Ela havia se esquecido daquele sonho. Afinal, com tantos, um mais estranho que o outro... Mas esse foi diferente. Agora Alessandra compreendia. Não foi particularmente assustador ou nojento, foi apenas... Estranho.
Danilo estava tomando o desjejum com torradas com manteiga (sem sal) e um grande copo de suco de laranja. Não gostava de café. Dizia que fazia mal para o cérebro. Durante as refeições, ele sempre tomava copos enormes de qualquer líquido frio, fosse chá, suco ou água. Isso quando não tomava dois. Ele era hipertenso, Alessandra sabia, por isso precisava tomar tanto líquido, e por isso ela precisava economizar o sal na comida.
_Oi, amor – ela disse, acordando e encontrando-o já à mesa. – Tive um sonho tão esquisito hoje. Você não vai nem acreditar.
_Vamos tentar.
_Sonhei que estávamos aqui ontem, nesta mesma cozinha, então você me contava um segredo, só que era uma coisa horrível. Você era... Tem certeza de que está preparado?
_Manda ver!
_Tá bom! Você era uma... Por que está rindo? Eu ainda não falei!
_Eu sei, desculpe – ele segurou o riso. – É que não é muito difícil de adivinhar.
Alessandra fechou a cara, contrariada.
_Tá bom! Você era uma lesma, nojenta, mas não era só isso.
_E precisa mais? – ele perguntou. – E o que você fez? Jogou sal em mim?
_Não, droga! – ela riu e puxou o nariz dele. – Cala a boca seu tonto, e me escuta, tá? Você não era uma lesma comum. Era uma lesma alienígena!
_Ah. Entendi! Então tudo bem!
_E você era gigante. Quero dizer, uma lesma verde meio transparente, da altura de um cavalo. Dava para ver os órgãos internos. E você se transformou bem aqui, na minha frente. E você era telepata, então eu ouvia sua voz dentro da minha cabeça.
Danilo fez que acreditava.
_E tinha aqueles apêndices nojentos nos olhos, transparentes. E aquela coisa, nem sei se era uma boca, mas parecia. Tinha uns dentinhos miúdos. Milhares de dentinhos.
_Sério? – Ele parecia estar se divertindo muito. – Imagino que tenha sido uma experiência bastante intensa pra você.
_Aí, você me dizia que eu tinha sido escolhida por alguém, porque meus genes eram compatíveis, porque eu era uma guerreira enrustida, ou alguma coisa assim. Na verdade, minha mãe é que foi escolhida. Ela foi abduzida, só que ela não sabia. Aí vim eu, que já trazia parte da semente deles, sabe, dos alienígenas lesma, e eu seria a reprodutora pros espécimes híbridos que eles desenvolveram.
_Uau! E como foi que você reagiu?
Ela gargalhou.
_De que outro jeito? Fiquei doida, é claro! Mas aí, então, a coisa que era você me disse que era melhor eu esquecer, e que tentaria de novo em outra oportunidade. Que continuaria me torturando com aqueles bichos, cada vez mais, até eu finalmente me acostumar. Aí eu dormi. E quando acordei hoje, no mundo real... Sabe quando você acorda, sabe que sonhou alguma coisa importante, mas não consegue se lembrar? Pois é. Mas sabe quando você acorda com a cabeça vazia, senta na cama, calça o chinelo, vai até o banheiro, se olha no espelho e, de repente, se lembra daquele sonho que estava perdido? Pois foi o que aconteceu!
Seu marido a olhava com atenção.
_É mesmo?
Danilo a tocou no braço e ela olhou, estranhando o toque.
_O que é isso? – ela perguntou, assustada, então sentiu o corpo ser percorrido pela energia do tentáculo elétrico. Alessandra tombou desacordada, mas Danilo a pegou antes que chegasse ao chão. Ele a segurou nos braços fortes e a carregou até o quarto.
Danilo a deitou na cama e deu-lhe um beijou na testa.
_Você vai dormir de novo – ele disse, passando a mão no rosto adormecido. – E dessa vez, não vai lembrar...
CONTINUA...

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GULOSEIMAS
Ficção CientíficaVocê tem nojo de lesmas? Alessandra tem tanto nojo, um pavor patológico, resultado de um trauma de infância, que acredita que essas criaturas inofensivas a perseguem de propósito. Família, marido e amigos já tentaram convencê-la de que isso não fari...