Eduarda
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Eu chorei como uma criança perdida sem o amparo de sua mãe. Chorei sem forças para segurar. Chorei caminhando por aquela sala catando cada página solta daquele diário. Minhas força pareciam ter ido embora e minhas cicatrizes que antes pareciam saradas, voltaram a machucar e sangrar.
Quando pensei ter encontrado na solidão um refúgio, sou repentinamente surpreendida com o som da maçaneta da porta girando. Corri para ver de quem se tratava, por um instante pensei que fosse Clara arrependida da maneira que saiu, mas se tratava de Melissa, Rafael e a pequena Lara adentrando a casa.
- Desculpa ter vindo até sua casa, sei que você não suporta olhar na minha cara, mas eu vim dar uma carona para sua namorada. Guilherme não pode vir e me pediu que viesse no carro dele. - Rafael tentou se explicar de mil maneiras diferentes ao entrar e dar de cara comigo.
- Céus, o que houve nessa sala? Que tanto de papéis jogados são esses? Acaso um furacão passou por aqui? - Melissa indagou tirando o resto de paciência que eu tinha.
- Melissa cala a bola e não enche. Vá colocar a Lara no berço que já é tarde para que ela esteja acordada e pare de fazer perguntas idiotas. - falei grosseiramente.
- Cruzes!!! O que te deu Eduarda? Nem parece você falando!
- Vou pedir pela última vez: Suba e pare de fazer perguntas idiotas! - eu vociferei como nunca antes havia feito com ela. Seus olhos estavam lacrimejados e perdidos me olhando. Mel então segurou a cabecinha de Lara e subiu as escadas me deixando a sós com Rafael.
- Eu sei que está complicado de digerir sua situação, mas falar dessa forma com ela não vai te ajudar em nada. - ele afirmava como se pudesse entender o que eu estava sentindo.
- Não venha me dar conselhos como se fosse meu amigo. - pontuei com frieza.
- Não somos amigos... Mas também não somos inimigos. Olhe para ti? Suas lágrimas me doem. Eu já te amei Eduarda. Já tivemos uma história juntos e fomos felizes, por mais que isso tenha se perdido no meio de nossos erros. Eu ainda me importo com você em nome do que vivemos. Pare de agir como se não precisasse de ninguém, pois eu sei que você precisa. Me diga o que te deixou assim? Foi a conversa com Clara?
- Eu estou com medo... Estou desabando e não sei a quem pedir socorro... Eu sempre acabo magoando todos a minha volta e estou com medo de fazer isso com Melissa também.
- Então não magoe. Você pode evitar. E se precisar de um socorro, eu estarei aqui.
- Olha, isso é o que sobrou do diário de Clara. Ela rasgou algumas páginas, mas eu consegui salvar boa parte. - falei entregando em suas mãos. - se quer mesmo fazer algo por mim, entregue isso para ela. Ela saiu daqui achando que eu nunca a amei, e só Deus sabe o quanto ela foi amada apesar dos meus erros. Se quer mesmo fazer algo, vá até ela e entregue-o, faça que ela veja que nosso amor foi recíproco apesar dos erros.
- Onde ela está agora?
- Eu não sei. Eu realmente não sei. Ela pegou o primeiro ônibus que encontrou pelo caminho e partiu para longe de mim. O ônibus seguiu na direção leste e acredito que o fim da rota é na rua Setúbal. Se correr, creio que possa encontra-la. Cuide dela por mim, por favor. Ao menos uma vez na vida, mostre que não é o monstro do passado.
- Eu vou não até lá para te provar minhas mudanças... Vou porque quero tentar consertar aquilo que causei. - disse ele segurando firme o diário e seguindo para a porta de saída.
Eu de fato não sabia se estava fazendo a coisa certa. Rafael foi o grande causador de tudo de ruim que me aconteceu, e agora eu estava entregando-lhe a única coisa que guardei de Clara nesses últimos anos. Eu não sabia se ele merecia tanta confiança após tudo que fez, mas levando em conta o quanto eu também errei nessa história, porque não acreditar que as pessoas podem mudar?
Quando pensei que minha noite estava ruim o bastante, levantei meus olhos até a escada e dei de cara com Melissa observando-me. Seus olhos estavam vermelhos e me olhavam como se estivessem buscando respostas:
- Faz tempo que está ai?- perguntei amedrontada.
- O suficiente para ouvir tudo.
- Agora você ouve minhas conversas? Achei que eu merecia privacidade dentro da minha própria casa.
- Até ontem não tínhamos segredos... - afirmou descendo as escadas e vindo em minha direção. - Sabe Duh? Eu achei que esse séria um aniversário memorável para mim, no melhor sentido da palavra, mas foi no pior sentido possível... e sua maneira de me tratar só está piorando tudo. - uma lágrima rolou em sua face e eu pude sentir o quão idiota eu estava sendo até ali. Com a correria dos últimos acontecimentos, acabei esquecendo que era o seu aniversário. Aquele era o dia dela, e eu havia tirado todo o encanto da noite.
- Me perdoa Mel? Eu não queria te deixar mal, pior hoje. Me perdoa por favor, eu só estou atordoada com tudo... - falei tentando me aproximar e abraça-la.
- Não quero desculpas, só quero sinceridade... Você ainda a ama? A volta dela te afetou tanto assim? - ela caminhava pela sala com total impaciência.
Eu queria fugir daquelas respostas mais do que tudo, porque no fundo, bem no fundo, nem eu mesma sabia as respostas. Eu não sabia exatamente o que eu estava sentindo. Eu não sabia o quanto Clara ainda significava até olhar em seus olhos outra vez.
- Mel, vamos falar sobre isso um outro dia? Vem até aqui e me deixa tentar salvar o resto do seu dia que eu infelizmente estraguei. É seu aniversário e ainda nem te dei o meu presente... - falei pegando o par de alianças que estavam em meu bolso... - Bom, eu planejei fazer um pequeno discurso na presença de todos os meus amigos, no meio da sua festa, mas tudo foi fugindo dos meus planos... No entanto, apesar de tudo que aconteceu essa noite, quero te pedir para que use essa aliança para simbolizar e reafirmar o nosso compromisso e também para que todos vejam que sou sua e você é minha.
- Você é a única capaz de tornar a melhor noite da minha vida na pior e depois na melhor outra vez. - ela disse enxugando as lágrimas e dando-me um sorriso tímido, enquanto a puxei para um beijo.
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3 - Fénix, Renascida das cinzas
RomansaTerceira temporada do romance lésbico CLARA E DUDA.