de lugares diferentes com imãs quadradinhos. Depois da morte dos seus pais ela decidiu tirar todos eles para que evitasse aquelas lembranças nostálgicas. Ela aprendera a gostar de viagem e seu sonho era fazer turismo por conta deles, e aqueles quadrados preenchendo a porta da geladeira só mostrava que ela estava cada dia mais longe dos seus sonhos (isso naquela época, pois agora ela vivia seu sonho de vida). Naquele momento, em frente àquela banca, ela decidiu que iria continuar a coleção de sua mãe, mas agora com os lugares que ela conhecia e que seus irmãos futuramente iriam conhecer. Pediu para o taxista parar e desceu do carro. Comprou um imã quadradinho, semelhante aos de sua mãe, com a imagem do Castelo de São Jorge, aquele lugar que tanto representava o recomeço para Luísa.

Não esperou muito tempo pelo trem na estação, pois ele estava adiantado – assim como Luísa. O grupo que tinha ido de avião iria sair depois dela, mas Luísa chegaria junto com eles. A parte que tinha ido de ônibus tinha saído antes dela e só chegariam depois. Todos estariam na porta do hotel na hora do almoço, eles comeriam juntos no próprio hotel e depois todos iriam para o passeio surpresa.

A viagem, apesar de barulhenta, foi calma. Luísa conseguiu descansar e passou o tempo inteiro apenas escutando as duas senhoras ao seu lado conversando sobre suas netas: uma não queria nada com a vida, não queria estudar e nem trabalhar, mas aquela avó iria cortar todo dinheiro dela para ver se sua neta "criaria vergonha na cara"; a outra, neta da segunda senhora, estava no penúltimo semestre de direito e desistiu porque viu que aquilo não era para ela, e agora estava em casa pintando seus quadros e vendendo na internet. Luísa pensou que entre as duas meninas ela não era nenhuma, mas queria ser a segunda, queria ser a que abandonava tudo para fazer o que gostava.

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