40ª dose

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Todos merecem escolher se vai deixar alguém te magoar ou não.

Estou no final da gravidez e, considerando tudo o que aconteceu e o que conseguimos resolver, imaginei que não teríamos mais problemas. No entanto, Rômulo trouxe uma série de questões mal resolvidas, e, por isso, decidimos prolongar a terapia.

Inicialmente, concordamos em fazê-la por um mês, duas vezes por semana, mas não avançamos o suficiente e o nascimento de Valentim está se aproximando. Não sei se todas as mães sentem o desejo de resolver as pendências antes do parto, mas eu quero deixar o máximo de coisas em ordem.

Querendo ou não, Antonella toca em pontos sensíveis de Ítalo, e isso tem mostrado algum resultado, embora não seja muito visível. Ítalo fica chateado e se fecha, mas tem compartilhado mais sobre o que sente. Às vezes, ele me manda uma mensagem contando sobre o dia, algo que antes da terapia ele não faria.

Ítalo, obviamente, não achou uma boa ideia, mas fizemos um acordo de que se todas as sessões se concentrarem em Rômulo, desistiremos. Antonella se esforçou para evitar o assunto, mas depois que Rômulo entrou no quarto de Ítalo, trancou a porta e o obrigou a ouvir tudo o que ele tinha a dizer, tivemos que conversar sobre isso. Achei um absurdo toda a situação, mas não consegui dizer nada para Ítalo. Isso não é algo que tenho que opinar sempre. É uma situação delicada.

Basicamente — e o que eu consegui ouvir atrás da porta — Rômulo deu uma desculpa bem superficial e disse que ainda há tempo para eles construírem algo juntos. Ele reconhece que errou, mas está disposto a se redimir. Não acreditei na conversa dele, mas Antonella trouxe tanta reflexão sobre o assunto e Yara insistiu tanto para que Ítalo desse uma chance que agora eles estão saindo de casa para assistir ao jogo do Flamengo no Maracanã.

Sinto uma mistura de medo e impotência em relação ao que pode acontecer, mas entendo que preciso respeitar a decisão de Ítalo. Pensei bastante na mensagem de Antonella e não posso ficar protegendo Ítalo de sentir algo. Acho que Yara e ela estavam certas o tempo todo. Ítalo precisa sentir alguma coisa, nem que seja tristeza.

Só que estou abismada com tudo o que vem acontecendo. Não consigo acreditar que uma pessoa pode desaparecer por dezoito anos e reaparecer querendo recuperar o que perdeu. Ítalo não pode voltar atrás e dar o primeiro passo, falar a primeira palavra, ter o primeiro beijo, escolher um time. Nada! Mas isso não é uma questão apenas minha. É Ítalo quem precisa decidir se vai perdoar ou não. E, enquanto ele tenta lidar com essa escolha, eu não posso me intrometer. Pensei bastante na situação e decidi não tentar proteger Ítalo de sentir algo.

Enquanto arrumo as roupas de Valentim que ficaram na casa de Ítalo, Yara começa a falar sobre a situação, tentando me animar. Sinto algo forte como se estivesse prevendo algo ruim, mas tento não demonstrar nada, mas a cada palavra feliz que ela fala, sinto como se eu estivesse me enchendo de um sentimento forte. Penso em Antonella e lembro do vulcão: estou prestes a explodir.

— Você está incomodada com algo, minha querida? — Yara pergunta, com sua voz leve.

— É que... meu Deus, não consigo entender como ele pode simplesmente reaparecer depois de tantos anos e agir como se nada tivesse acontecido. — Tento usar meu tom mais suave, porém não consigo.

As palavras saem de mim de forma que não consigo conter. Sei que Yara não precisa ouvir minhas queixas, mas é difícil aceitar que Ítalo está com alguém que acredita que dezoito anos podem ser recuperados. Embora eu saiba que isso não é da minha conta e que Yara talvez me veja como uma chata que se intromete, não consigo me conformar em simplesmente observar sem me posicionar. Ver Ítalo tão abalado e bebendo mais do que deveria me faz sentir que preciso expressar minhas preocupações. Tudo estava bem, e agora sinto que Rômulo complicou a situação.

Quando estiver sóbrio (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora