GULOSEIMAS

CAPÍTULO 17

A mãe de Danilo tinha muitas qualidades.

Uma delas, senão a principal, era a paciência.

Nada mais natural, para uma criatura tão antiga e viajada.

Apesar disso, ela estava insatisfeita. Danilo demorava demais com uma tarefa simples, algo que seus irmãos já haviam resolvido de forma satisfatória e dentro do prazo estipulado.

Mesmo em casa, sozinho ou ao lado da esposa, ele podia ouvir a voz da Mãe em sua cabeça, exigindo resultados.

Aquele corpo magro e sólido era um uniforme apertado e desconfortável que ele precisava usar o tempo todo, quando não estava na companhia de seus iguais (e que já usava a mais tempo do que gostaria). Dentro dele, seus três cérebros estavam espremidos de qualquer jeito, escondidos no interior de um crânio de mentira.

Danilo era um telepata poderoso.

Nada comparado ao poder de sua mãe, claro, mas o suficiente para influenciar mentes fracas, se intrometer nos sonhos de sua esposa adormecida, e mesmo para apagar alguns trechos inconvenientes de sua memória; porém, mostrou-se incapaz, em todos os anos que teve para fazer isso, de apagar da mente dela um trauma que estava enterrado nas mais profundas entranhas do seu subconsciente.

Alessandra não se lembrava da cena no berço porque era muito pequena, mas o trauma estava lá, graças a sua mãe. Na hora, ela ficou tão desesperada quanto a mãe, senão mais – afinal, estava no rosto dela. Mas os anos foram passando e aquele dia foi desaparecendo junto com as primeiras lembranças. Mas o trauma nunca desapareceu. Danilo também era pequeno na época – bem menor do que ela, aliás –, mas ele se lembrava muito bem daquele dia. Ele estava lá, inclusive, junto com Alessandra e sua mãe, naquele quarto. Mas ninguém seria capaz de reconhecê-lo.

Na época, ele tinha apenas cinco centímetros.