Samantha
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Acordei mais cedo que o previsto só para ter tempo de passar na padaria antes de ir ver o Rafa. Ele ama quando levo rosquinhas para o seu café da manhã, e como a boa namorada que sou, não me custa agradar meu namorado.
Essa padaria me trás uma lembrança tão boa, afinal foi aqui que o reencontrei depois de tanto tempo sem vê-lo. Lembro-me das vezes que Clara pintava um monstro ao se referir de Rafa, e eu passei a julga-lo antes mesmo de conhece-lo. É aquela história: os inimigos da sua melhor amigas são também seus inimigos. No entanto, felizmente agora que ela voltou, apesar de não lembrar de nada ser extremamente ruim, pois nem mesmo de sua melhor amiga conseguiu lembrar, ao menos ela esqueceu também as mágoas que tinha em relação ao meu namorado. Essa é na verdade a única parte boa dessa história: agora minha melhor amiga e meu namorado podem conviver em paz. Eu odiaria ter que escolher um lado da história, apesar de que, se Clara recuperar sua memória, isso não tardará à acontecer.
Na noite passada, mal tive tempo de falar com ela e dizer o quanto compartilhamos de momentos incríveis no passado... Os acontecimentos foram tão rápidos naquela festa de aniversário, que me limitei apenas a observar tudo e me calar. A pior parte foi engolir Rafael me deixando sozinha no meu apartamento, como uma espécie de segundo plano, para levar Melissa em casa. Afinal de contas, Eduarda é a esposa dela, é ela quem deveria ter se importado com sua mulher e filha, não meu namorado... Mas tá, tentarei ser menos egoísta e ver que Rafael só queria ajudar.
—Moça, aqui está seu pedido! - falou à atendente de balção de padaria, entregando-me as rosquinhas, me tirando dos meus devaneios. Agradeci sorridente e segui em destino ao apartamento de Gui que felizmente não ficava longe dali.
Eu já era quase literalmente de casa e o porteiro já nem mais interfonava para me anunciar. Subi com o pacote nas mãos, estava certa que Rafael amaria a visita matinal... afinal de contas, se tratando de comida, ele se vende com total facilidade. (risos)
Antes que eu pudesse acionar a campainha, a porta abriu-se e dei de cara com Guilherme de saída para o trabalho. Por sorte não precisei recorrer ao som estridente da campainha, eu odiaria acordar o Rafa com esse barulho chato ao invés de acorda-lo com intermináveis beijos.
— Samantha? O que... o q-q-que faz a-a-aqui? — Guilherme indagava gaguejando, tentando juntar as silabas perdidas nas frases. Seus olhos estavam arregalados e sua voz estava tão tremula que por um momento tive receios que ele desmaiasse. Ele parecia até estar vendo uma alma penada e não a namorada de seu primo diante de seus olhos.
— Caramba, que raio de pergunta é essa? Eu sempre estou por aqui, afinal meu namorado mora aqui Gui, esqueceu? - sorri divertidamente. — posso entrar? Quero acorda-lo para tomarmos café juntos. Ele adora, pois diz que se sente sozinho quando você sai para trabalhar e ele é obrigado a ficar sozinho.
— É que ele não está sozinho hoje...
— Não me diga que o seu bofe escândalo barra médico gato que você fisgou passou a noite ai? — falei dando uma piscadela de cumplicidade e deixando escapar um sorriso divertido.
— Passou, mas já saiu para o hospital... Ele tinha Platão logo cedo!
—Então quem mais?
—Clara!— ele respondeu com uma voz trêmula, como se estivesse escondendo algo de extremamente errado.
— Ué, achei que ela fosse ficar no apartamento de Lívia e Laura. Mas sem problemas Gui, juro que não vou acorda-la, vou subir direto para o quarto de Rafael, e não farei o menor barulho ao passar pela sala. — agora entendi a preocupação de Gui, talvez ele estivesse com receios que eu acordasse Clarinha!
— Sam... espera! Não é uma boa idéia entrar ago... —antes que ele concluísse a frase, eu já estava caminhando em destino a sala.
Guilherme
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Pronto, agora o estrago está feito! Afinal de contas, por que diabos Rafael e Clara estão dividindo o mesmo sofá-cama? Lembro-me exatamente que na noite passada Clara dormia no quarto e Rafael no sofá, e agora pela manhã os dois juntos? Eu nem quero imaginar o que deve estar passando na cabeça de Samantha ao ver essa cena. Droga! Por que diabos eu tinha que abrir essa porta justo no exato momento em que Sam veio? Tentei por vezes cobrir a visão para que ela não visse nada, mas foi impossível. Tentei achar uma explicação razoável e lógica na minha cabeça, mas não existe nenhuma. Se com Samantha será difícil explicar, não quero nem imaginar se Eduarda souber disso. Melhor eu ir embora para a redação, já estou atrasado... Sem contar que pela cara de Samantha ao ver essa cena, não ficará pedra-sob-pedra nesse apartamento. Para minha segurança é melhor eu voltar quando o morro estiver pacificado, digo, essa sala voltar a não oferecer perigo. Fechei a porta, e segui meu caminho rezando para que não haja nenhum morto ou ferido quando eu finalmente voltar.
Samantha
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Eu não podia acreditar! Eu não queria acreditar nos meus olhos! Minha melhor amiga e meu namorado? É isso mesmo? Meu sangue ferveu e a raiva me dominou. Cada músculo do meu corpo se contraiam de forma tensa e meus punhos cerravam. Por longos minutos eu encarava aquela cena com nojo e desprezo. Era tão inacreditável que tirei uma foto enquanto ainda dormiam, para mostrar para alguém que assim como eu, precisava ver com seus próprios olhos aquela cena patética.
Após guardar o celular no bolso, enxuguei minhas lágrimas com o punho e joguei contra o corpo de Rafael o pacote de rosquinhas que eu trazia o acordando da forma mais estridente possível, gritando:— Que porra está acontecendo aqui Rafael? — ele saltou da cama como se não entendesse a razão dos meus gritos. Olhou Clara ainda sonolenta encarando-nos e disse:
— Calma Sam, não é nada do que está pensando... Eu juro que posso explicar. - ele tentava sem êxito me fazer engolir que havia outra explicação lógica para aquilo, se não aquela mais dolorosa.
— Não há nada para explicar Rafael. A explicação está bem aqui, diante dos meus olhos. - resmunguei chorando.
—Olha, realmente não aconteceu nada... Eu só acabei pegando no sono sem perceber e não fui para à cama após o filme. — Clara disse.
— Filme? Agora vocês fazem programazinhos de casal? Quer saber menina? Cala a boca que já estou começando a me arrepender de um dia ter te considerado minha melhor amiga. — afirmei batendo a porta e saindo...
Rafael veio atrás de mim correndo pelos corredores do condomínio e gritando:
—Sam, por favor amor, me deixa explicar... — mas antes que ele dissesse qualquer outra coisa, chamei o elevador e me fiz de surda. —Sam, não aconteceu nada. Nós só vimos juntos uma série e acabamos dormindo sem perceber. Eu juro que não te traí amor, por favor, acredita em mim? - sem dizer nenhuma palavra, entrei no elevador e desci para o primeiro andar.
Sair daquele lugar e me sentir livre para chorar e deixar minhas dores rasgarem meu peito cumprindo seu papel, era tudo que eu mais precisava naquele momento. Eu estava com raiva e me sentindo traída. Era difícil acreditar naquela história que ouvi após vê-los tão íntimos dividindo o mesmo sofá. Só de pensar naquela cena, meu coração doía fortemente. Chorar parecia a única forma de aliviar o que eu estava sentindo.
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3 - Fénix, Renascida das cinzas
RomanceTerceira temporada do romance lésbico CLARA E DUDA.