7ª dose

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Às vezes viver na realidade é a única alternativa que nos resta.

Aquele Ítalo que estava calmo e que me apoiaria sumiu dias depois. Jessica duvidou que ele ficaria ao meu lado, mas eu, com a minha ingenuidade, fantasiei um homem mudado e responsável depois de descobrir que aos dezoito anos seria pai. Não conseguia acreditar que essas mudanças repentinas aconteciam apenas nos filmes que eu assistia aos sábados à noite. Eu queria tanto que ele mudasse que voltei a inventar uma versão que nunca existiu.

Consegui marcar uma consulta para às três da tarde. Avisei para ele uma semana antes e ele confirmou dizendo que, com toda a certeza do mundo, iria. Ao contrário de meia hora que ele demora, ele demorou apenas dois minutos para responder. Nunca imaginei que ele fosse esquecer ou não dar a mínima.

São duas e meia da tarde e Ítalo ainda não deu sinal de vida. Depois da escola, vim direto para a consulta. Uns dias atrás, minha mãe resolveu conversar comigo e disse que eu deveria voltar à escola e que eu deveria reagir e não ficar trancada em casa chorando. Foi isso o que eu fiz. Foi bem normal pelo o fato de ainda não parecer que estou grávida e ninguém, além de Jessica, saber disso.

Me sinto envergonhada por ter engravidado sem terminar a escola. É por isso que eu faltei tanto. Na minha imaginação, assim que eu colocasse o pé na escola todos já iriam saber da gravidez, aí começariam com as fofocas, os risos, os julgamentos, as perguntas, a expectativa, tudo.

Quando me convenço que Ítalo não vem, resolvo que é hora de mandar mensagem. Depois da conversa que tivemos achei que tudo ficaria bem. Ele até me ligou contando como foi a reação da sua avó com essa notícia. Eu ainda tinha esperanças. Tenho uma mania absurda de acreditar na bondade das pessoas. Que burra!

[Julia: A consulta é hoje! - 14:30]

Ele não está online.

[Julia: Você vem? - 14:40]

[Julia: Já estou aqui. Cadê você?? - 14:45]

Ligo e só chama.

[Julia: ÍTALO?? - 14:50]

[Julia: Você vai ser um péssimo pai! - 15:00]

Quando ouço meu nome ser chamado, uma lágrima rola involuntariamente do meu rosto, mas consigo limpá-la rápido antes que alguém do posto de saúde veja. Eu tenho que agradecer por ter conseguido marcar uma consulta em pouco tempo. A ausência de Ítalo não vai me afetar. Respiro fundo e entro. Eu tenho dezessete anos e essa não será a pior consulta do mundo. Não preciso de ninguém comigo, mas daria tudo para ter minha mãe aqui se ainda desse tempo.

A consulta é tranquila. Tiro minhas dúvidas sobre o pequeno sangramento que tive nas primeiras semanas e descubro que é mais normal do que imagino. Acho que estava esperando ouvir outra coisa. Terei que fazer vários exames, mas, tirando isso, foi normal.

Ouço o coração do bebê. Um coraçãozinho ainda fraco que faz o meu — grande e forte — bater descompassadamente. Algumas lágrimas rolam, mas dessa vez não limpo. É um misto de sentimentos.

Ao sair do consultório, resolvo mandar uma mensagem para Ítalo:

[Julia: Eu fui a única sem nenhum acompanhante. Disse para a minha mãe que você ia, então ela não foi. Obrigada, babaca!! - 16:39]

Estarei mentindo se eu disser que não estou chateada. Estou extremamente chateada. Me sinto abandonada em um momento importante. No primeiro momento importante. Na primeira consulta. Eu esperava mais dele. Esperava que ele fosse me acompanhar como disse que ia. Mas ele me decepcionou. Mais uma vez.

Quando estiver sóbrio (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora