Capítulo bônus - Bruno

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Faziam exatamente 16 dias que Anajú se prendia no quarto assim que chegava da natação. Exatamente 16 dias que ela tinha deixado sua irmã mais velha no aeroporto e 16 dias que ela tinha lido aquela mensagem ridícula de Paulo falando que não queria mais namorar com ela pois Ana Júlia era "novinha" demais. Dezesseis dias e três quilos a menos, nunca estava com fome e quando sentia vontade de comer algo ela se sentia cheia rápido demais (até de bombom recheado com morango, o doce preferido dela que ela insistia em comprar todos os dias na escola, para acabar jogando mais da metade no lixo pois causada enjoo). Desses dezesseis dias não teve um em que ela se sentiu bem, nenhuma hora em que ela tenha dado um sorriso verdadeiro e que tinha ficado feliz por alguma conquista das pessoas ao seu redor - nem de Luísa, que ficava presa em seu casulo que Ana Júlia odiava.

Bruno, no começo, pensou que era apenas tristeza e saudade precoce de Luísa, depois veio a bomba (que foi um alívio enorme para ele) do fim do curto relacionamento entre Ana Júlia e aquele tal Paulo horroroso e que nunca deu as caras para a família de Aninha, se não ele teria tido uma conversa bem séria com ele. Mas os dias se passaram e ela não apresentava melhora, continuava aquela mesma menina desanimada e cabisbaixa que nunca comia o pasteis que Bruno levava para a menina. Ela costumava amar aquele pastel que vendia na feira perto da casa deles. Ele também levou o bombom de morango para ela e a menina comeu apenas a metade, dizendo estar cheia demais - mal ele sabia que ela estava tentando comer aquela preciosidade, mas não conseguia.  Luísa estava cheia de vento, oxigênio, sangue e vapor, porque comida de verdade não era!

O irmão pode ser todo tipo de pessoa: viajado, chapado de cansaço, na maioria do tempo não prestava atenção nas pessoas, nunca reparava nenhum corte de cabelo - nem se a pessoa tivesse mudado a cor-, mas conseguia ver de longe a finura do braço da irmã mais nova, percebia aquele roxo embaixo dos olhos da menina, escuros o suficiente para se preocupar com o sono, percebia que ela não andava, se rastejava e não saia do quarto em quase nenhum momento livre.

Quando Bruno estava conseguindo fazer com que a irmã melhorasse aos poucos, saísse na sexta-feira à noite com as meninas do colégio, Luísa mandou aquela mensagem dizendo que queria um tempo para si mesmo, e que os dois parassem de encher o saco dela porque a Europa estava boa demais para que ela ficasse pensando naqueles dois problemáticos (ok, ela não tinha dito com essas exatas palavras, nem Bruno tinha lido daquele jeito, mas Ana Júlia mostrou tantos "sinais" de falta de paciência naquelas palavras que até ele, um menino quase formado, acreditou naquelas baboseiras da irmã mais nova). Aquele torpedo fez com que o mundo desabasse de novo, e ai foi de mal a pior. Uma ladeira enorme ruma ao poço da solidão.

Bruno passou a chamar aquela mensagem de estopim na vida conturbada dos dois. Ana Júlia que estava mal, só piorou e se mostrou revoltada ainda mais com aquela atitude "mesquinha" e "egoísta" da irmã que "só porque viajou agora acha que é a melhor daquela família", passou de um arrependimento por a ter xingado no telefone para um ódio que a fez falar coisas ainda piores sobre Luísa. Ele percebeu que era apenas ciúmes, mas não disse isso para a irmã mais nova porque era capaz dela pular para cima do pescoço dele.

Agora Bruno estava em seu estágio e não parava de pensar o que faria com aquela pequena mulher e que alucinava com seus neurônios. Nem para ser aquela outra garota que também causava muita dor de cabeça, mas que no fim do dia, com uma mensagem, ela mostrava que tudo valia a pena. Mas não, era sua irmãzinha (e ele não queria ver ela mandando mensagem para alguém durante a noite para mostrar o quanto ela e sua loucuras valiam a pena). Não. Sua irmã ainda era um bebê - as duas, tanto Ana Júlia quanto Luísa- e só de imaginar Bernardo dando em cima de Luísa ele sentia vontade de dar um soco na cara do antigo amigo, mas sabia que Luísa conseguia se defender muito bem sozinha. Ou ele esperava que ela se defendesse de qualquer tipo de aproximação do sexo masculino.

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