Não posso voltar ao passado e modificar o que fiz, pois, ao fazer isso, perderia tudo o que conquistei.
Os dias passavam e, mesmo que a dor não diminuísse, estávamos ficando mais fortes por causa de Valentim. A cada manhã, mesmo exaustos, bastava olhar para ele, tão frágil no berço, para perceber que a força era uma necessidade, algo que precisávamos encontrar, mesmo quando parecia impossível.
Antonella bateu na nossa porta às três e meia da tarde. Ítalo estava arrumando a casa e eu tinha acabado de dar banho no Valentim. Quando Ítalo abriu a porta e ela entrou na sala com o olhar ainda carregado de tristeza, seus olhos me encontraram enquanto eu ajustava a meia do meu filho. Naquele momento, eu não consegui entender o que a trazia ali.
Ela se sentou no sofá e nos contou que Yara era sua grande amiga desde o ensino médio. Disse que foi ela quem insistiu com a terapia e, depois de muita pressão e argumentos aceitáveis, resolveu concordar. Afirmou que passou boa parte da infância de Ítalo ajudando Yara, mas se mudou para outro país e, quando voltou, o contato não era o mesmo. Fiquei sem ter o que dizer por um tempo. Estava chocada demais para conseguir formular qualquer frase que fizesse algum sentido.
Encarei por alguns segundos o ventilador de teto girando e formando sombras no teto. Falar de Yara sem que ela esteja presente ainda é muito doloroso. Quando consegui focar na conversa, perguntei se ela é formada em algo e ela sorriu, dizendo serviços sociais e uma pós em psicanálise. Ítalo questionou sobre o teatro e ela se defendeu, explicando que realmente trata casais com problemas através de uma terapia alternativa. Ela disse que começou os atendimentos para conseguir um dinheiro extra e que seus amigos pediram, mas quando percebeu já estava ajudando muitas pessoas, então continuou. Yara pediu que ela ajudasse e assim fez. Não houve pagamento.
— Ítalo é praticamente da minha família. Sabia que podia ajudar. Foram conselhos de uma tia — confidencia. — Eu não sou tão insistente em uma terapia normal, nem faço perguntas tão diretas, mas... Yara pediu para eu perguntar coisas que iria fazer Ítalo sair da bolha que ele fica, protegido de sentimentos fortes. Ela queria que ele sentisse algo, nem que fosse uma raiva — ela sorri, envergonhada.
— E eu te odiei — ele declara, sem o mínimo de hesitação.
— Eu sei bem — ri. — Eu tenho um método que funciona, mas esse foi todo pensado em vocês, ou não perceberam que nunca aparecia outros casais no consultório? Eu modifiquei tudo pensando nas necessidades de vocês com uma bela ajuda de Yara.
Ele não questiona mais e nem fica bravo. No fim, temos mais alguém para confiar. Antonella diz que podemos continuar com a terapia e nós concordamos. Ela resolve denominar como uma conversa íntima e soa melhor assim. Ela fez um bom trabalho, apesar da raiva que senti nas suas insistências sobre Rômulo, conseguiu desmontar Ítalo e montar novamente, dessa vez com as peças nos lugares corretos. Precisávamos disso.
Ela pede para Ítalo buscar o álbum de fotos no quarto de Yara e, mesmo sem saber o motivo, ele concorda. Ainda dói entrar lá. A cama está feita desde o dia que ela partiu. O cheiro do perfume que ela usava permanece no cômodo. Mesmo triste, Ítalo vai pegar o álbum sem falar nada. Diminuiu um pouco a marra, tem questionado menos as coisas desde que Yara morreu. Parece que perdeu o sentido de ser sempre do contra. Quando Ítalo aparece com o álbum, Antonella abre e mostra algumas onde há três pessoas na foto.
— O tempo foi grato comigo, mas essa sou eu.
Então ela começa a apontar para várias fotos com Yara e com Ítalo pequeno. Haviam várias. Eu fico próxima olhando todas elas lembrando que já vi uma por uma, mas nunca vi semelhança, nem desconfiei.
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Quando estiver sóbrio (COMPLETO)
Teen FictionAdolescência pode ser a fase mais divertida da vida, mas, quando algo sai fora do programado, ela se transforma em algo bem difícil. Julia não sabia se deveria acreditar ou não em amor à primeira vista, mas bastou uma única vez para ela pensar em Ít...